Artes cênicas

Maternidade e “progresso” 

Espetáculos “Como Matar a Mãe e “Parada do Trem voltam ao cartaz nesta quinta na Campanha de Popularização

Por Daniel Toledo
Publicado em 28 de janeiro de 2015 | 04:00
 
 
 
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Em uma espécie de contraponto às numerosas comédias rasgadas que engrossam a programação da Campanha de Popularização do Teatro e da Dança, o fim de semana traz duas estreias em que o humor parece se equilibrar com reflexões sociais e existenciais bastante caras aos nossos tempos. A partir desta quinta, enquanto “Como Matar a Mãe” fará curta temporada na Sala João Ceschiatti, “Parada do Trem” seguirá até 9 de março na Funarte MG.

Vencedor do Prêmio Clóvis Salgado de Incentivo às Artes Cênicas 2013/2014, “Como Matar a Mãe” é o espetáculo de estreia da Sofisticada Companhia de Teatro e traz à cena situações e reflexões que remetem a experiências familiares dos atores que as interpretam. Interessados em problematizar as complexas relações entre mães e filhos, os atores da companhia recorreram às próprias histórias de vida, assim como a três marcantes personagens da literatura dramática: Medeia, de Eurípedes; Winnie, de Beckett; e a Mãe Coragem, de Brecht.

“A primeira delas aborda a questão do amor incondicional ao filho, afirmando que as mães podem, sim, ser capazes de amar mais o marido do que o filho – e isso não as torna menos mães, apenas mais humanas. Em seguida, tratamos da mãe superprotetora, que demonstra tanto apego pelo filho que se mostra capaz de destruir seu casamento para não perdê-lo. Por fim, nos voltamos a um outro tipo de superproteção, vindo de uma mãe que se faz excessivamente forte e acaba desenvolvendo uma relação muito severa com o filho”, descreve o ator e dramaturgo Leonardo Kildare Louback.

Ainda que as mães apresentadas no espetáculo escapem ao modelo propagandeado em comerciais de margarina, ele esclarece que a intenção do trabalho não é julgá-las ou desqualificar seus sentimentos pelos filhos. “São amores estranhos, mas que não deixam de ser amor. Por acreditarmos nisso, apenas apresentamos essas histórias, sem qualquer tipo de juízo”, garante Louback.

“Quando estreamos, no ano passado, muitas pessoas que assistiram ao espetáculo voltaram depois trazendo as mães”, completa o ator, apostando no potencial terapêutico do trabalho. “Com o tempo, nós mesmos aprendemos a achar graça nessas mães, a encará-las de outra forma”, diz.

Histórico. Ultrapassando o universo familiar em direção a questões sociais e históricas, “Parada do Trem” encontra no abandono das estações ferroviárias do país um modo de problematizar os impactos do “progresso” e da urbanização sobre pequenas localidades. “Ao mesmo tempo em que o espetáculo tem certo ar saudosista, há também uma forte dimensão crítica e documental”, observa o diretor e dramaturgo Geraldo Octaviano, neto de agente ferroviário.

Além do resgate de memórias e reflexões pessoais, a construção da dramaturgia envolveu um amplo levantamento de dados relacionados ao universo das ferrovias e uma viagem de boa parte da equipe por estações abandonadas em diferentes pontos de Minas Gerais.

“Ao longo dessa viagem, nos envolvemos principalmente com as pessoas que vivem ou viviam no entorno das linhas, dentre os quais vendedores ambulantes e os próprios ferroviários. Muitos tiveram seus planos e sonhos interrompidos com o final dessas linhas”, exemplifica o diretor, que aponta o teatro de Brecht como importante referência da encenação.

“O que nos interessa não é exatamente a construção de personagens, mas a conversa com o espectador. Sempre nos apresentamos em espaços relacionados a antigas estações de trem e aproveitamos essas ocasiões para fazer algum tipo de denúncia sobre o abandono das estruturas e tudo o que esse abandono acarreta. Mas tudo isso com muita poesia e até mesmo certo humor”, diz Octaviano.

Programe-se

Como Matar a Mãe”. estreia nesta quinta. De quinta a sábado, às 21h; e domingo, às 19h, na Sala João Ceschiatti, no Palácio das Artes (av. Afonso Pena, 1.537). R$ 15.

Parada do Trem”. Desta quinta a 9 de março. Quinta a sábado, às 20h; domingo, às 19h, na Funarte MG (rua Januária, 68, Floresta). R$ 10

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