Uma das primeiras perguntas que surgem com o anúncio das tarifas de 50% impostas por Donald Trump é: se vai ficar difícil exportar, o produto vai sobrar e ficar mais barato no mercado interno, certo? Pela lógica da oferta e da procura, com a possível redução da exportação, a indústria brasileira teria dificuldade de escoar a produção, aumentando a oferta dentro do próprio país. Consequência? Uma possível queda no preço. Mas a matemática não é tão simples assim, segundo opinião de especialistas consultados pela reportagem de O TEMPO.
O planejador financeiro e especialista em investimentos Jeff Patzlaff explica que é possível, sim, que alguns produtos específicos apresentem redução de preço. O aço, por exemplo, pode ter parte da produção redirecionada para o mercado doméstico. “O que aumenta a oferta interna e tende a reduzir os preços, especialmente em setores como construção civil e bens duráveis”, afirma.
Ele cita ainda o café, que pode levar os produtores a priorizar o mercado doméstico em busca de alternativas para manter sua rentabilidade. “Esse movimento pode se repetir em outros segmentos, como sucos e carnes, dependendo da dificuldade de redirecionamento para outros mercados”, acrescenta Patzlaff. “É importante esclarecer que essa tendência se aplica apenas a certos setores e não representa uma desaceleração ampla da inflação brasileira”, destaca.
Além disso, pontua: “com o redirecionamento global de fluxos comerciais, o Brasil pode passar a importar alguns produtos com preços mais competitivos de parceiros como China e Índia, o que também contribui para uma pressão de baixa localizada sobre os preços internos”. Ele pondera, porém, que essas quedas devem ser entendidas como “fenômenos pontuais e setoriais, derivados do realinhamento das relações comerciais internacionais. Elas não significam que o índice geral de inflação - que continua pressionado por outros fatores como serviços, energia e câmbio - esteja em queda”.
O economista Daniel Weigert Cavagnari, coordenador dos cursos de Gestão Financeira da Uninter, concorda que pode haver alguma queda de preço em alguns produtos. “Suco de laranja, café, aço, tem muita coisa que a gente exporta para lá que, abastecendo o mercado interno, pode ser que melhore um pouco a inflação”, cita. Porém, ele lembra que existe uma série de variáveis que podem impactar o Brasil no sentido macroeconômico.
A inflação no Brasil pode sofrer pressão e fazer com que o cenário fique complicado. Afinal, queda na exportação significa redução imediata de reservas de moeda estrangeira. “Existe uma questão política e crítica ao mesmo tempo em relação às taxas de juros do Banco Central. O BC vai ser o primeiro a querer aumentar a taxa de juros, a Selic, e outras mais. Vai haver uma fuga de capital, isto é, o dinheiro que não vem de exportação já não vai entrar mais. O dinheiro de reserva, justamente por investimento externo, também vai diminuir. Então isso tem aumento da inflação e da taxa de juros. É mais ou menos uma recessão anunciada”, enfatiza o economista.
“Fuga de capital também significa aumento da taxa de câmbio. Provavelmente o dólar e o euro vão ficar mais caros para o brasileiro, assim como as próprias criptomoedas, que vão ter uma subida”, pontua Cavagnari, lembrando que dólar alto também significa aumento de preço em diversos itens.