31 de março

Varejo de BH emprega profissionais trans, mas inclusão ainda é grande desafio

Dia Internacional da Visibilidade Trans é celebrado neste domingo (31); apenas 4% deste público tem emprego formal no país

Por Shirley Pacelli
Publicado em 31 de março de 2024 | 06:00
 
 
 
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Dominique Evangelista, a Eva, de 22 anos, é hoje operadora de caixa numa unidade de uma grande rede de farmácias em Belo Horizonte. Ela também já trabalhou em uma cafeteria e um supermercado, mas o caminho até conseguir essas oportunidades foi árduo. Eva é uma mulher trans. No Brasil, apenas 4% das pessoas transgêneros têm emprego formal, segundo dados de 2023 da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). “A gente vai em entrevistas, a gente conversa, passa por processos seletivos para receber no final [o aviso] que as empresas vão entrar em contato e, realmente, elas nunca entram”, conta. 

De acordo com a plataforma TransEmpregos, em 2023 caiu em 57% o número de oportunidades oferecidas a esses profissionais. O número de empresas parceiras, porém, aumentou 16% em relação a 2022, sendo 8,6% delas do setor do varejo e comércio. Segundo uma pesquisa do Sebrae Minas, divulgada no ano passado, transgêneros ou não-binárias representam 4% dos empreendedores no Estado. O número é o dobro do percentual da população adulta trans ou não binária do país (2%).

Neste domingo (31/3) é celebrado o Dia Internacional da Visibilidade Trans e apesar do grande desafio, tem aumentado, ano a ano, o número de pessoas trans no mercado de trabalho formal. Eva, por exemplo, celebra o fato de ter sido bem recebida pelo gerente de sua unidade.

“Ele lutou muito no RH para eles colocarem o meu nome, mesmo que eu não tenha oficialmente mudado. Acontece que, em ambientes novos, as pessoas não estão acostumadas”, explica Eva. Segundo ela, o gerente precisou reunir os funcionários para orientá-los e reafirmar que ela deveria ser tratada pelo gênero feminino e não de outra maneira. “Eu sou uma mulher e não tem quem diga ao contrário. Se eu sou isso, se eu me identifico no gênero feminino, quem vai apontar o dedo para mim dizer que não? E infelizmente o mundo não é assim. As pessoas têm que abrir mais a cabeça. As empresas têm que ter mais diversidade, não só por marketing”, destaca Eva. 

Cacau da Silva, de 37 anos, também uma mulher trans, já trabalhou em call center, supermercado, lanchonete e hoje atua na Casa da Mulher, serviço social da Prefeitura de BH. Mas ela observa que, dificilmente, encontramos pessoas trans no atendimento ao público ou até mesmo trabalhando em uma empresa no formato CLT. “Ainda há um estigma muito grande quando se trata de pessoas como nós. Infelizmente, nos querem em um lugar que não é dentro da sociedade e sim fora dela”, afirma. 

Ela relata que, no caso de pessoas trans, o processo de arrumar um emprego, que já é difícil por si só, se torna ainda mais complicado. “Muitas que vieram antes de mim, lá atrás, não tiveram o mesmo preparo psicológico e acabam cometendo atrocidades contra si próprias”, lembra.

Para Cacau, o preconceito durante o recrutamento continua latente e a solução para que a comunidade trans vença essa barreira no mercado de trabalho ainda passa pela conscientização individual. “O Brasil é um dos países que mais mata pessoas transsexuais, LGBTs, e pessoas negras periféricas. Infelizmente, isso ocorre com muita frequência”, lembra. 

Outro ponto que ela observa como essencial para mudar esta realidade é o aumento da escolaridade das pessoas trans, que acabam não concluindo os estudos devido à transfobia que sofrem em sala de aula. “E, se abandonam os estudos, não há capacitação educacional e profissional para incluir essas pessoas”, diz. 

 

Política de inclusão deve contar com treinamento e monitoramento

Para Leandro Souza de Pinho, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos de Minas Gerais, a inclusão de pessoas trans no ambiente de trabalho contribui para a construção de ambientes mais justos, acolhedores e diversos. “Adotar e apoiar medidas de inclusão é um papel de toda sociedade”, afirma. 

Segundo ele, não basta contratar pessoas trans, é preciso oferecer treinamentos regulares sobre identidade de gênero para os funcionários, garantir que os processos seletivos sejam livres de preconceito, oferecer apoio a empregados que estão passando pela transição e realizar o monitoramento das medidas, fazendo ajustes quando for necessário. 

 

Veja como o RH pode auxiliar na inclusão de pessoas trans no mercado de trabalho:

  • 1. Políticas inclusivas

Desenvolver e implementar políticas inclusivas que protejam e promovam a igualdade de oportunidades para pessoas trans, incluindo políticas de recrutamento, seleção, promoção e desenvolvimento de carreira.

  • 2. Treinamento

Oferecer treinamento regular para funcionários e líderes sobre identidades de gênero, diversidade e inclusão, incluindo informações específicas sobre questões que afetam pessoas trans

  • 3. Recrutamento e seleção

Garantir que os processos de recrutamento e seleção sejam justos e livres de preconceitos

  • 4. Apoio durante a transição

Oferecer apoio para funcionários trans que estão passando por transições de gênero no local de trabalho, garantindo que eles se sintam seguros e apoiados

  • 5. Cultura organizacional inclusiva

Promover uma cultura organizacional inclusiva, onde todas as identidades de gênero sejam respeitadas e valorizadas, e onde a diversidade seja celebrada

  • 6. Parcerias externas

Estabelecer parcerias com organizações e grupos que apoiam a comunidade trans, buscando orientação e colaboração para criar um ambiente de trabalho mais inclusivo

  • 7. Monitoramento e avaliação

Realizar monitoramento regular para avaliar a eficácia das políticas e práticas de inclusão de pessoas trans, e fazer ajustes conforme necessário

Fonte: Leandro Souza de Pinho, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos de Minas Gerais (ABRH-MG)

 

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