Grécia

Poder, amor e sexualidade 

A peça “Os Mercadores das Nações coloca em diálogo conflitos entre países e expressão de desejos de uma mulher

Por joyce athiê
Publicado em 27 de maio de 2016 | 03:00
 
 
 
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O grupo grego Opera Theatre foi buscar em um texto escrito no século XIX, ambientado no século XII e XIII, condições para entender a história do próprio país e refletir sobre a atualidade, sobretudo, a crise na Grécia. A peça “Os Mercadores das Nações”, que será apresentada hoje e amanhã, no Festival Internacional de Teatro Palco e Rua - FIT-BH, é baseada no romance homônimo do também grego Alexandros Papadiamantis, conhecido por seus contos, mas com algumas atuações como romancista.

A trama coloca em diálogo um contexto histórico e político e uma relação de amor e sexualidade, sem, segundo o diretor Thodoris Abazis, deixar qualquer um dos aspectos como pano de fundo. “Há uma conexão forte entre eles e isso é o que interessa”, afirma ele.

À época em que a história se situa, tempos das Cruzadas, Veneza era um grande centro de poder político e econômico, o que contaminou a população com um sentimento de superioridade, mesmo diante de questões que não se referiam às trocas comerciais. Foi esse contexto que levou um comerciante veneziano, apaixonado pela beleza de uma mulher, casada com um conde grego, a sequestrá-la para suas terras. Embora a história relembre a Guerra de Troia, o diretor diz haver mais diferenças do que semelhanças. “A questão do ‘Os Mercadores das Nações’ é a relação entre o amor e o poder, entre o dar e o ter, a doação incondicional e a ambição por ser detentor de algo”.

Além de pensar o confronto entre gregos e venezianos, Abazis explicita a esfera de dominação de um país sobre o outro, das formas como as grandes potências interferem na política, na economia e na cultura de outros povos, em nome do poder e do capital. “Se antes Veneza ocupava este lugar, quem são os dominadores de hoje?”, indaga.

Mas entre a denúncia sobre a dominação das nações, umas sobre as outras, surge outro elemento de interesse na história. Augusta, a mulher sequestrada, guia-se por seu desejo sexual e por uma paixão avassaladora que a desperta. “Para a época em que a história foi ambientada e mesmo quando foi escrita, esse pensamento era revolucionário, uma quebra de paradigmas”, diz Papadiamantis.

A explosão de sentimentos de Augusta, o fogo e a libido, no entanto, a levam à morte, marcando que a luta pela liberdade feminina ainda haveria caminhos árduos a percorrer.

O diálogo entre o passado e o presente, a tradição e a contemporaneidade, se revela também na construção dramatúrgica, que, entre outros elementos, conjuga texto, música, canto, movimento, gestos e tecnologia multimídia. É o que se chama de teatro completo (total theatre). “Essa forma tem origem na ópera contemporânea e atravessa o teatro. Fazemos uso de várias possibilidades cênicas para contar a história, sem que nenhuma delas tenha força menor”, diz ele. “A sonoridade do espetáculo, por exemplo, se constrói não apenas pelas músicas executadas ao vivo, mas também pela musicalidade do texto e dos movimentos”.

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O momento é interessante para ver ou rever “À Tardinha no Ocidente”, outra atração do FIT, em cartaz amanhã, na Praça Duque de Caxias, e domingo, na Praça da Liberdade, ambos às 16h. O texto caminha pela história política brasileira e pinça alguns momentos marcantes, abordados de forma debochada e satírica. A peça se faz porosa, com espaços possíveis para o diálogo com a atualidade, o que não torna ingênuo esperar uma atualização com apontamentos sobre golpe e fraudes. Apresentada ao ar livre, é um bom exemplo para adultos e crianças assistirem juntos. A dramaturgia é construída a partir de um resgate das brincadeiras de rua e coloca o público dentro de um jogo.

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