A ideia de Robert Zemeckis para "Aqui", em cartaz nos cinemas a partir desta quinta-feira (16), é ousada e complexa, do ponto de vista narrativo, limitando-se a um único espaço durante quase duas horas. Mais: a posição da câmera é praticamente fixa, raramente se deslocando neste cenário.
O que vemos é, em boa parte do tempo, a sala de uma casa que se destaca por uma grande janela que dá para a rua. Personagens que cobrem praticamente um século entram e saem constantemente, compartilhando alguns momentos de sua vida.
Esses registros vão e voltam no tempo, nos colocando imediatamente uma dificuldade inicial para entender a importância e o papel de cada família. Mas pouco depois a trama se concentra na história do casal formado por Tom Hanks e Robin Wright.
A intenção de Zemeckis, que dirigiu essa mesma dupla em "Forrest Gump - O Contador de Histórias" (1994), é mostrar o que há de mais essencial no ciclo da vida, como nascimentos, relações, formação de família, envelhecimento e perdas.
É como se, dentro daquela "caixa", o ser humano pudesse ser analisado em sua dinâmica familiar, sem interferências externas. Claro que todos eles levam às suas vidas normalmente, mas nossa atenção se detém nesses instantes caseiros.
A casa, ou melhor, a sala se transforma em personagem, determinando muitas das situações a que assistimos, passando a ideia de proteção e sentido familiar. Ao mesmo tempo, gera o grande impasse entre os personagens de Hanks e Robin, já que parecem presos ao lugar.
Quando ela viaja por diversos países ao lado da filha, experimenta uma sensação de liberdade e conhecimento, em oposição à limitação e à opressão provocada pela casa - ampliada ao, literal e figurativamente, exibir uma única janela para o mundo exterior.
É bom que se diga que esses limites autoimpostos pela narrativa partiram de uma graphic novel de Richard McGuire, o que explica algumas escolhas que não funcionam na tela grande, como a participação desinteressante dos outros núcleos familiares.
Bem como a ida a um passado anterior à construção da própria casa, quando o lugar era povoado por indígenas, conversando pouco com o principal dispositivo do filme (a câmera fixa no cômodo da casa). Se essas cenas fossem retiradas, não fariam qualquer falta.
Outro momento em que a câmera sai daquela casa é quando o filme acena para uma questão, a princípio, interessante, sobre a pequena e a grande História. Sabemos que a casa está de frente à mansão de um personagem marcante da guerra pela independência.
Um pedaço dela está sempre visível pela janela, criando uma contínua conexão, mas esse detalhe se perde depois, deixando de lado a oportunidade de abordar sobre o quanto essa referência histórica nos permeia ao longo do tempo, especialmente em relação a uma noção mais fluida de lar.