Em apenas nove dias, uma família de Santo Antônio do Monte, na região Centro-Oeste de Minas, teve que enfrentar a perda de uma jovem de 18 anos, que morreu em um acidente de carro, e ver o corpo da universitária ser sepultado três vezes.

A polêmica começou depois que os familiares, após o primeiro enterro no cemitério da cidade, resolverem sepultar a adolescente no quintal de casa: eles conseguiram autorização para isso. No entanto, na última terça-feira (20), uma juíza determinou que o corpo voltasse para o cemitério.

Bianca Rodrigues Silva morreu no último dia 11 (domingo), Dia das Mães, a 500 metros de casa. O corpo foi sepultado no mesmo dia, após o avô oferecer uma sepultura da família no Cemitério Santo Antônio do Monte. “Não estava com cabeça para resolver nada. Meu pai e sobrinhos que resolveram tudo. Porém, na terça-feira (13), a minha outra filha lembrou que Bianca sempre dizia que não queria sair de perto da família. Ela perguntou se teria como construir um túmulo aqui em casa para Bianca”, contou o pai da jovem, o engenheiro civil Daniel Rodrigues da Silva, de 41 anos.

Aceitando a ideia da filha do meio, o engenheiro procurou a delegacia da cidade e a prefeitura. Ele explicou a situação e conseguiu uma autorização do delegado e do secretário de Administração da Prefeitura para o translado e a sepultamento do corpo. No dia 15, já com todos os papéis em mãos, o pai solicitou que a funerária fizesse o transporte do caixão do cemitério para a sua casa.

“Fiz tudo certo. Meu lote é grande e pedi que meu amigo fizesse um estudo da terra e conseguimos um laudo de impermeabilidade do solo. Depois que o corpo veio para minha residência, minha família se sentiu melhor. Eu tenho condições financeiras de manter a Bianca aqui”, disse Silva.

O secretário de Administração Pública do município, Antenógenes Antônio da Silva Júnior, afirmou que autorizou o translado após a decisão da Polícia Civil. “O delegado autorizou e, no meu entendimento, não havia empecilho nenhum. Apesar de não ter procurado a Vigilância Sanitária, o pai obedeceu ao que era solicitado para a construção do túmulo e apresentou um laudo técnico”, explicou o secretário.

Porém, o transtorno começou depois que a juíza Lorena Teixeira Vaz Dias expediu um mandado de busca e apreensão e ordenou que um oficial de Justiça fosse até a casa da família buscar o caixão outra vez. “O oficial chegou com reforço policial até de Bom Despacho. Não tinha necessidade de fazer isso tudo. Minha mulher estava sozinha em casa”, desabafou o pai.

Com a ordem judicial, o caixão de Bianca voltou para o cemitério. De acordo com o advogado da família, Bruno César de Melo, a juíza alegou que o sepultamento em casa poderia causar risco à saúde pública, além de abrir precedentes para outros casos. “Não existe uma lei especifica para sepultamento em casa. Cada município pode legislar da maneira que achar melhor”, explicou o advogado.

Ainda segundo o defensor, após o sepultamento em casa, ele entrou com um pedido de autorização judicial para que o corpo pudesse ficar no imóvel, mas, novamente, a juíza não autorizou. Uma outra possibilidade seria a cremação de Bianca. “Vou conversar com o meu cliente na próxima segunda-feira (26). A família vai decidir se entra com um recurso ou se aceita a cremação”, disse Bruno.

Enquanto isso, os pais e dois irmãos da jovem sofrem com a situação. “Minha filha está parecendo um sofá, que eles jogam de um lado para o outro na sala. Ainda não decidimos o que vamos fazer”, declarou o pai.

 A assessoria de imprensa da Polícia Civil informou que o delegado responsável por autorizar o translado, Lucélio Silva, não vai comentar o caso.

Acidente
No dia 11 de maio, Bianca e o namorado de 20 anos voltavam de uma festa quando o jovem colidiu o carro contra um poste do bairro Flávio de Oliveira. Os dois morreram na hora, presos às ferragens. Bianca, que estava no 1º período de engenharia civil, completaria 19 anos no dia 3 de junho.

Juíza diz que jazigo é risco para saúde

A decisão da juíza Lorena Teixeira Vaz Dias foi baseada no Código Sanitário Municipal, especificamente na Lei Complementar (LC) 30, de 2002, que determina que cemitérios só podem ser construídos mediante autorização do poder público local. Segundo a magistrada, seu despacho também levou em conta a preservação da saúde pública na cidade.

“Os requerentes alteraram sobremaneira a ordem com que deveriam agir, pois exumaram o cadáver sem ordem judicial, construíram jazigo e promoveram o sepultamento dos restos mortais sem observância dos requisitos mínimos para tanto, fazendo juntar aos autos posteriores manifestações de profissionais, nitidamente ligados à situação embaraçosa já criada pelos requerentes”, frisou ela em sua sentença.

Além disso, a juíza destacou em sua decisão que o sepultamento fora do cemitério acarretaria “risco de proliferação de mosquitos, como o aedes aegypti, transmissor da dengue e da febre tifoide”.

Atualizada às 11h57