Festival de Brasília

Minas domina noite da mostra 

Equipes de “A Cidade Onde Envelheço e de “Constelações e “Solon protestam contra o fim do Filme em Minas

Por DANIEL OLIVEIRA
Publicado em 26 de setembro de 2016 | 03:00
 
 
 
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Além de “A Cidade Onde Envelheço”, outras duas produções fizeram da noite de sexta um “Comando Minas Gerais” no Festival de Brasília”. Os curtas “Solon”, de Clarissa Campolina, e “Constelações”, de Maurílio Martins, foram exibidos na competitiva oficial do evento. De quebra, o único outro longa da noite, o cearense “O Último Trago”, foi montado por Campolina. Brasília.

Se nele, a mineira teve que dar conta do surrealismo da produtora Alumbramento, em seu trabalho pessoal, suas referências eram outras. “Trabalhei a partir da land art e do 16 mm para ter o grão, a materialidade e uma textura de formas mais orgânicas que hi tech”, explicou no debate. Isso porque “Solon” é uma produção fortemente sensorial e provocadora sobre a origem do mundo, com uma performance da dançarina Tana Guimarães em meio a um cenário terroso e primitivo.

Apesar da premissa, Campolina afirma que nunca teve uma referência sci fi. “Para mim, tinha que ser tudo orgânico. Tive um filho no processo, e a ideia da água, do nutrir, foi me guiando para que ela e a paisagem dialogassem”, explica.

E mesmo saindo um pouco da sua zona de conforto, “Solon” dá sequência à narrativa por meio de texturas e sensações que Campolina desenvolve desde a Teia. “Esse tem a coisa da performance, de unir linguagens e com a ideia do fim do mundo para onde a gente caminha, com uma fábula da gênese de um feminino que pode fazer renascer tudo. Mas não tem passado, nem futuro, estamos lidando com o presente, todas as imagens são reais”, argumenta.

Já em “Constelações”, Maurílio Martins trabalha em uma chave bem mais pessoal. No curta, um motorista (Renato Novais) dá carona a uma dinamarquesa (Stine Krog-Pedersen). Durante um temporal, ele faz uma confissão sobre um trauma de infância. E ela revela que veio ao Brasil em busca do pai, que não vê desde os 6 anos de idade.

Se a história dele é facilmente identificável como a biográfica, a dela é um pouco mais surpreendente. Martins, que vive numa ponte aérea Copenhagen-Contagem, se separou da esposa e deixou o filho Eric lá. O monólogo da personagem é uma projeção do medo do cineasta sobre o que o filho pode crescer pensando, sem o pai. E o detalhe mais importante: quem interpreta o texto, em dinamarquês, é sua ex-esposa.

“No pitching, falei que ela atuaria, sem perguntá-la antes. Ainda bem que ela topou, nenhuma pessoa poderia sentir mais minha dor que ela”, admitiu o diretor, no debate. Engenheira, ela conseguiu seis dias de folga no trabalho em Copenhagen, e o curta foi filmado em dois dias.

Segundo ele, “Constelações” é um trabalho sobre medos passados e futuros. “O texto dela é o medo do futuro, do que pode acontecer comigo, meu filho e filhos de casais de nacionalidades diferentes. E o dele, do medo de nadar, da chuva, é um medo do passado, que chorei, quando estava no banco de trás do carro e ouvi um amigo falando algo que é muito meu, e me convencendo”, confessa.

Os títulos mineiros, e o cearense, também chamaram a atenção pela politização de suas obras. As quatro produções foram iniciadas pelo selo “Cinema Contra o Golpe”, estampado também nas camisas de vários profissionais do evento, além da manutenção da logo “Pátria Educadora” do governo Dilma Rousseff. Segundo o produtor de “Constelações”, Thiago Macêdo Correia, a ideia surgiu de uma discussão coletiva. “Queríamos usar o Festival de Brasília como modo de posicionamento a tudo que está acontecendo”, afirmou.

Ele e os colegas também usaram a noite para protestar contra o fim do edital Filme em Minas. Segundo eles, as novas diretrizes do Prodam, coordenado pela Codemig, é voltada exclusivamente para produções de caráter mercadológico, o que significa que produções como as que estão concorrendo no festival podem não mais serem produzidas no Estado. “A nova gestora é puramente desenvolvimentista, então estamos lutando para que não haja retrocesso e para que nossos filmes continuem sendo feitos”, argumentou Luana Melgaço, produtora de “A Cidade Onde Envelheço”.

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