TIRADENTES. Com mais de seis anos em discussão no Congresso Nacional, a regulação do Video on Demand (VOD) entra num ano decisivo. O governo promete empenho para garantir a aprovação de medidas que enquadrarão as plataformas de streaming às regras brasileiras de tributação e estímulo à produção nacional. A palavra-chave é comunicação, conforme revelado pela secretária de Audiovisual Joelma Gonzaga, num painel realizado na 28ª Mostra de Cinema de Tiradentes que reuniu representantes do Ministério da Cultura e da Agência Nacional de Cinema (Ancine).

A ministra da Cultura Margareth Menezes já tem agenda com Sidônio Palmeira, à frente da pasta da Secretaria de Comunicação Social, para definir como se dará a estratégia de comunicação para a aprovação mais ligeira da regulação no Congresso. "Já tive uma conversa com o assessor do novo ministro, focada nesta pauta, sobre como combater as fake news, para que a extrema direita não contamine toda a rede e o Congresso, como aconteceu na votação do ano passado, quando foi chamada de PL (projeto de lei) da Globo", afirma Joelma, citando a votação da PL 2630, voltada para a regulação das plataformas sociais.

O Ministério da Cultura já começou a produzir, segundo ela, pílulas para as redes sociais, com informações sobre a regulação do VOD. "Já vem de uma reunião ocorrida com os ministros para maior velocidade e intensidade da comunicação nas redes, com uma linguagem mais jovial. É preciso sensibilizar todo mundo sobre o que é a regulação. Além disso, também temos discutido campanhas para promoção do cinema brasileiro", assinala. Atualmente, diz, o que está em conversa no Congresso "não atende em nada (o setor)" e aguarda uma "negociação árdua a ser feita nos próximos dias".

Joelma destaca que o momento é de reafirmar as discussões voltadas para a regulação do VOD, definidas desde de 2023. "Depois das eleições (do ano passado) e de ouvir novamente o setor, fizemos um balanço e discutimos como essa pauta prioritária seria conduzida. Temos somente este ano para regular as plataformas de streaming, até porque 2026 é um ano de eleição (para presidente) e não vamos conseguir fazer muita coisa. O sentimento geral é de que precisa ser agora. Do contrário, a regulação ficará cada vez mais difícil", registra a secretária do Audiovisual.

Atualmente três projetos de lei tramitam no Congresso, dois deles no Senado, de autoria de Nelsinho Trad e Eduardo Gomes, e outro na Câmara dos Deputados, de Paulo Teixeira. O de Gomes e de Teixeira são os que estão em estágio mais avançado, com o primeiro já encaminhado para a Câmara dos Deputados e tendo como relatora Jandira Feghali. "Do ponto de vista da estratégia, o melhor caminho hoje, em relação ao que está no Congresso, é trabalhar numa proposta para que saia uma proposta apenas da Câmara e vá para o Senado", adianta Joelma.

"Nosso entendimento é de que devemos consolidar qual é o ponto de vista do governo. O audiovisual está numa nova indústria, a partir da transformação digital", analisa, destacando que um dos carros-chefe da proposta é a criação de uma nova Condecine voltada para a área de VOD. A Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Nacional, criada em 2011, é um tributo que incide sobre a exploração comercial de obras audiovisuais nos diversos segmentos do mercado, das salas de exibição à TV por assinatura, com o valor arrecadado investido na produção brasileira.

Segundo ela, os projetos de lei mais adiantados estão travados ao não conseguirem avançar em algumas premissas, como direitos autoral e patrimonial, propriedade intelectual, visibilidade das obras brasileiras nas plataformas (com a criação de uma cota de catálogo) e contribuição financeira, a partir de uma Condecine específica. O governo vem defendendo que a Condecine tem que incidir sobre a receita bruta das plataformas, num percentual mínimo de 6%. Uma dificuldade é a falta de transparência de dados deste segmento.

Paulo Alcoforado, diretor da Ancine, observa que um passo importante para aprovação é o que se refere ao que ele chama de coincidências entre os projetos, com destaque para a própria necessidade de regulação. Outro ponto é a abrangência, que "inclui todos os serviços audiovisuais com suporte na internet, de forma não-linear, e que têm uma atividade econômica, são objetos dessa regulação". Os projetos também concordam  na criação de um tributo sobre a receita. "A diferença está na alíquota. Enquanto um propõe 3%, o outro defende 6%", compara.

"Outra questão é que, desses valores que seriam recolhidos, parte expressiva que seria destinada ao Fundo Setorial do Audiovisual vai para os próprios serviços de VOD. Num dos projetos de lei, esses recursos poderiam ser aplicados em estrutura, mão-de-obra e até em obras das próprias plataformas. Isso não é razoável, pois quem irá fiscalizar isso?", indaga. Ele pondera que, após mais de uma década após a presença dessas plataformas no Brasil, há um cenário de grande obscuridade, sem termos conhecimento sobre o número de assinaturas e a receita.

"A regulação serve para que a gente tenha acesso às informações para que possamos fazer o nosso trabalho. Hoje elas remetem a maior parte dos lucros decorrente da exploração econômica para o exterior. A lógica é, se você remeter um recurso gerado no Brasil, há um tributo para isso, com alíquota de 11%. Estou estimando que, nos últimos cinco anos, o conjunto desses serviços de VOD tem um passivo tributário da ordem de R$ 4 bilhões a R$ 5 bilhões. A gente não se dar ao luxo de abrir mão desse recurso. É um tributo que já existe e cabe ao poder executivo fazer essa cobrança", alerta.