CIDADES

Desculpe-me, sou professora

Formação da cidadania e sonhos

Por Jacqueline Caixeta
Publicado em 15 de outubro de 2019 | 03:00
 
 

Se você está insatisfeito com meu jeito de cobrar de seu filho que demonstre habilidades desenvolvidas em aula, desculpe-me, mas sou professora!

Se está indignado porque falei na aula sobre exclusão, miséria, hipocrisia de um sistema falido, entre tantos outros, desculpe-me, mas sou professora!

Se você acha que fui exagerada quando pedi que seu filho guardasse o celular e prestasse atenção ao que eu dizia, desculpe-me, mas sou professora!

Se você pensa que vou deixá-lo jogar lixo no chão só porque na escola há faxineiros, desculpe-me, mas sou professora!

Se você acredita que posso “dar” pontinhos para seu filho alcançar a média e ser aprovado só porque paga mensalidade, desculpe-me, mas sou professora!

Se você idealiza uma aula cega às injustiças, desculpe-me, mas sou professora.

Se sonha que eu vá deixar seu filho agredir o colega, porque você acha certo revidar, desculpe-me, mas sou professora!

Se você não quer que seu filho saiba das desigualdades do mundo, desculpe-me, mas sou professora!

Se pensa que devo deixar seu filho dormir só porque ficou na internet a noite toda, desculpe-me, mas sou professora!

Sou professora e me nego a ser o que você quer que eu seja apenas para garantir a “felicidade” de seu filho. Isso pode parecer duro, mas isso é educação.

Sou professora e acredito fielmente no meu dever com os alunos, na responsabilidade com a formação de seres em construção. Não pretendo doutrinar ninguém, mesmo que muitos pensem isso, não tenho pretensões, tenho sonhos!

Tenho lindos e românticos sonhos de transformar o mundo em um lugar melhor de se viver para mim e para todos.

Ao não deixar seu filho colar em uma prova, fazer com que demonstre conhecimento depois das duras aulas que fiquei preparando noites acordadas, sonho que ele se transforme em alguém que saiba usar seu conhecimento de maneira autônoma e competente, que tenha melhores oportunidades num tal de mercado de trabalho que estará esperando por ele, que seja honesto consigo e com os outros.

Quando falo de miséria, injustiças, desigualdades sociais, exclusões e tantos outros, estou sonhando que seu filho seja forte o suficiente para lutar por um mundo melhor, saiba partilhar, amar e respeitar o semelhante. Que se transforme em um cidadão digno, capaz de estender as mãos para acolher e se solidarizar com as dores que não são suas. Que aprenda a olhar além do próprio umbigo e encontrar significado para a vida.

Quando acordo e vou à escola, vou cheia de sonhos que não são só meus, são os do seu filho também. Desculpe-me, mas sou professora e sou feita de sonhos.