Alerta

Cresce número de jovens viciados em apostas esportivas que procuram ajuda em BH

Jogadores Anônimos relatam aumento da procura de pessoas de 20 anos por ajuda para combater compulsão


Publicado em 26 de março de 2023 | 06:00
 
 
 
normal

“Quase toda semana entra um pedindo ajuda. Chegou um agora que não tinha nem 18. Idade do meu filho… Eu já estou lá há 21 anos”. O relato é de um representante dos Jogadores Anônimos (JA) de Belo Horizonte, que pediu para não ser identificado. Segundo ele, desde o início da pandemia tem crescido o número de jovens que buscam ajuda após perceberem que são jogadores compulsivos. “Antes eram pessoas que frequentavam bingo, muitos aposentados... Hoje estão chegando muito cedo, aos 20, 21 anos. Gente mais nova que não se via chegar ao grupo dez anos atrás”, conta. Muitos são levados ao grupo por incentivo dos pais.

Para ele, além da facilidade de acesso, visto que não é preciso se deslocar até um estabelecimento clandestino, a explosão da publicidade na TV aberta pode ter influenciado nesses números. “Não tem propaganda de outra coisa: qualquer horário em qualquer emissora”, conta. O representante do JA vê com desconfiança a iniciativa do governo de regulamentar os jogos: “cobrando imposto, eles vão aumentar a propaganda ainda mais”, opina. 

Hermano Tavares, fundador do Programa Ambulatorial do Jogo Patológico (Pro-Amjo) do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), também relata uma mudança no perfil dos atendimentos. “Antigamente vinha mais paciente de vídeo poker, vídeo bingo, em torno de 45 anos de idade, e agora chegam pacientes mais do sexo masculino, com 35 anos, com essa queixa de apostas online”, conta.

A reportagem de O Tempo procurou a Secretaria de Saúde de Belo Horizonte em busca de números oficiais, mas não há registros específicos sobre o atendimento à pessoas com compulsão por jogos. O Ministério da Saúde não respondeu à reportagem. 

 

Lucro não é para todos, alerta especialista

Especialista em casas de apostas, o jornalista Caio Bitencourt, de 25 anos, conta que acabou descobrindo o universo das apostas online cedo, nos anos 2000, pela curiosidade em saber quem patrocinava os clubes no futebol internacional. “Queria saber o que era Bwin do Real Madrid e do Milan”, lembra.

Ele conta que, normalmente, só aposta valores baixos, entre R$ 2 e R$ 5, para que se divirta sem comprometer o orçamento. “Uma crítica que tenho ao modelo do boom das apostas esportivas é quando o jogo, algo que pode ser sobre ganhar e perder, vira uma expectativa irreal de fonte de renda. Sou bem crítico quanto a isso, uma vez que o lucro não é para todos”, pondera. 

Esta é também a opinião do administrador de imóveis Windson Alves, de 51 anos, que entrou recentemente para o universo das apostas por influência dos sobrinhos de 21 e 22 anos. O tio, por ora, “está fazendo um dinheirinho de bobeira” e já lucrou R$ 2.000, mas conta que um dos jovens quer construir carreira na área. “Eu não concordo muito porque, querendo ou não, é um jogo. Não é igual eles acham que vão ganhar sempre. É difícil a pessoa quebrar a banca”, observa. 

Se autointitulando o primeiro apostador do Brasil, o empresário Pedro Henrique Trindade Lucas, de 38 anos, é categórico ao afirmar que somente os mais disciplinados e estudiosos conseguem realmente ganhar dinheiro. “A grande maioria dos apostadores perde”, diz.

Ele aposta há 18 anos. Era atleta de MMA, foi fazer uma luta em um cassino, conheceu o poker e dali migrou para as apostas esportivas.

Conceito de jogo responsável entra no debate

O especialista em casas de apostas, Caio Bitencourt, acredita que a regulamentação das casas pode favorecer na prevenção do surgimento de novos viciados, desde que esses sites tenham mecanismos para restringir contas de jogadores compulsivos. “Mas só isso não basta, é preciso políticas de prevenção e de saúde pública, similares às feitas com álcool e demais drogas legais (como o cigarro)”, afirma o especialista. 

O Galera.bet é um dos sites de apostas que disponibiliza informações sobre o jogo responsável em sua página. Além disso, o jogador consegue gerenciar a utilização do serviço, com ferramentas para a limitação de tempo de jogo, de apostas e de perdas. Há ainda a possibilidade de bloqueio ou mesmo de autoexclusão. “Nossos colaboradores de atendimento ao cliente também são treinados para identificar e acolher jogadores com problemas com apostas, oferecer as opções possíveis e fazer o devido encaminhamento do caso", conta Marcos Sabiá, CEO da empresa. 

A Prefeitura de Belo Horizonte informa que a pessoa com compulsão por jogos pode receber tratamento na rede SUS-BH por meio da Política de Saúde Mental. O município conta ainda com oito Centros de Referência em Saúde Mental (CERSAMs) e cinco Centros de Referência em Saúde Mental - Álcool e outras Drogas (CERSAMs-AD).

O grupo dos Jogadores Anônimos tem reuniões presenciais em Belo Horizonte toda terça e quinta-feira, das 19h às 21h, na Av. do Contorno, 6738 - Paróquia Santo Antônio. Informações no site  jogadoresanonimos.com.br

 

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!