Oscar 2015

Sem cartas marcadas 

Pelo segundo ano consecutivo, prêmio de melhor filme é disputado entre dois fortes candidatos

Por Daniel Oliveira
Publicado em 22 de fevereiro de 2015 | 03:00
 
 
 
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No fim da primeira quinzena de janeiro, tendo ganhado a maioria dos prêmios da crítica e o Globo de Ouro, “Boyhood – Da Infância à Juventude” parecia o favorito imbatível ao Oscar de melhor filme. Apenas duas semanas depois, ao perder o prêmio dos três principais sindicatos – dos atores, produtores e diretores – para “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)”, tudo indicava que era o filme do mexicano Alejandro G. Iñárritu que sairia o grande vencedor neste ano. Bastaram alguns dias, porém, para “Boyhood” levar o Bafta de melhor filme e direção e voltar ao páreo.

Se fosse um jogo de cartas, a corrida pelo Oscar 2015, que termina hoje a partir das 20h30 com exibição ao vivo no TNT, seria o verdadeiro “Celebrity Poker Showdown”. Pelo segundo ano consecutivo, os dois melhores longas indicados chegam na grande noite à espera da última carta a ser virada, com chances reais de levar tudo, sair com nada – ou dividir os dois principais prêmios da noite. Cada um com diferentes cartas na manga e legiões de fãs fervorosos preparados para defender sua causa. O resultado? Só quando todas as cartas estiverem na mesa.

Levados em conta a tendência recente da Academia de premiar filmes que falam sobre a própria indústria (leia-se “Argo” e “O Artista”) e o fato de possuir o apoio dos três maiores sindicatos de Hollywood, “Birdman” deve ser encarado como o grande favorito. Mas o apelo emocional de “Boyhood”, a originalidade única de sua premissa e a paixão despertada em seus admiradores pelas derrotas recentes não devem ser subestimados.

No fim das contas, com a disputa acirrada e o método de votação em que os membros listam os filmes do melhor (1) ao pior (8), nenhum dos dois deve alcançar a maioria dos votos apenas com números 1. O vencedor vai ser aquele que aparecer mais no número 2 ou 3 das listas. Há ainda aqueles que acreditam que “Sniper Americano”, com sua bilheteria fenomenal (maior do que a de todos os outros indicados juntos) e sua força para aos velhos brancos e conservadores da Academia, possa ser um azarão. Mas é o mesmo método de votação descrito acima que torna a vitória de um longa divisivo como o de Clint Eastwood improvável: ele pode até aparecer em um bom número de primeiros lugares, mas dificilmente vai ter muitos segundos ou terceiros.

Uma categoria importante em que “Sniper” pode realmente aparecer como azarão é a de melhor ator, uma das mais concorridas da noite. O favorito Michael Keaton (“Birdman”) viu seu blefe ser desbancado por Eddie Redmayne no Sindicato dos Atores e no Bafta, com o protagonista de “A Teoria de Tudo” assumindo a pole. Por agora. Porque o sucesso de “Sniper”, o fato de que essa é a terceira indicação seguida de Bradley Cooper e a aclamação do ator como “O Homem Elefante” na Broadway tem feito muitos apostarem no atual queridinho de Hollywood como o coringa surpresa da categoria.

A vitória ou não de Keaton será um dos grandes indicadores da força de “Birdman” junto à Academia – e consequentemente, do resultado final da noite. Ela faz parte de algumas categorias-chave, que quem não quer perder o bolão deve ficar de olho. As outras são melhor montagem, na qual uma derrota de “Boyhood” será um péssimo sinal para o filme; e roteiro original, em que o êxito de “O Grande Hotel Budapeste” sobre “Birdman” também indicará fragilidade do longa de Iñárritu.

Mesmo tendo liderado as indicações, o longa de Wes Anderson, por sinal, deve assistir ao duelo pelas categorias principais sem desperdiçar suas fichas. No entanto, elas não devem ser poucas, já que as estatuetas de design de produção, figurino e maquiagem dificilmente escapam das mãos do filme estrelado por Ralph Fiennes.

Junto com ele, no grupinho do “oba, oba, já ganhei”, Julianne Moore (“Para Sempre Alice”), Patricia Arquette (“Boyhood”) e J. K. Simmons (“Whiplash”) já vão com os discursos de melhor atriz, atriz coadjuvante e ator coadjuvante, respectivamente, prontos. Assim como Emmanuel Lubezki, pela fotografia de “Birdman”, John Legend e Common por “Glory”, canção-tema de “Selma”, e Laura Poitras pelo filme sobre Edward Snowden “Citizenfour” – que ganhou praticamente todos os prêmios de documentário do ano passado e, com o perdão a Sebastião Salgado que já teve aclamação o bastante para uma vida, não deve dar muitas chances a “O Sal da Terra”.

Essas são as categorias para não perder no bolão, deixando neurônios para serem queimados na decisão entre “Birdman” e “Boyhood”. Uma disputa que, como bem definiu o crítico e historiador Mark Harris, um dos maiores especialistas em premiações nos EUA, sintetiza perfeitamente o que a temporada do Oscar representa para a indústria. “‘Birdman’ é um filme sobre alguém que deseja criar algo tão bom quanto ‘Boyhood’”, ele afirmou. É uma batalha que mostra como, em meio a enxurradas de super-heróis e blockbusters vazios, ainda existem artistas em Hollywood que esperam criar algo tão sublime e complexo quanto a vida. E nesse duelo entre criador e criatura, que vença o cinema.

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