“Querido avô, fico triste até hoje com isso tudo que você me fez, sabe, me machucou muito, mas estou melhorando aos poucos. Começou quando você fez isso comigo (quando eu tinha) 5 ou 6 anos, e eu não sabia o que o senhor fazia comigo, eu apenas deixava mas, agora que eu cresci, sei que o que você fazia comigo era errado”, começa a carta de uma menina de 13 anos que foi essencial para a polícia prender o pai e o avô da adolescente por suspeita de estupro em Janaúba, no Norte de Minas, no início deste ano.

A história dela se repete: em Minas, foram quase 13 casos de estupro de mulheres por dia em 2018, segundo o Anuário de Segurança Pública 2019. A maioria das vítimas brasileiras é composta por meninas de até 13 anos. 

No Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres, nesta segunda, a Organização das Nações Unidas escolheu o combate ao estupro como tema da campanha de conscientização da entidade pelos próximos dois anos. “O estupro não é um ato isolado e breve. Ele danifica a carne e reverbera na memória”, escreve Phumzile Mlambo-Ngcuka, diretora da ONU Mulheres, em comunicado. 

A organização fala em uma cultura do estupro, um “ambiente social que permite que a violência sexual seja considerada normal e justificável” – nessa conta, entram desde punições ineficazes contra os criminosos até culpar a vítima pela roupa curta que vestia quando foi atacada. Dezesseis ações, recomenda a ONU, podem ajudar no combate diário contra essa cultura (veja algumas delas abaixo).

“O empoderamento das mulheres, nós termos mais consciência do é o machismo, é um aprendizado importante, mas isso vai incomodar quem está no lugar de superioridade social”, diz a socióloga especialista em relações de gênero Yumi dos Santos. Nesse cenário, mesmo movimentos como o #MeToo (em que mulheres usam especialmente as redes sociais para contar casos de abuso) ainda não foram capazes de mitigar os casos de violência sexual.

Arma de guerra 

A ONU também chama atenção para os estupros cometidos em ambientes de conflito – como em Ruanda e na Síria. Em abril, a organização oficializou uma resolução que condena o uso do estupro como arma de guerra. Por pressão do presidente dos EUA, Donald Trump, removeu menções à assistência reprodutiva às vítimas, que ele considerou apologia ao aborto. 

Combate diário: veja algumas dicas das Nações Unidas

Confira algumas maneiras de combater a cultura do estupro no dia a dia:

  • Mais do que dizer “Não” à relação sexual indesejada, estimule que se diga “Sim” quando ela é consensual. 
  • Repense conceitos de masculinidade, como “força” e “macheza”.
  • Nunca culpe a vítima – pelo que ela estava vestindo, dizendo ou bebendo. 
  • Tenha tolerância zero ao assédio sexual em qualquer ambiente. 
  • Entenda que existem agravantes do abuso: mulheres lésbicas, por exemplo, podem sofrer “estupro corretivo”, forma de violência para tentar “convertê-las” à heterossexualidade. 
  • Invista em organizações que apoiam mulheres.
  • Ouça a história das sobreviventes.
  • Nunca ria de piadas sobre estupro. Esse tipo de humor ajuda a normalizar o crime. 
  • Eduque as gerações  mais jovens, ensinando  desde cedo a importância do consentimento em uma relação.