Num ensaio publicado na década de 1980, o pensador francês Gérard Lebrun chamava atenção sobre a atualidade do pensamento do filósofo alemão Friedrich Nietzsche. "Muito se enganaria quem pretendesse travar conhecimento com um filósofo a mais", escreveu Lebrun.

"Nietzsche não é um sistema: é um instrumento de trabalho: insubstituível. Em vez de pensar o que ele disse, importa acima de tudo pensar com ele. Ler Nietzsche não é entrar num palácio de de idéias, porém iniciar-se num questionário, habituar-se com uma tópica cuja riqueza e sutileza logo tornam irrisórias as "convicções" que satisfazem as ideologias correntes", completava o pensador.

Daí a importância do trabalho de Paulo César de Souza para a filosofia nacional. Tradutor conhecido dos leitores brasileiros " é dele, por exemplo, a tradução do romance de Raymond Radiguet, "O Diabo no Corpo" ", Paulo começou a verter para a língua de Camões a obra do pensador alemão ainda em 1985, com a autobiografia nietzschiana "Ecce Homo".

Desde então, o tradutor exerceria um trabalho de formiguinha, fundamental na difusão do pensamento do filósofo alemão por aqui.

Paulo já entregou ao público brasileiro a tradução de livros essenciais do filósofo alemão, como "Além do Bem e do Mal", "Genealogia da Moral", "Humano, Demasiado Humano" e "O Nascimento da Tragédia" " e afirma que começou a traduzir Nietzsche por conta própria, ainda nos anos 80.

De lá para cá, nunca mais parou. "Desde o início da década de 90 me dedico apenas à tradução de Nietzsche e Freud", explica Paulo. "Pretendo traduzir todas as obras que Nietzsche publicou enquanto viveu, num total de 14 volumes", completa.

Agora é a vez de "O Anti- Cristo " Maldição ao Cristianismo e Ditirambos de Dionísio" chegar às livrarias.

Publicado pela primeira vez em 1895 " pela polêmica irmã do filósofo, Elisabeth Foerster ", "O AntiCristo" foi originalmente planejado como o primeiro volume de uma grande obra que se chamaria "Tresvaloração de Todos os Valores".

Com a perda da razão de Nietzsche, em 1888, esse trabalho jamais seria finalizado. Já "Os Ditirambos de Dionísio" é um conjunto de poemas compostos pelo filósofo e inspirados no deus grego Dionísio: os nove poemas ganham agora a primeira versão brasileira, em edição bilíngue alemão-português.

"Traduzir Nietzsche requer muita paciência e alguma ciência", afirma Paulo. "Procuro atentar não só à exatidão dos sentidos, mas também à sonoridade das frases e beleza das palavras", afirma.

"Ele é considerado o maior prosador do alemão moderno, e tento fazer justiça ao escritor, ao artista da palavra, tanto quanto o pensador", completa.

Edição cuidada
Dividindo atualmente seu tempo entre a tradução do filósofo alemão e a obra do mestre de Viena, Paulo revela que a idéia de publicar uma coleção de obras de Nietzsche nasceu de uma proposta feita por ele ao editor paulista Luiz Schwarcz, da Companhia das Letras.

"Propus ao Luiz que lançássemos as obras em edições bem cuidadas, com muitas notas e índice remissivo". A idéia deu certo e, hoje, três títulos do filósofo " "Além do Bem e do Mal", "Humano, Demasiado Humano" e "O Nascimento da Tragédia" " fazem parte da coleção de bolso da editora, que vende livros a preços mais baixos.

AGENDA ""O AntiCristo " Maldição ao Cristianismo e Ditirambos de Dionísio", Editora Companhia das Letras, 176 págs., R$ 34