Kiko Dinucci

Crônicas, êxtases, caos e ruídos da selva de pedra

Músico paulistano lança o primeiro disco solo, “Cortes Curtos, entre o samba e o punk

Por Lucas Simões
Publicado em 20 de fevereiro de 2017 | 03:00
 
 
 
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O caos escrito por todos os muros. O escuro aterrorizador dentro da sua mente. Vertigem. Parafusos rodando soltos na cabeça. Dá para listar uma infinidade de reações instantâneas ao ouvir “Cortes Curtos” (Independente), o primeiro e arrebatador disco solo do guitarrista e compositor paulistano Kiko Dinucci, disponibilizado para download gratuito mês passado – como ele fez com os 17 álbuns que soma em sua frutífera discografia.

Aos 39 anos, Kiko Dinucci pode ser considerado um dos maiores artistas brasileiro em atividade. E não só por colocar sua digital inconfundível em trabalhos do Metá Metá, com Juçara Marçal e Thiago França, ou interferindo na veia melódica de artistas da magnitude de Elza Soares ou Criolo.

Apesar de ser elogiado, do samba ao hardcore, só agora Dinucci envereda por uma empreitada totalmente autoral, unindo suas diversas influências, envolvendo música caipira, metal, samba, Vanguarda Paulistana, noise, hardcore e por aí vai.

“Cortes Curdos” é um disco de samba, mas com roupagem punk. Enquanto as letras flertam com Paulo Vanzolini e Lou Reed, em formato de pequenas crônicas urbanas influenciadas pela cidade de São Paulo, os arranjos são repletos de guitarras punk rock, dissipadas por todas as 15 faixas do disco.

Perpassando por temas como amor, ódio, preconceito e extremismo, Dinucci também demonstra uma pitada de humor nada convencional, explícita na intensa “Vazio da Morte”, que narra a tentativa frustrada de suicídio de um sujeito que tenta pular do prédio Banespa, mas chega atrasado para o horário de visitas e é obrigado a voltar no dia seguinte para sacramentar o plano.

Com todos os seus ruídos e incômodos, “Cortes Curdos” é também um manifesto político-sonoro, a começar pela capa, um registro de Kiko sendo enquadrado por um policial militar, antes de ele se apresentar numa ocupação do Movimento Passe Livre. Mas as próprias músicas também deixam recados políticos claros. Na extravagante “Uma Hora da Manhã”, em meio ao chiado de guitarras, uma mulher nordestina discute com um gay em um retrato típico dos tempos de intolerância atuais.

No som, além de Kiko como vocalista e guitarrista absoluto, mais uma vez foram convocados os parceiros Marcelo Cabral (baixo) e Sérgio Machado (bateria), em uma espécie de power-trio, com gravações realizadas no Red Bull Studios, em São Paulo, em jam sessions de apenas cinco dias, sob a produção de Rodrigo “Funai” Costa – o mesmo modo que Kiko grava os discos do Metá Metá, sem ensaios marcados e com muita improvisação. Uma belezura.

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