Literatura

Fortalecendo um gênero  

Curta trajetória de Raphael Montes mostra como tem estimulado a leitura entre jovens e evidenciado estilo policial

Por Vinícius Lacerda
Publicado em 02 de janeiro de 2015 | 04:00
 
 
 
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Raphael Montes tem dois livros lançados por grandes editoras e uma carreira em ascensão no mercado literário em um gênero de pouca aceitação no Brasil: o policial. Ao contrário do que se possa esperar de um escritor nessa posição – pelo menos num primeiro momento –, ele mantém relação direta e constante com seus fãs pelas redes sociais e sempre os recebe para fotos e autógrafos com espontaneidade e simpatia.
 

Por meio dessa postura, conta Montes, ele tenta mostrar, entre outras coisas, que a profissão de escritor é vista por ele com normalidade. “Acredito que a literatura no Brasil sempre teve um ranço meio elitista, uma ideia de que os escritores são extremamente inacessíveis e que são sempre pessoas excêntricas. Como se os escritores escrevessem apenas pelo puro deleite. Eu busco a escrita como profissão, assim como um engenheiro ou advogado, e tenho uma vida totalmente normal. Evito esse deslumbramento que existe em torno do ‘escritor’”, afirma Montes.

O autor completa dizendo que colocar o escritor em um lugar inatingível pode ter influências nocivas ao estímulo da leitura. “Eu percebo que muitos colégios acabam formando não leitores ao apresentarem os escritores como seres superiores, que utilizam um linguagem muito difícil. O que eu busco é desconstruir essa imagem”, comenta.

Um objetivo que tem conseguido atingir com eficiência. Prova disso é que seus livros, “Suicidas” (Benvirá) e “Dias Perfeitos” (Companhia das Letras), ambos destinados ao público adulto, têm atingido principalmente leitores jovens e até mesmo adolescentes. “Os meus livros são adultos e vendidos dessa forma, o fato de eles estarem atingindo um público tão jovem – às vezes de 14, 15 anos – me surpreende”, comenta.

Uma das explicações, segundo Montes, vem de uma premissa básica para qualquer livro. “Acho que leitores estão sempre em busca de uma boa história e eu me preocupo em contar uma narrativa envolvente que tenha reviravoltas, suspense e tensão”, comenta. Outra explicação para isso advém do fato de ele também ser jovem e, por isso, conhecer com intimidade o público juvenil. “Sei quais são as demandas, quais são as pegadas sobre sexo que funcionam e até mesmo usar um palavrão que atinja melhor esse público”, conta.

Muitos desses jovens fazem parte da “geração Harry Potter”, que cresceu lendo as obras de J. K. Rowling e agora procura obras mais maduras. Esse é o caso do estudante Clóvis Marcelo Nascimento, 21. “Descobri os livros pelas redes sociais, quando o Raphael participou de um vlog literário dando dicas de como escrever, e fiquei muito curioso de conhecer sua escrita. Não me decepcionei, devorei as páginas de ‘Dias Perfeitos’, que foi um dos livros que mais me fizeram interagir com o papel dos personagens. Confesso que fiquei frustrado com o final e, ao mesmo tempo, contente em saber que um autor foi capaz de me causar essa sensação”, diz.

Gênero. Com um público tão jovem, o abundante compartilhamento nas redes sociais é quase inevitável. Todos os dias surgem novos posts e imagens de fotos com ele. “Enquanto o adulto geralmente comenta com amigos ou com ninguém os textos que lê, as pessoas mais novas fazem questão de compartilhar tudo, pois querem que os outros conheçam suas opiniões sobre os mais variados assuntos, inclusive sobre o que estão lendo”, opina Montesl.

Esse fator provavelmente impulsionou não só as vendas dos livros de Montesl, mas também o crescimento no interesse pelo gênero policial no Brasil. “Antes de ser escritor, sou um leitor e sempre li de tudo, mas principalmente literatura policial. E sempre me incomodou não haver uma tradição maior do gênero no país”, diz.

Embora Montes cite Luiz Alfredo Garcia Roza – vencedor do Prêmio Jabuti por seu livro inaugural, “O Silêncio da Chuva” – e Tony Bellotto – conhecido principalmente por assinar a tríade de livros sobre o investigador Bellini e os casos que resolve na capital carioca – como duas referências importantes do estilo no Brasil, acredita que ainda há pouca solidez no gênero. “Na Inglaterra, temos a Agatha Christie com mais de cem livros publicados, enquanto aqui o Garcia Roza é o que mais tem, com uns dez”, compara Montes.

Analisando a repercussão que teve em 2014 e considerando o contexto descrito, Montes acredita que esteja contribuindo para popularização do gênero e, mesmo sentindo-se orgulhoso por isso, sabe que isso se trata de uma fase. “Tenho uma teoria de que isso vai acabar, eu vou passar e espero que outros escritores brasileiros do gênero surjam e que o leitor do Raphael Montes torne-se leitor do gênero, que lerá todos esses novos autores”.

Futuro. Com toda repercussão de seu trabalho, Raphael Montes passou a ser um dos escritores mais requisitados para mesas de bate-papo em eventos literários. Como se não bastasse, suas obras serão adaptadas para o cinema.

“Eu não quis me envolver no roteiro. Dou meus palpites quando o Rodrigo Texeira (produtor responsável) pergunta alguma coisa”, comenta. Além disso, dedica-se atualmente a escrever uma série para um canal pago. “Eu realmente tenho interesse em criar uma carreira na TV e no cinema”, afirma.

Mesmo com isso em mente, não planeja nunca deixar a literatura de lado. Tanto que é que seu terceiro livro, “Jantar”, que provavelmente sairá também pela Companhia das Letras, já está a caminho. Como os antecessores, é um policial, mas com reviravoltas que com certeza fãs de todas as idades estão ansiosos para conhecer.

Revistas

Além de dois livros, Raphael Montes teve seus contos de mistério publicados na revista “Playboy” e na norte-americana “Ellery Queen Mystery Magazine”.

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