Eliane Ramos, diretora da PI Brasil, é a entrevistada da temporada Minas S/A Governança, disponível em todas as plataformas do O TEMPO.
Com mais de três décadas dedicadas à gestão estratégica de empresas e ao desenvolvimento organizacional, Eliane explica que PI vem das iniciais de “índice de previsibilidade” (em inglês).
O objetivo é prever como as pessoas vão se comportar no ambiente de trabalho.
“Vamos fazer uma radiografia das características comportamentais, chamadas de ‘soft skills’. Assim, identificaremos pontos fortes, melhores aptidões, DNA, e posicionaremos o profissional na função adequada dentro da equipe.”
Eliane diz que na PI serão identificadas as características comportamentais e a capacidade de aprendizagem desse profissional. “É uma ferramenta de gestão”, analisa a executiva da PI Brasil.
Como é o trabalho da PI Brasil?
Costumo falar que eu sou a geração Z da minha época. Dizem que a geração Z vai sempre empreender, e eu, com meus vinte e poucos anos, larguei um cargo tradicional e fui empreender numa empresa de tecnologia ligada à área de gestão de pessoas.
Como funciona esse trabalho na prática? E qual foi sua trajetória na PI Brasil, que dura mais de 30 anos?
Eu acredito muito na sorte, no destino. Porque eu conheci essa metodologia com Elmano Nigri, que é um grande mentor e líder. Ele trouxe isso para o Brasil, e eu o conheci como cliente. Eu fui me apaixonando pelo programa e, principalmente, pela liderança que ele exercia, pelo brilho nos olhos dele fazer. Ele viu que o grande desafio era cuidar das pessoas e encontrou a metodologia da PI. Ele trouxe a empresa PI, que é uma companhia norte-americana, para o Brasil. E eu me apaixonei por essa metodologia ligada à área de gestão de pessoas.
O que é a metodologia PI?
Ela vem das iniciais de “índice de previsibilidade” (em inglês). O objetivo é prever como as pessoas vão se comportar no trabalho. A gente vai fazer uma radiografia das características comportamentais que a gente pode chamar de soft skills. Então, vamos identificar quais são os pontos fortes, qual a melhor aptidão, qual é o DNA dele, o que esse profissional faz de melhor e, dentro disso, colocá-lo numa posição certa, dentro de um time certo. Vamos identificar as características comportamentais e a capacidade de aprendizagem desse profissional. É uma ferramenta de gestão.
Como é o treinamento?
Treinamos os principais líderes das organizações juntamente com o RH, que vai criar todo o projeto para que eles entendam melhor das pessoas. É o lado humano do gerenciamento. A gente tem as competências técnicas? Sim. O Fórum Econômico Mundial colocou que as competências técnicas têm peso menor do que as competências comportamentais, porque o técnico a gente aprende, mas mudar comportamento é mais difícil.
A gente quer que as pessoas caminhem do mesmo jeito?
É muito mais fácil a gente conviver com as pessoas que são mais parecidas. Agora é aquele diferente, aquele que vai trazer um ponto de vista diferente que vai trazer a complementaridade, que vai agregar valor.
Na metodologia PI você aplica um questionário na pessoa?
A inteligência emocional é muito importante. Tudo começa com o autoconhecimento. Quais são os meus pontos fortes?Quais são os meus pontos de atenção, o que faço melhor? Para eu fazer a minha autogestão. Como é que eu faço a gestão das minhas próprias características? Eu só faço a gestão das minhas próprias emoções se eu me conheço bem. Como é que eu faço a minha automotivação? Como é que eu me energizo? O que me motiva? Tem tudo a ver com autoconhecimento. O tempo inteiro estamos em contato com outras pessoas – veio a pandemia e mostrou que ninguém é feliz sozinho. Daí, o que é preciso fazer? Preciso ser uma pessoa mais empática: entender o que é meu e o que é do outro; entender o que me faz bem e o que faz bem ao outro. Para trabalhar uma comunicação mais assertiva, porque a comunicação não é o que você fala, a comunicação é como o outro entende. As formas de me comunicar com as pessoas são diferentes para que eu cuide melhor dos meus relacionamentos. A qualidade dos relacionamentos é o que impacta diretamente a qualidade dos resultados. Se eu tenho relacionamentos mais sadios, eu vou ter resultados mais fortes, eu vou ter uma produtividade melhor.
E as mulheres, você vê muita diferença nos resultados das mulheres para os homens?
O comportamento é indiferente – homens e mulheres. Mas a gente vê que as mulheres têm um lado diferente, que é o lado do cuidado, da atenção, do carisma. A mulher talvez tenha esse acolhimento maior. A mulher traz uma coisa interessante: quando chega na maturidade dos 50, 60 anos, ela é mais ela, com autoestima, ela já sabe o que quer e o que não quer. Eu paro de me preocupar com o que as pessoas acham que eu deveria ser, eu sou mais eu. E é isso que é a plenitude. Por isso, maturidade rima com felicidade.
Por que as mulheres demoram tanto para chegar ao cargo de CEO? Pode demorar umas três décadas para vermos maior quantidade de mulheres como CEOs?
Os dados mostram que sim. São degraus que a gente vai subindo na vida. Às vezes, tem um degrau lá em cima que pode estar meio bambo, meio torto. E a gente vai pensar o seguinte: como faço para subir mais um degrau? Aí a mulher pode ter uma dificuldade: ela pode ter virado mãe, pode ter escolhido outra coisa, ou abriu mão da carreira dela. Essa virada é muito difícil. E talvez o homem tenha mais essa oportunidade de continuar subindo e não ter aberto mão de algumas coisas. Mas, se ela abriu mão, ela tem que estar consciente disso. Uma coisa a gente sabe: as mulheres investem muito mais no conhecimento, elas estudam muito mais.
Tem que gostar muito da própria companhia também. Eu tenho visto as pessoas se refugiando no celular, sem cuidar do lado espiritual. Isso é muito desafiador, não é?
É muito desafiador fazer as suas pausas. É muito importante ter o lado B. O que um CEO faz para trazer energia para esse lado do trabalho? É gostar de arte, é gostar de cantar, tocar um instrumento musical, viajar, fazer uma caminhada. Essas pausas são extremamente importantes para que eu tenha um potencial melhor para fazer a minha entrega no dia a dia.
Como essa geração com vinte e poucos anos vai chegar aos cargos de liderança? Eu vejo que muitos deles não têm apego de construir histórias longas dentro das empresas. E, para se tornar um CEO, são longas e duras jornadas. O que você tem feito para trabalhar melhor essa nova geração?
A gente entende algumas características dessa geração que são diferentes. Ele não quer chegar a líder não é por preguiça. Talvez a gente tenha que mudar esse novo papel da liderança dentro das organizações. E vem esse desafio do RH, esse desafio da cultura da empresa. Talvez esse jovem não queira chegar a líder porque ele não quer chegar àquele líder de comando e controle, àquele líder que tem que mandar e obedecer. Isso não faz sentido para ele. É um novo papel da liderança que as empresas precisam se inteirar para que esses jovens queiram estar ali. Os jovens querem estar numa marca empregadora forte. Uma marca em que não é só na parede que as coisas estão ali; se ele não sentir isso, ele não vai ficar na empresa. O desafio é mudar esse novo papel da liderança para que os jovens queiram. Fazer uma liderança mais humana. Eles são nosso futuro.
Sobre a importância do líder, por exemplo, o Gustavo Werneck, CEO da Gerdau, diz que tem que contratar gente melhor do que ele para dar resultado na empresa, que é preciso descentralizar, são vários líderes que falam isso, de não ter medo da concorrência. Só assim a empresa leva adiante a cultura dela, não é?
Isso. Olha um exemplo que você traz como o CEO da Gerdau, Gustavo Werneck. Um líder traz com ele outros grandes líderes. Ele está ali para estimular as pessoas para que sejam melhores. Se ele não tiver um time, como as coisas vão acontecer? Ele traz um ponto muito interessante, que ele foi para o Butão estudar sobre felicidade. Um líder falar sobre felicidade no trabalho...
É uma coisa que há bem pouco tempo não se falava sobre isso no mercado de trabalho.
A felicidade tem tudo a ver com esse bem-estar, como as pessoas se sentem na organização, e tem tudo a ver com um ambiente mais seguro. Numa palestra que eu participei onde a gente fez um painel juntos, o Gustavo (Werneck) contou um caso muito interessante. Um funcionário se aproximou dele e falou que, o que ele precisasse, ele estaria lá: “Você não sabe a admiração e a gratidão que eu tenho pela Gerdau”. E o Gustavo perguntou o que aconteceu. Ele disse que a filha estava muito deprimida, com um sofrimento muito grande e que estava com muito medo de perdê-la. E a empresa cuidou, porque a filha foi à psicóloga dentro de um programa de cuidado da família, dos funcionários, ela se cuidou e hoje está muito bem, está estudando e vai se formar. Por isso, o pai tinha muita gratidão pela companhia, por isso ele é tão grato à empresa.
Empresa não é só resultado, ela tem que ter um time sadio, não é?
Se as pessoas não estiverem sadias, não somente na saúde física, mas essa saúde emocional está cada vez mais pesando... Em 2024, foi o ano que houve mais afastamento por problema de saúde mental. As pessoas têm muita dificuldade de falar de um sofrimento. O problema de uma depressão e um burnout em que a pessoa não consegue produzir, às vezes ela não tem condições de levantar da cama.
Qual é o desafio de fazer parte de uma diretoria da ACMinas (Associação Comercial e Empresarial de Minas Gerais), que tem Cledorvino Belini (ex-presidente da Fiat Chrysler na América do Sul) como líder?
Trabalhar com o Belini é ter a demonstração de uma governança clara, com transparência na sua gestão, atitude, ele é um grande empresário, é uma grande inspiração. Na ACMinas, é um trabalho voluntário num convite irrecusável. Estamos trabalhando muito a questão do ESG (melhores práticas ambientais, sociais e de governança de uma instituição). Tem ainda um projeto social que a gente está desenhando, mas é o cuidado com o jovem aprendiz, trabalhar o processo da saúde mental, que é um trabalho social também. A ACMinas tem diversos conselhos, como o jurídico e de RH. Eu fui a fundadora do Conselho de RH da ACMinas.