Há cinco anos, o número médio de idosos que caíam em golpes em Minas Gerais era de quatro por dia. Agora, essa média subiu para 38, um salto de 850%, segundo dados do primeiro semestre de 2025, registrados pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp-MG). A estatística considera os casos de estelionato contra pessoas com mais de 60 anos. 

De acordo com o coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa, o aumento dos registros desse tipo de golpe contra idosos tem a ver com o aperfeiçoamento dos crimes cibernéticos. “Eles estão cada vez mais sofisticados e, por isso, conseguem enganar cada vez mais pessoas. A Inteligência Artificial (IA) é uma das grandes responsáveis. No caso dos idosos, em razão da própria idade, eles não têm tanta malícia e acabam caindo em vozes e imagens, acabam acreditando que estão conversando de fato com alguém de uma instituição confiável”, explica Barbosa. 

Desde falsas centrais de atendimento, vazamento de dados e boletos falsos até golpes do amor para tirar dinheiro das vítimas, a lista é enorme. Atraída por um anúncio ligado à imagem de um médico famoso, Marilene da Silva, de 61 anos, comprou um remédio para emagrecer. Pagou R$ 147, mas não recebeu a mercadoria. O boleto era falso. “Caí na besteira de abrir o Facebook e passou um rapaz vendendo o remédio, com a voz do Drauzio Varella. Aí eu falei com ele e pedi para me mandar o boleto. Paguei, e nada. Mandei mensagem reclamando, e ele disse que eu tinha que pagar uma taxa de R$ 50 para retirar o produto. Depois veio outro (boleto) de R$ 147,90, e eu, de novo, caí na mesma lábia”, lamenta.

Em 2024, o Disque 100 – canal de denúncias do governo federal – registrou 72 mil casos de golpes contra idosos. Isso significa que a cada 10 minutos um idoso foi enganado e perdeu dinheiro.

Segundo Barbosa, golpes e fraudes começaram a crescer ainda mais depois da pandemia. “O idoso ficou em casa, ele gosta de conversar. Então, os golpistas ligavam, se passavam por funcionários de bancos. Outro ponto é que, em razão do vazamento de vários dados de órgãos públicos, principalmente do INSS, os golpistas acabaram tendo em mãos dados de todas as pessoas e acabavam contratando empréstimos em nome dos idosos”. 

E foi devido ao vazamento de dados do INSS que uma idosa de Belo Horizonte viu parte do benefício de sua aposentadoria sumir da conta. “O gerente me falou que estavam tirando meu dinheiro para um sindicato de pescadores. E eu falei: ‘uai, eu não moro na beira de rio, não tenho canoa, não tenho nada’. Meu dinheiro é pouco e ainda vou ter que dividir com pescador?”, questiona.

No Procon, explicaram que ela teria o direito de receber em dobro todos os descontos indevidos. “Só que eu tinha que agendar na internet lá no INSS. Mas eu não sei fazer essas coisas”, diz. 

Inclusão digital

A dificuldade de acesso à tecnologia é uma barreira para muitos idosos. Diante dessa realidade, algumas instituições têm oferecido cursos de letramento digital. O Mercantil, por exemplo, criou o programa Meu+, para clientes acima dos 50 anos, com cursos voltados para saúde, bem-estar e educação. 

“Temos também curso de inclusão digital. A tecnologia tem uma velocidade que é difícil de acompanhar. O letramento digital é sempre uma ajuda muito bem-vinda. Também temos a parte de segurança contra fraudes. Isso é uma indústria que cresce com uma velocidade absurda, e, quanto mais conteúdos e orientações a gente puder passar, melhor será para proteger esse público de grandes ataques que aparecem no dia a dia para celular, computador e os próprios aplicativos das instituições financeiras”, afirma o superintendente de negócios do Banco Mercantil, Igor Magalhães.

"Amostra grátis"

De onde vêm os golpes contra os idosos? Segundo a cartilha do Ministério de Direitos Humanos e Cidadania, a maior parte é praticada por familiares, pessoas de confiança, estelionatários e até mesmo pelo crime organizado. Mas também pode vir das próprias instituições financeiras.

“Se eu só assinei um empréstimo consignado, como é que eu estou pagando três? O banco falou que não resolvia nada, que eu tinha que ir lá no INSS. Eu fui no Correio para entender como fazia e eles me mandaram ligar para o 135, mas eu não sei mexer”, conta uma idosa de 75 anos, que pediu que seu nome não fosse divulgado. E foi assim que ela, que recebe um salário mínimo, assumiu uma dívida de outros dois empréstimos que sequer tinha autorizado. 

“Virou prática do mercado brasileiro os bancos fazerem empréstimo sem autorização”, afirma a presidente do Comitê Técnico do Instituto Defesa Coletiva, Lillian Salgado. “Então estamos pedindo penalidade, que está no artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor. Se um banco deposita um valor que o consumidor não pediu nem assinou, deve ser considerado amostra grátis. E temos varias decisões de ações coletivas que estão aplicando essa disposição legal”, explica Lillian. 

 

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