Diversidade

O início de um novo conceito

No embalo de Laverne Cox, atores transgêneros ganham mais espaço na televisão e no cinema norte-americano

Por erik piepenburg
Publicado em 04 de julho de 2015 | 03:00
 
 
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Nova York, EUA. “A diferença é enorme quando uma pessoa trans de verdade interpreta o papel”.
A afirmação foi de Laverne Cox, em 2011, sobre o fato de que, após anos de visibilidade intermitente, os atores transgêneros como ela estão ganhando mais espaço no cinema e na TV como personagens transexuais, em geral mulheres. Quatro anos depois, ela foi indicada ao Emmy pelo papel na série do Netflix “Orange Is the New Black”, já na terceira temporada, e será vista ainda este ano como uma velha amiga da personagem de Lily Tomlin em “Grandma”. Com seu sucesso, está redefinindo, física e culturalmente, o conceito do que é ser ator.

Mas e os outros artistas trans? Será que o destaque de Laverne ampliou suas chances na sala de testes ou fez surgir apenas uma nova onda de personagens transexuais? Um bate-papo com os atores transgêneros em destaque no cinema e na TV sugere que a ascensão da atriz ao estrelato redefiniu muitas regras.

“Muita coisa mudou, principalmente nesses últimos dois anos, desde o sucesso de ‘Orange’. Laverne foi quem abriu as portas para nós, fazendo com que o público percebesse que somos humanos também, temos uma história de vida”, afirma Trace Lysette, que interpreta uma instrutora de ioga trans na série “Transparent”, do Amazon.

A nova leva do talento transgênero inclui muitos atores estreantes, incluindo Mya Taylor, que está em “Tangerine”, filme que fez sucesso no Festival de Sundance e deve estrear nos EUA Neste mês, e Michelle Hendley, protagonista do recente “Boy Meets Girl” (2015) com direito a uma cena de nudez corajosa. Outros – como Alexandra Billings, que encarna a confidente do personagem de Jeffrey Tambor, pai de três filhos em “Transparent” – também estão se tornando conhecidos do grande público após anos de papéis menores.

Brad Calcaterra, professor de artes dramáticas de Nova York que tem Laverne Cox entre seus alunos, diz que o número de atores trans em seu curso explodiu. Para ele, a arte não tem sexo.

Já Tom Phelan, que interpreta um adolescente transgênero no programa “The Fosters”, do ABC Family, quanto mais jovens como ele começarem a ganhar destaque nacional como atores, mais complexos os papéis se tornarão, exigindo mais dos atores emocionalmente.

E comenta a cena, gravada em uma praia, em que tinha que tirar a camiseta. “A câmera mostra minhas cicatrizes, o que achei legal. Se eu fosse um cara trans vivendo num lugar que ainda não passou por muitas transformações, seria incrível ver a reação causada pelo programa”.

Recentemente, a reportagem conversou com esses atores para os quais novas portas estão se abrindo e os novos desafios que têm pela frente. Aqui estão alguns trechos.

Como vocês descreveriam o momento em que os atores trans se encontram?

Tom Phelan: A situação hoje é melhor do que nunca. Deixaram de escalar só a mesma meia dúzia de sempre, mas ainda é meio limitado.

Alexandra Billings: Há mais oportunidades, mas é bom que se preste atenção. Elas são muito específicas: ou estamos no hospital, visitando alguém que está internado, ou na prisão, sempre em algum tipo de “jaula”. Imagine colocar um de nós responsável por uma criança ou no mundo corporativo, onde está o poder! As coisas estão melhores em termos específicos, mas é difícil dizer que a coisa melhorou no geral.

Trace Lysette: Quando chegarmos ao ponto em que o pessoal trans for incluído no processo criativo, a narrativa se tornará muito mais autêntica. Atores trans interpretando personagens trans já é um avanço essencial, mas a verdade é que muita gente boa não consegue nem chegar à sala de testes, isso é inegável.

Vocês já sentiram alguma discriminação no set?

Laverne Cox: Já teve caso em que a pessoa confundiu meu sexo, falando sobre mim usando o pronome errado. No início da carreira eu meio que levava isso para o lado pessoal, perdi um pouco o foco, mas aprendi. Agora, quando acontece, e percebo que é uma coisa de trabalho, só corrijo delicadamente. Se for para bagunçar com o que eu estiver fazendo, nem me dou ao trabalho. No fim das contas, o que aparece na tela é o que importa.

Trace Lysette: Nada muito negativo, só alguns toques para ensinar certos termos que as pessoas geralmente não conhecem. Seria legal se todo mundo soubesse o significado de “cisgênero”. Todos têm acesso ao Google, dá para descobrir o que é apropriado perguntar a um transexual ou não.

Mya Taylor: O nosso pessoal técnico já estava bem familiarizado com os trans. Dava para ver que tomava muito cuidado na hora de dizer certas coisas. Todo mundo foi muito respeitoso.

Michelle Hendley: Eu lido com isso no dia a dia. É importante também saber quem é a pessoa, qual sua intenção. Está tentando me magoar ou simplesmente não entende? Sou superaberta para esse lance de educar.

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