Apesar de estar recheado de referências cinematográficas, com foco nos filmes de espionagem, "C.I.C - Central de Inteligência Cearense" - já em cartaz  nos cinemas - traz uma mudança significativa em relação aos filmes anteriores de Edmilson Filho, como "Cine Holliúdy" e "O Shaolin do Sertão". Novamente em parceria com o diretor Halder Gomes, o ator abandona o herói involuntário para fazer um tipo caro aos trabalhos do trio ZAZ, em que o humor reside de uma percepção exagerada da realidade pelos personagens. 

É como se Edmilson deixesse de lado sua principal inspiração - o Didi de Os Trapalhões - para fazer uma espécie de Jacques Clouseau ("A Pantera Cor-de-Rosa") ou um Frank Debrin ("Corra que a Polícia Vem Aí", do  ZAZ). A diferença é que esses policiais têm a certeza que estão fazendo a coisa certa, gerando uma série de equívocos que, no final das contas, acabam chegando ao resultado desejado. Nos primeiros longas, ele fazia o homem ingênuo e sonhador,  à espera de um lugar ao sol. Já o agente de "C.I.C" se acha o próprio sol.

Essa mudança de perspectiva afeta o desenvolvimento do protagonista e da narrativa, que sai do cenário interiorano e parte para o urbano. O personagem já está consolidado, por assim dizer, não precisando fazer a trajetória da provação. Embora mostre alguns flashbacks sobre a sua origem humilde, como servente numa universidade, o agente Karkará é presunçoso, com a certeza de que é o melhor agente, lutador e amante do mundo, "quiçá do Ceará", frase muito repetida no filme.

O roteiro tropeça nesta composição, que exige outra pegada de comicidade, com a cena exacerbando todas as limitações do agente (porém só notadas pelo espectador, provocando uma estranheza risível). O texto aposta nos diálogos, como se pegasse os principais momentos de James Bond e traduzisse para o "cearencês". Há algumas boas sequências, especialmente quando ele mistura línguas em seu disfarce, e outras nem tanto, como o computador mal-educado da agência.

O espião 007 é lembrado principalmente pelo frase de apresentação ("Bond, James Bond", adaptado para "Lei, Vanderlei") e pelo lado sedutor, com uma citação à sequência em que Ursula Andress sai do mar, toda sensual, em "O Satânico Dr. No" (1962). Há outras referências explícitas tiradas das séries "O Homem de Seis Milhões de Doláres", a partir do braço ciborgue de Karkará, e "Agente 86", perceptível na dupla (o chefe e a assistente) que trabalha com o agente.

Os personagens coadjuvantes são interessantes, como o chefe fumante inveterado, a espiã argentina que forma dupla divertida com o cearense e os vilões, que são pura sátira bondiana. Aliás, o projeto megalomaníaco da cabeça do grupo Rola (sim, é mais piada do filme) ambiciona acabar com o turismo brasileiro, transformando a água das praias em cocô. Embora o ritmo seja irregular, Halder Gomes mostra, como em filmes anteriores, ter domínio bom domínio técnico. 

O maior achado de "C.I.C" é tirar Rio e São Paulo como centros de interesse, fazendo do Ceará não só um cenário das investigações,  como também usar elementos culturais locais para desenvolvimento da história. Desta maneira, uma das sequências de ação se dá no estádio Castelão, num jogo do Fortaleza pela Libertadores. Se quisesse brincar mais com esse aspecto, poderia ter escalado atores cearenses para participações especiais, além de explorar outros pontos turísticos.