As brigas, por motivos diversos, matam mais que o tráfico de drogas em Minas Gerais. É o que aponta o relatório de Mortes Violentas Intencionais (MCI), elaborado pela Polícia Civil do estado. O estudo apontou que as mortes decorrentes de brigas e atritos correspondem a 15,42% dos 2912 registrados em Minas. O índice é superior aos relacionados aos casos de envolvimento com drogas, com 13,70%. O estudo considerou os crimes de homicídio ocorridos em de 2022. 

“Os números desmitificam uma sensação que a sociedade tem de que todo crime de homicídio está relacionado ao tráfico de drogas. As pessoas quando encontram um corpo baleado logo associam ao tráfico, o que não é uma verdade. Existem outras causas e até mais recorrentes”, revela a pesquisadora Ludmila Ribeiro, do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), da Universidade Federal de Minas Gerais.

Para a estudiosa, o comportamento intolerante de parte da sociedade somado ao acesso as armas de fogo, principalmente, ajudam a justificar os dados. “Quando se começa investigar, a gente começa a entender que essas mortes são consequências de conflitos entre pessoas que possuem algum tipo de relação. Algo que se torna mais comum com o acesso as armas. Uma situação de ciúmes, disputa de vizinhança ou até mesmo instabilidade emocional que pode motivar esse tipo de delito”, avalia. 

O levantamento indicou ainda que 62,74% dos casos são decorrentes de outros motivos e que 8,14% ocorreram por vingança. O relatório considera como mortes violentas intencionais os casos “cujos efeitos propagadores vão além da perda original da vida humana”. A Polícia Civil de Minas Gerais entende que esses delitos prejudicam também a família e a comunidade que reside nas proximidades do local onde o crime ocorreu, sendo essas pessoas classificadas como “vítimas secundárias”. 

“Tal característica tem potencial para criar um ambiente violento que tem impacto negativo na sociedade, na economia e nas instituições governamentais”, argumenta a instituição. A Polícia considerou, a partir do estudo, que as mortes violentas intencionais podem afetar pessoas com perfis diversos, independentemente da idade, sexo, etnia e nível socioeconômico. “O estudo das MVI é relevante não só pela gravidade do crime, mas, também, porque são um dos indicadores mais mensuráveis e comparáveis para monitoramento do Estado”, acrescentou. 

Para a pesquisadora do Crisp, o relatório desenvolvido pela Polícia Civil de Minas Gerais é uma importante ferramenta para o desenvolvimento de políticas públicas e aperfeiçoamento da atuação das instituições de segurança no estado. “Isso revela uma polícia que está se abrindo ao controle social e que está se preparando para receber demandas que venham dessa divulgação. O único ponto ruim é que isso esteja acontecendo por agora. Além do estado, esse estudo vai permitir a academia se aproximar da instituição para aperfeiçoar as práticas”, considera. 

Veja o ranking com as principais causas dos crimes de homicídio em Minas Gerais

  1. Motivos diversos - 62,74% 
  2. Brigas e atritos - 15,42%
  3. Envolvimento com o tráfico de drogas - 13,70%
  4. Vingança - 8,14%

Quando os crimes de homicídio ocorrem em Minas? 

Os crimes de homicídio em Minas Gerais ocorrem principalmente nos períodos da noite e da madrugada. Conforme o estudo, 41,09% foram registrados durante a noite e 21,57% na madrugada. O levantamento também apontou que 20,14% dos casos foram a tarde e 17,20% pela manhã. 

Qual o dia da semana com mais homicídios em Minas Gerais? 

De acordo com o relatório, o sábado é o dia da semana com maior incidência dos crimes de homicídio, com 295 dos 1.465 registrados. A quantidade representa 20,14% do total. Domingo é o segundo dia com mais casos, com 286, o que corresponde a 19,52%. 

O ranking segue com a sexta-feira (200 – 13,65%), segunda-feira (177 – 12,08%), terça-feira (12,01%) e quinta-feira (166 – 11,33%). A quarta-feira é o dia da semana com o menor número de casos, com 165, o que corresponde a 11,26% do total.  

Quais os locais onde os crimes de homicídio são mais recorrentes em Minas Gerais? 

Os crimes de homicídio ocorrem principalmente em vias de acesso pública. De acordo com o estudo, 59,03% foram registrados nestes locais. Os crimes ocorridos em casa aparecem em segundo lugar, com 20,84%. 

O levantamento apontou que bares, lanchonetes, restaurantes e espaços similares estão em quatro lugar, com 6,11%. A terceira opção está ocupada por outros lugares, com 14,01% dos casos. 

Quais as principais armas utilizadas nos crimes de homicídio? 

Do total de 2912 crimes de homicídio registrados em Minas Gerais, 63,50% ocorreram com armas de fogo. O uso de armas brancas foi a segunda maior causa das mortes, com 23,08%. Os crimes sem informações quanto ao uso de armas ocupam a terceira colocação, com 10,95% dos casos. Em quarto lugar estão aqueles que foram decorrentes de agressão física, sem emprego de instrumentos, com 2,44%. 

Quais as principais vítimas dos crimes de homicídio em Minas Gerais? 

As principais vítimas dos crimes de homicídio em Minas Gerais são pardas (1440 casos). Em segundo lugar estão as pessoas que se autodeclaravam negras (580), seguidas por aquelas que se reconheciam como brancas (483). O ranking completa com os casos em que se não foram registradas informações sobre cor/raça (399), pessoas albinas (6) e amarelas (4). 

O levantamento também revelou que as principais vítimas no estado são homens. São 2568 casos, o que representa 88,19% do total. No estado, 318 mulheres foram vítimas deste tipo de delito. A quantidade representa 10,92%. Outros 13 crimes não possuem informações sobre o gênero das vítimas e outros 13 com pessoas LGBTQIA+.

O gráfico que aponta perfil das vítimas de homicídios em Minas, com recorte feito pelo sexo, considera a população LGBTQIA+ como “um terceiro grupo”, distinto ao de homens e mulheres. Questionada pela reportagem de O TEMPO sobre essa classificação, a Polícia Civil de Minas Gerais afirmou que essa decisão se baseia em princípios metodológicos, éticos e legais, e é respaldada por várias razões fundamentais. A nota pode ser lida na íntegra ao término da reportagem.

Qual a faixa etária das vítimas dos crimes de homicídio em Minas Gerais? 

As principais vítimas pessoas com idades entre 31 e 40 anos. Foram 693 casos, ou seja, 23,80% dos 2912 registrados em todo o estado. A população com idade entre 18 a 24 anos é a segunda faixa etária com o maior número de casos, sendo catalogados 688, o que corresponde a 23,63%.   

Veja o ranking:   

  1. 31 a 40 anos – 688 (23,80%) 
  2. 18 a 24 anos – 343 (23,63%) 
  3. 25 a 30 anos – 640 (21,98%) 
  4. 41 a 50 anos – 405 (13,91%) 
  5. 51 a 60 anos – 194 (6,66%) 
  6. 12 a 17 anos – 130 (4,46%) 
  7. Acima de 60 anos – 120 (4,12%) 
  8. 0 a 11 anos – 36 (1,24%) 
  9. Sem informações - 6 (0,21%)

A nota da Polícia Civil de Minas Gerais

"A inclusão da categoria LGBTQIA+ no Relatório Estatístico sobre mortes violentas intencionais é uma abordagem justificável e que busca fornecer uma análise mais abrangente e precisa dos dados. Essa decisão se baseia em princípios metodológicos, éticos e legais, e é respaldada por várias razões fundamentais. 

Primeiramente, é sabido que há diferenciação entre sexo, orientação sexual e identidade de gênero. O gênero e a orientação sexual são conceitos distintos. Reconhecer essa diferença é fundamental para evitar a simplificação dos dados e fornecer informações mais precisas sobre a diversidade da população afetada. A inclusão da categoria LGBTQIA+ reflete o compromisso com a igualdade e a não discriminação. A PCMG reconhece que as pessoas LGBTQIA+ têm enfrentado desafios específicos e violência motivada por preconceito e discriminação, o que pode ser capturado mais efetivamente por essa categorização em relatórios estatísticos.

Em muitos países, inclusive o Brasil, há leis e normas de direitos humanos que protegem a comunidade LGBTQIA+ contra a discriminação e a violência. Essas leis reconhecem que as pessoas LGBTQIA+ têm necessidades e desafios únicos que requerem monitoramento e intervenção adequados. Nesse cenário, a inclusão da categoria LGBTQIA+ é especialmente relevante quando se considera a complexidade da identidade de gênero. A sigla engloba identidades que não se encaixam estritamente nas categorias de “feminino” ou “masculino”. Portanto, essa inclusão permite uma análise mais sensível às nuances de identidade de gênero das pessoas. 

Sobre a não presunção de causalidade, a legenda do gráfico já informa que a inclusão do grupo LGBTQIA+ não sugere causalidade entre a orientação sexual ou identidade de gênero e as mortes violentas. Essa é uma abordagem transparente e ética, evitando generalizações inadequadas e garantindo que as informações sejam interpretadas corretamente. 

Em relação à questão de não ter sido registrada nenhuma morte violenta intencional entre pessoas do grupo LGBTQIA+, isso pode ocorrer devido a diversos fatores, incluindo subnotificação, falta de registro adequado nos campos próprios dos boletins de ocorrência ou classificações inconsistentes nos registros oficiais. Portanto, a inclusão da categoria LGBTQIA+ pode, de fato, revelar a necessidade de melhorar a coleta de dados, a conscientização e a investigação de crimes relacionados à comunidade LGBTQIA+. 

Em resumo, a inclusão da categoria LGBTQIA+ em relatórios estatísticos sobre mortes violentas intencionais é uma prática justificável e necessária para promover a igualdade, a não discriminação e uma análise mais precisa da violência que afeta essa comunidade. Ela também destaca a importância de coletar dados com sensibilidade às nuances da identidade de gênero e orientação sexual, sem fazer presunções de causalidade."