Autobiografia

Volta de obra de Adalgisa Nery é bem-vinda 

A narradora explica sua personalidade, o que prejudica o andamento da obra


Publicado em 13 de fevereiro de 2016 | 04:00
 
 
 
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São Paulo. É bem-vinda a volta às livrarias de “A Imaginária”, de Adalgisa Nery (1905-1980), romance publicado originalmente em 1959. A edição bem cuidada, organizada por Ramon Nunes Mello, que tem prefácio de Ana Arruda Callado, posfácio de Affonso Romano de Sant’Anna e nota biográfica, recoloca a autora em circulação.

Adalgisa foi casada com o pintor Ismael Nery (1900-1934), morto prematuramente de tuberculose, aos 33 anos, cuja obra só começaria a ser reconhecida a partir de 1965, quando foi incluída na Bienal de São Paulo.

Trata-se de um romance autobiográfico no qual ela conta sua vida até os primeiros anos de viuvez. Inicialmente narra uma infância atribulada devido à doença e, em seguida, à morte da mãe, quando ela tinha 8 anos.

O casamento do pai e os desentendimentos com a madrasta a levam a um internato, do qual sairia logo. Aos 15 anos se apaixona por um vizinho e se casa com ele, contrariando a vontade do pai. A partir de então, sua vida é perturbada pela loucura da sogra, sempre chamada de “a mãe do meu marido”.

A protagonista é a única personagem que recebe um nome, Berenice, as outras são entidades como “o meu marido”, “a tia do meu marido”.

Ela vive numa casa de loucos, com brigas constantes. Funcionário público que desprezava seu emprego, o marido parece-lhe inteligente e digno de admiração, tem amigos intelectuais que frequentam sua casa. Submissa, em posição subalterna, ela assiste às conversas, não participa delas.

Com a doença do marido, a situação se deteriora de vez, já que ela tem de se submeter ao seu contato físico, mesmo nos acessos de tosse, sem falar das infidelidades que ele não tenta esconder.

CONFLITOS. Embora realce mais os conflitos familiares do que a sua formação intelectual, é certo que ela era uma jovem inculta ao se casar, ao passo que, após a morte do marido, teve condições de arrumar emprego e cuidar de sua vida de maneira autônoma. Adalgisa publicaria seu primeiro livro de poesia em 1937, três anos após a morte de Ismael Nery, incentivada por Murilo Mendes, seu admirador, que tinha sido amigo do marido morto.

Narrado em primeira pessoa, bem escrito e bem estruturado, o romance é centrado na protagonista que, desde o início, mostra-se um ser sensível e rebelde, que não aceita ordens e contrariedades.

A personagem-narradora tende a explicar de maneira enfática demais sua personalidade, o que prejudica o andamento e o interesse da história, mas isso não diminui a importância do romance. (Eurídice Figueiredo)

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