BONITO - Não é difícil imaginar uma transposição de "Oro Amargo" para Hollywood. Afinal, o filme chileno, exibido na programação do 3º Bonito CineSur, que está acontecendo na cidade sul-mato-grossense, tem ingredientes caros ao cinema ianque, especialmente relacionados ao faroeste, a partir de elementos como a barbárie em meio à construção da civilização, os códigos marcadamente masculinos, a terra sem lei, o valor à propriedade e o desejo de vingança.
O que não quer dizer que o filme do cineasta Juan Francisco Olea seja passado nos tempos do Velho Oeste. A trama é contemporânea, com a presença de carros, celulares e máquinas que participam da extração de cobre no deserto de Atacama, no Chile. Um pai e sua filha adolescente trabalham numa mina isolada, organizando uma exploração clandestina juntamente com mineradores contratados na região.
Olea consegue transmutar esse drama pela sobrevivência de uma família reduzida para um ambiente típico do western, pautado pela desconfiança constante, pela fragilidade feminina diante de homens sem escrúpulo, a sensação de iminência de uma invasão no rancho e um terreno tão árido quanto a expressão nos rostos dos personagens, todos eles sempre tensos, como se escondessem algo.
A história já aponta, desde os primeiros minutos, para as rivalidades no ar, principalmente entre o pai (Pacífico, vivido por Francisco Melo) e seus empregados. A filha Carola (Katalina Sánchez) serve como amortecedor naquelas relações. É a única figura feminina, mas o meio machista a transforma, precisando se defender da forma preconceituosa como é tratada pelos mineradores, principalmente na ausência de Pacífico.
Gradualmente a personagem vai ganhando força na narrativa, devido aos obstáculos que são impostos a ela, até que, com inteligência e coragem, consegue desfazer da opressão machista, numa cena emblemática, cortando as estradas do deserto sobre uma moto. É a imagem-símbolo dos faroestes, do homem que, em cima do cavalo, após encerrar a sua missão, vai embora solitariamente e sem destino certo.
Essa mensagem feminista é reforçada pela ótima atuação de Katalina, além da direção segura de Olea,que deixa o espectador em constante tensão em relação ao que pode acontecer com Carola, com uma violência latente, embora o filme não contenha nenhuma cena mais explícita. "Oro Amargo" prova que o cinema chileno continua revelando grandes talentos na esteira de Pablo Larraín e Sebastián Lelio.