Os homens podem até ser de Marte e as mulheres, de Vênus. Mas não importa de qual planeta cada um tenha surgido: a ciência sugere que o funcionamento do cérebro não é tão diferente entre os gêneros. Um estudo publicado em julho no “Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS)”, jornal da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, mostra que a reação do cérebro de homens e mulheres é a mesma quando veem fotos ou vídeos eróticos. A história de que a visão é mais importante para a excitação deles do que delas, portanto, seria um mito.
O estudo “Neural substrates of sexual arousal are not sex dependent” considerou 61 pesquisas anteriores que usaram ressonância magnética para identificarem as reações do cérebro de homens e mulheres de diferentes orientações sexuais quando expostos a pornografia. A análise mostrou que, no caso de estudos que assinalavam diferenças entre os gêneros, aspectos como amostras pequenas acabaram interferindo nos resultados.
“Muitos estudos têm sido feitos utilizando avaliações subjetivas feitas pelos participantes. É hora de transformar a pesquisa para chegar a dimensões mensuráveis de comportamentos”, diz Hamid Noori, um dos autores do estudo e pesquisador do Instituto Max Planck de Cibernética Biológica, na Alemanha.
Ele explica que pesquisas anteriores sugerem que mulheres se sentem menos excitadas por vídeos produzidos por homens. “Então, pode ser que evitem essas imagens porque a maioria simplesmente não é interessante o bastante para elas”, disse, em entrevista a O Tempo. Em nota, a equipe do instituto de pesquisa também destaca que influências sociais podem contribuir para afastar mulheres de seus desejos sexuais.
Olhares na rua. Noori avaliou especificamente as reações cerebrais a fotos e vídeos eróticos, mas sugere que as conclusões podem ir além: “É seguro afirmar, baseado no que foi publicado até agora, que o cérebro dos homens não é mais sensível quando veem uma mulher atraente do que o cérebro das mulheres ao verem um homem atraente”, diz. Homens que viram a cabeça para olhar mulheres andando na rua, portanto, não fariam isso por serem biologicamente mais predispostos.
Camila Carvalho, 23, estudante de fonoaudiologia, acredita que mulheres também reparam homens que passam, mas de forma diferente: “A gente olha por uma questão habitual. Mas os homens parecem dizer ‘Olha, estou aqui’ como um predador, quando olham”.
O representante comercial Sandro Teixeira, 33, concorda que há diferenças na postura entre gêneros: “O homem é mais cara dura, o grupo de amigos obriga a fazer esse tipo de brincadeira, mexer com gente na rua”.
Pornografia para homens. A redatora Natália Fernandes, 32, ainda era criança quando viu imagens eróticas pela primeira vez, em revistas do pai. Na adolescência, passou a assistir a vídeos. “A sociedade impõe regras diferentes para homens e para mulheres. Eles são incentivados a buscar a pornografia e achar natural, enquanto mulheres são reprimidas e julgadas se pensarem do mesmo jeito”, acredita.
Hoje, ela consome pornografia esporadicamente, o que faz dela uma minoria entre as mulheres. A pesquisa Mosaico 2.0, liderada pela especialista em sexualidade e professora da Universidade de São Paulo Carmita Abdo, mapeou o comportamento sexual dos brasileiros e mostrou: 33,8% dos homens consomem material pornográfico frequentemente, enquanto 9,7% das mulheres têm o mesmo comportamento.
Camila Carvalho prefere recorrer a imagens e gifs animados, em vez que vídeos, pois considera que a maioria retrata mulheres em situações desconfortáveis e até violentas. “Em determinado ponto, a cara da pessoa atuando está ruim e não parece que a cena foi acordada e que aquilo está bom”.
O estudante de história Ewerton, 24, consome pornografia e acredita que a maior parte dos filmes é feita para agradar os homens: “É comum ver a mulher tentando dar prazer para o cara, e não o contrário. Até vídeos entre duas mulheres parecem voltados para o homem”.
Mulheres fazem ‘levante’ por pornô mais feminino
A indústria dos filmes pornôs é criticada por abusos que comete contra atrizes e pelo retrato de submissão que faz das mulheres em cena. Esse cenário levou a projetos como o XConfessions, da cineasta sueca Erika Lust. Alguns filmes do site, cujo acesso é pago, são feitos a partir de relatos dos próprios visitantes e, segundo a artista, fogem ao padrão da pornografia tradicional, de “closes em genitais, pênis, roteiros ruins e histórias sem inspiração”.
Além disso, ela reúne uma equipe majoritariamente feminina por trás das câmeras. “Isso significa ter mulheres na direção, produção, direção de arte e de fotografia etc., de forma que as histórias sejam contadas sob a visão feminina. O consentimento também tem um papel central, então simulações de coerção, pedofilia ou abuso não são representadas nos meus filmes”, diz.
Ela também criou o site The Porn Conversation para orientar pais nas conversas com os filhos sobre o tema. Ela é adepta ao feminismo e afirma que seus valores são transmitidos nos vídeos, mas prefere falar em “pornografia indie” a “pornografia feminista”.
Já a escritora Nalini Narayan, autora de romances eróticos, gosta do rótulo de feminismo nos filmes. “A pornografia tradicional tem um ponto de vista machista, foca em mostrar um pênis em uma vagina de uma forma invasiva. Nossa intenção é mostrar sexo bem feito e sensual”, diz a autora, cujo romance autobiográfico “Safada” foi adaptado para um filme pornográfico que deve estrear em agosto.