SRAG

Mortes por síndrome respiratória grave aumentam seis vezes em Minas

Problemas respiratórios não são associados apenas ao coronavírus, mas maior parte dos óbitos causada por eles não tem causa definida

Por Gabriel Rodrigues
Publicado em 19 de maio de 2020 | 18:25
 
 
Teste é o de RT-PCR, o mais indicado para o diagnóstico da doença. Foto: AFP

O número de mortes por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) aumentou pouco mais de seis vezes em Minas Gerais até meados de maio de 2020, em relação ao mesmo período de 2019. Dados da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) revelam que, neste ano, houve 1.086 mortes por SRAG em Minas — o número pode ser ainda maior, pois a tabela de dados do último boletim vai até a segunda semana de maio. Em 2019, segundo dados fornecidos pela SES-MG, haviam sido 170 óbitos.

O percentual de pacientes com SRAG que morreram foi similar nos dois períodos, girando em torno de 12%. Mas o número de notificações da síndrome disparou em 2020: o boletim mais recente da SES-MG indica 8.787 registros de SRAG, contra 1.344 em 2019 — ou seja, um aumento de cerca de 6,5 vezes.

A Síndrome Respiratória Aguda Grave pode ser provocada por contaminação pelo novo coronavírus, mas isso não quer dizer que todos os casos devam-se a ele. Isso porque a SRAG também pode ser consequência do vírus da influenza e até de problemas crônicos, como bronquite.

Em Minas, a causa exata de pelo menos 7.892 das ocorrências de SRAG não é especificada, o que representa desconhecimento de cerca de 90% do motivo da síndrome, seja porque os exames clínicos e laboratoriais não permitiram mostrar a causa, seja porque eles ainda estão sendo executados. Outra possibilidade levantada pela SES-MG é que parte dessas ocorrências deve-se a fatores não infecciosos — aí, entram asma e câncer, por exemplo —, mas o boletim não especifica quantos se enquadram nessa categoria.  

A Covid-19 é apontada como causa de 148 óbitos por SRAG, enquanto diferentes tipos de Influenza causaram mais 13. Mais 51 mortes constam como sendo investigadas. Atualmente, o Estado contabiliza 167 óbitos por Covid-19 e, segundo a SES-MG, nem todos são notificados como SRAG antes. A pasta também explica que todos os casos graves de SRAG devem ser testados para Covid-19.

Em coletiva de imprensa nessa segunda-feira (18), o secretário de Saúde, Carlos Eduardo Amaral, afirmou que a secretaria vem acompanhando os indicadores de SRAG e buscado compreender padrões da síndrome em meio à pandemia. "Esse dado tem que ser tratado item a item, com bastante calma, para que não caiamos nem em excesso de interpretação, que saia da realidade, nem em interpretação muito conservadora, em que possamos perder notificação de casos de Covid-19", observou.

Minas Gerais é o terceiro Estado do país com mais hospitalizações por SRAG, atrás de São Paulo e do Rio de Janeiro, segundo dados do Ministério da Saúde — que avaliam um período mais curto que a SES-MG, até o começo de maio. Ao mesmo tempo, de acordo com o ministério, Minas é o segundo Estado com menor taxa de mortes notificadas como Covid-19.  

Sensibilização de médicos e falhas em testes são hipóteses para aumento de mortes registradas

Os pacientes hospitalizados com SRAG são um dos casos em que médicos podem prescrever exame de detecção da Covid-19. Por isso, o infectologista Estevão Urbano, presidente da Sociedade Mineira de Infectologia (SMI) e membro do comitê de enfrentamento ao coronavírus em Belo Horizonte, diz que a alta nas mortes por SRAG, muitas sem explicação exata, não devem-se necessariamente à falta de testes, mas à imprecisão deles.  

“A subnotificação não é por falta de exames, nos casos graves. É porque não é fácil fazer diagnóstico 100% preciso para a Covid-19. Na primeira fase da doença, até sete dias, o exame ideal é o PCR. Na segunda fase, é a sorologia. Os exames são feitos, mas a identificação (dos vírus) em laboratório pode ser um pouco falha, seja porque se pediu o exame certo na hora errada, seja porque o laboratório não fez a técnica ideal, seja porque os próprios exames oferecidos têm uma sensibilidade abaixo do ideal”, comenta o infectologista, completando que a tecnologia de identificação da Covid-19 é novidade no mundo inteiro.

O secretário de Estado de Saúde, Carlos Eduardo Amaral, já pontuou em entrevistas que mesmo os exames de PCR, mais elaborados, têm chance de 30% de erro e podem gerar, principalmente, resultados falso negativos. Para contornar esse fenômeno, Urbano recomenda insistência no diagnóstico: “Temos que ir às últimas consequências para tentar fazer o diagnóstico da causa de SRAG. É preciso que isso seja uma obsessão. Fiz o teste de um paciente e o resultado deu negativo, mas o quadro clínico era muito parecido com Covid-19 e fizemos questão de retestar com outras técnicas, então o resultado veio positivo”.  

Outra possibilidade para explicar o aumento de registros de morte por SRAG levantada pelo infectologista é a sensibilização de médicos sobre o diagnóstico neste momento de pandemia, o que é corroborado pela SES-MG. “Nossa cabeça está sendo martelada diariamente por alguns nomes, como Covid-19 e SRAG. Isso tem impacto na hora de fazer os atestados de óbito”, diz. Ele próprio trabalha em hospital e conta perceber médicos propensos a identificar casos que apontam para SRAG. 

O infectologista Carlos Starling, também do comitê de enfrentamento ao coronavírus em BH, concorda. Por observações próprias, como médico, ele estima que entre 30% e 40% dos casos de SRAG possam ser Covid-19, mas lembra que o número não está cravado em pesquisas.

Os médicos cobram mais precisão nos dados sobre SRAG. “Quando você infere que pode haver subnotificação de Covid-19, mas não tem certeza, não age e não intervém com segurança. Sempre que os dados geram dúvida, as intervenções vão ter um nível de incerteza”, avalia Urbano.