AML

De pintor a acadêmico 

Artista plástico Carlos Bracher toma posse, na próxima sexta-feira, da cadeira de nº 32 da casa literária mineira

Por Ailton Magioli :: Especial para O Tempo
Publicado em 01 de maio de 2016 | 03:00
 
 
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A pintura (principalmente) e a música foram os caminhos pelos quais se enveredou a família Bracher, cujo nome mais conhecido, no entanto, esteve dividido entre as cores e as palavras desde a infância. “Para mim, elas sempre foram muito congêneres e paritárias”, diz Carlos Bracher, que, carreira consagrada na pintura, aos 75 anos, vai tomar posse, na próxima sexta-feira, da cadeira de nº 32 da Academia Mineira de Letras (AML).

Apesar de ter se iniciado artisticamente na pintura, ele lembra que a literatura sempre esteve presente em sua trajetória, já tendo escrito e lançado dois livros, além de manter outros inéditos. “A ode da criação é sempre a mesma coisa. Essa vontade de gritar, de exclamar, de se comunicar. A arte é um acontecimento humano, é uma conclamação interior, mas, também, para fora, para os outros”, diz.

Segundo acredita, trata-se de “um círculo que tem de acontecer. É a fábula humana da permanência”, empolga-se Carlos Bracher, cuja cadeira na AML tem por patrono o Marquês de Sapucaí, natural de Nova Lima. No novo posto, ele vai suceder o conterrâneo juiz-forano Almir de Oliveira (1917-2015).

“Era um homem brilhante, autor de 20 e tantos livros”, elogia, salientando o fato de outro “grande escritor”, Angelo Oswaldo de Araújo Santos, atual Secretário de Estado da Cultura de Minas Gerais, ser responsável pelo discurso da apresentação dele na academia. “Com o discurso que ainda estou preparando, depois de Angelo Oswaldo, acho que não vou ter nada a dizer”, admite o pintor-acadêmico.

Livros. Autor dos livros “Bracher Brasília” (2007), escrito a propósito do lançamento da série de pinturas (66 quadros) que fez sobre a capital federal, e “Ouro Preto – Olhar Poético” (Editora Le Graphar, 2010), ambos com textos e ilustrações de sua autoria, Carlos Bracher ainda se enveredou por outras atividades literárias.

É dele, por exemplo, o texto sobre Minas Gerais do livro “Brasil – Gente e Lugares, Palavras e Imagens”, editado pela Confederação Nacional das Indústrias (CNI, 2011), além do prefácio de “História, Arte e Sonho na Formação de Minas”, de Mauro Werkema, de 2009.

Se no primeiro livro Bracher presta homenagem ao presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira, um dos grandes ídolos da vida dele, e Brasília, no segundo, o autor volta sua sensibilidade para a Ouro Preto, na qual vive em família, desde os anos 1970, com uma visão histórica da cidade colonial, que pende para o poético.

Bracher que conheceu e conviveu com escritores consagrados como Carlos Drummond de Andrade (“Encontrei-me com Minas Gerais através da pintura de Carlos Bracher. É o maior elogio que, de coração, lhe posso fazer. Viva Minas!”, escreveu o poeta, a propósito dele), Jorge Amado e Ferreira Gullar, assume ser “um leitor bissexto”. “Não sou um leitor profundo. Eu gosto muito de escrever, o que talvez não corresponda ao ato de ler. Sou mais um observador”.

“Eu tenho muito medo de conhecer as coisas e perder um certo encanto”, confessa o pintor-acadêmico. “Trabalho com a emoção que o conhecimento talvez atrapalha, ficando meio intelectual. Eu não quero conhecer nem a pintura nem a literatura”, avalia Bracher, ao dizer que a sensibilidade dele é de “um clássico”. “A literatura é muito aleatória em mim”, pondera.

Van Gogh. Sobre o pintor que diz amar, Vincent van Gogh, a quem dedicou a maior série de carreira (cem quadros), no centenário de sua morte, em 1990, adianta não querer saber muito. “Eu quero amar Van Gogh. Quero que a obra dele me fale à alma”, justifica a postura. O sentimento em relação a Carlos Drummond de Andrade é o mesmo, de acordo com ele.

“Sei que Drummond tem a dimensão da poesia, que, por sinal, está extremamente fraquejada, como a pintura que, neste momento, está indo para certos descaminhos”, afirma, aproveitando a oportunidade para tecer críticas ao mundo da arte contemporânea. “A pintura, assim como a poesia, corre o risco de perder a própria essência”, acredita Bracher. “Por isso quando vejo Van Gogh e Drummond me dá vontade de chorar, de acreditar na vida. Em Drummond, por exemplo, há uma permanência de delírio. Estamos na vida para o delírio. Eu quero é delirar”, conclui o pintor, cujo ritmo irrequieto, investigativo e frenético está impresso na consagrada obra, que circula pelo mundo.

Um dos nomes das artes plásticas brasileiras mais respeitados, Carlos Bracher já fez individuais em Paris, Roma, Milão, Moscou, Tóquio, Pequim (foi o primeiro brasileiro a expor na China), Londres, Roterdam, Haia, Madri, Lisboa, Montevidéu, Santigo e Bogotá.

Mineiro da Zona da Mata, o artista produz na histórica Ouro Preto séries temáticas e outras pinturas que vêm percorrendo galerias nacionais e internacionais. Casado com a pintora Fani Bracher, ele é irmão de Nívea, Décio e Paulo Bracher, os dois primeiros também pintores, já falecidos, e o terceiro músico.

CINEMA

Para a jornalista e documentarista Blima Bracher, o pai Carlos Bracher “tem uma força criadora bestial”. “Ele é uma força da natureza na criação. Tem tanto o dom da pintura quanto o da palavra”, atesta ela que, no ensejo da posse do pai, na cadeira da AML, vai lançar, na sede da entidade, o quarto documentário sobre a obra o aritsta.

Trata-se do média-metragem “Ouro Preto – Olhar poético”, baseado no livro homônimo de Carlos Bracher, por meio do qual o público é convidado a conhecer as belezas e mistérios da cidade histórica, sob a ótica o artista.

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