Os trabalhos de investigação da Polícia Civil estão sendo prejudicados, em Minas Gerais, por causa das más condições de trabalho e da escassez de concursos públicos para a área. As novas contratações não ocorrem, conforme denúncia, porque esse tipo de profissional custa "caro". Para compensar, o Estado tem empregado servidores administrativos — que não tem preparação para auxiliar necropsias. A denúncia ocorre em meio à polêmica envolvendo o suposto assédio à escrivã da Polícia Civil que alerta para problemas de saúde mental dos profissionais da instituição. Conforme a fonte, alguns servidores administrativos estão, inclusive, com a vida em risco, já que precisam manusear armas sem qualquer tipo de treinamento. O déficit de peritos no Estado é de 35%, conforme o  delegado-geral de polícia Antônio Carlos de Alvarenga. 

Uma perita, que terá o nome preservado, informou que a situação se agravou após a extinção do cargo de auxiliar de necropsia. “Quando isso aconteceu, alguns profissionais se tornaram investigadores, alguns largaram a função, outros optaram por permanecer, enquanto outros se aposentaram”, disse. A queda do número de  investigadores aliada  ao crescimento da violência em Minas Gerais, ainda conforme os trabalhadores, fez com que a situação ficasse "insustentável ". "Criou-se o cargo de técnico assistente para trabalhar no Instituto Médico-Legal (IML), mas, por serem profissionais administrativos, eles não recebem os 40% por risco de contágio — valor pago aos peritos e aos médicos-legistas", explica.

No ano passado, segundo a servidora, foi criado o cargo de auxiliar de perícia, no entanto, a função permanece no escopo do cargo de técnico assistente, ou seja, sem o aumento de salário relacionado ao risco de contágio. “Essas pessoas recebem pior que o técnico assistente, trabalham 40 horas semanais, fazem necropsia e estão indo para locais de ocorrência com os peritos criminais, sem falar que trabalham no IML recebendo materiais. Nenhum administrativo poderia exercer essa função, já que exige o manuseio de arma de fogo. Sem a expertise, uma vez que não são policiais, como vão saber, por exemplo, se a arma está municiada? Até com a gente, que somos peritos, acontecem disparos acidentais. A vida dos servidores está em risco", justifica. 

Sem novos peritos

Ainda sobre as condições de trabalho desses profissionais, a perita afirma que falta empatia das lideranças ao serem cobradas por melhorias. A esperança de que novos trabalhadores fossem adicionados ao quadro de servidores foi frustrada em reunião realizada no começo entre lideranças do Instituto de Criminalística (IC) e delegados.

“Na reunião os delegados foram comunicados que novos peritos não serão chamados e que nem acontecerá concurso público, pois viram que ter o auxiliar é melhor e mais vantajoso, pois ganham pouco e fazem tudo que mandam sem reclamar. Isso é a completa desvalorização da nossa profissão. Temos déficit de profissionais. Eu já trabalhei no interior de Minas Gerais e atendi 23 municípios. Rodava sozinha num carro caindo aos pedaços”, desabafa.

O delegado-geral de polícia Antônio Carlos de Alvarenga estava no encontro e confirmou que não haverá concursos. “Ao tratar de vigilância e segurança se chegou ao assunto de que o quadro de pessoal está pequeno. Não dá mais pra desviar servidores para fazer outra função. Os peritos são requisitados por nós delegados para cumprir papel em locais de crimes e perícia, sejam em vivos ou mortos. O déficit está em torno de 35%”.

Alvarenga analisa que a alternativa utilizada atualmente precisa passar por uma crítica. Ele defende, inclusive, a realização de concurso público. “Eu penso que temos que lutar por uma lei que promova o concurso público anualmente. Temos que nos engajar nesta luta. Mas já que isso nós não temos, precisamos buscar alternativas que não sejam essa [de contratar funcionários administrativos]”.

Uma das opções elencadas pelo delegado são convênios. “Já que o Estado vai gastar com auxiliar de perícia, crie estágios e convênios. É mais produtivo e não corta a possibilidade de sempre buscarmos provimentos dos cargos, seja de perito ou auxiliar de medicina-legal”, disse.

O que diz a polícia

Procurada por O TEMPO, a Polícia Civil informou que o quadro de servidores está sendo reforçado continuamente. "Atualmente, está acontecendo a formação de servidores aprovados e nomeados nos concursos em vigor para as carreiras policiais e administrativas. Peritos criminais, conforme ordem de classificação prevista nos respectivos editais, publicados em outubro de 2021 (carreiras policiais), estão na Academia de Polícia fazendo o curso de formação e se preparando para reforçar a força de trabalho da PCMG", disse em trecho do comunicado. 

Os novos servidores incrementam os quadros da Polícia Civil e reforçam a segurança pública em Minas Gerais nos trabalhos de polícia judiciária e prestação de serviços. A nomeação ocorreu em 27 de abril deste ano, com posse no dia 25 de maio.

A corporação ressaltou que teve um acréscimo de 1.594 servidores para o fortalecimento dos recursos humanos na instituição, entre 2019 e 2022. "As nomeações recentes, conforme o Governo do Estado, foram autorizadas devido à vacância de cargos das carreiras policiais e administrativas da Polícia Civil ocorrida nos últimos anos, em virtude de aposentadorias, falecimentos e exonerações". A nota pode ser lida na íntegra abaixo.

Nota da Polícia Civil

"Na atual gestão do Governo de Minas o quadro de servidores da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) está sendo reforçado continuamente. Atualmente, está acontecendo a formação de servidores aprovados e nomeados nos concursos em vigor para as carreiras policiais e administrativas. Peritos criminais, conforme ordem de classificação prevista nos respectivos editais, publicados em outubro de 2021 (carreiras policiais), estão na Academia de Polícia fazendo o curso de formação e se preparando para reforçar a força de trabalho da PCMG.

Os novos servidores incrementam os quadros da Polícia Civil e reforçam a segurança pública em Minas Gerais nos trabalhos de polícia judiciária e prestação de serviços. A nomeação ocorreu em 27 de abril deste ano, com posse no dia 25 de maio.

Para o fortalecimento dos recursos humanos na instituição, entre 2019 e 2022, a PCMG teve um acréscimo de 1.594 servidores. As nomeações recentes, conforme o Governo do Estado, foram autorizadas devido à vacância de cargos das carreiras policiais e administrativas da Polícia Civil ocorrida nos últimos anos, em virtude de aposentadorias, falecimentos e exonerações.

A medida ainda está em consonância com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que possibilita a reposição de força de trabalho em áreas essenciais, como a segurança pública, a partir da nomeação de excedentes em concursos públicos, desde que haja vacância de cargos".