O prefeito de Belo Horizonte, Fuad Noman (PSD), anunciou em um rede social nesta terça-feira (6) que a prefeitura deverá acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) para que a Justiça libere a reunião do Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep) que vai decidir sobre o processo de tombamento provisório da Serra do Curral. A audiência, que deveria acontecer em julho, foi suspensa a pedido da Taquaril Mineração S/A (Tamisa), que ainda tem interesse em explorar a área após receber autorização do governo estadual.

Na publicação, o prefeito Fuad diz que o pedido é para que a reunião deixe de ser adiada e que o tombamento da Serra do Curral não seja discutido somente em 2023, como foi proposto em um cronograma apresentado à PBH após uma reunião de conciliação na Justiça realizada na última sexta-feira (2). “O tombamento provisório está pronto para ser aprovado há 2 meses, mas a reunião do Conselho Estadual do Patrimônio Cultural foi suspensa por uma decisão judicial. A PBH vai ao STF pedir a liberação para que a reunião aconteça já”, alega o prefeito, que tinha até hoje para se manifestar sobre o cronograma proposto diante da Justiça.

 

A prefeitura de Belo Horizonte vai entrar com ação no STF em defesa da Serra do Curral. Não concordamos em deixar para o ano que vem seu tombamento, conforme proposta feita durante tentativa de conciliação no TJMG. Não podemos admitir que absurdos como este continuem acontecendo. pic.twitter.com/1VibivGBLS

— Fuad Noman (@fuadnoman) September 6, 2022

 

A reunião que discutiria o tombamento deveria acontecer no dia 27 de julho, mas foi suspensa temporariamente após o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) acatar um pedido feito pela Tamisa. Na ocasião, o presidente do TJMG, desembargador José Arthur de Carvalho Pereira Filho, acatou "parcialmente e de forma provisória" o pedido da mineradora.

"A decisão do presidente do TJMG vale até que sejam finalizadas as tratativas para realização, o mais breve possível, de audiências de conciliação e mediação entre as partes, no âmbito do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania de 2º grau (Cejusc)", completou o tribunal. 

Conciliação esvaziada

Nas audiências de concialição mediadas pela Justiça Mineira, o entendimento está longe de ser alcançado. Na última reunião sobre o assunto, realizada na sexta-feira, a prefeitura preferiu se ausentar da discussão alegando que o cronograma estabelecido no encontro, que defina um tombamento somente em 2023, não é razoável.

“Saímos da conciliação porque o adiamento dos efeitos do tombamento provisório não impede as atividades minerárias e imobiliárias na Serra do Curral e a PBH insiste na sua total proteção até que seja definido o perímetro do tombamento definitivo”, disse Fuad.

Em uma manifestação sobre esse processo, a Procuradoria-Geral do Município alegou que a demora em se aprovar o tombamento tem causado prejuízos à população de Belo Horizonte e a própria Serra do Curral. 

"Se iniciado o tombamento provisório (o que provavelmente teria acontecido
não fossem as decisões judiciais), de nenhuma relevância jurídica seriam as licenças ou termos de ajustamento de conduta que permitissem a mineração na Serra do Curral", diz um trecho da manifestação da procuradoria.

A pressa da prefeitura em impedir a mineração na Serra do Curral tem como exemplo o empreendimento da mineradora Gute Sicht, que segundo a PBH, é ilegal. Em uma série de fotos anexadas no documento enviada ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a prefeitura mostra preocupação com a área que já foi devastadas em um período de um ano pela empresa, que opera graças a um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) que ainda é discutido na Justiça.

Governo em espera

Procurado para comentar o posicionamento da prefeitura de Belo Horizonte, o governo de Minas Gerais emitiu um nota alegando que não se maniestaria sobre decisões judicias. No entanto, na mesma resposta, o governo fez questão de ressaltar a importância das audiências de conciliação, da qual a prefeitura de BH preferiu se ausentar. 

Por fim, o governo de Minas Gerais ainda defendeu pessoalmente o governador Romeu Zema (Novo), alegando que o compromisso da gestão é 'fazer um tombamento com respaldo legal para que a Serra do Curral atravesse gerações como o cartão-postal de Belo Horizonte', finaliza a nota.

Alvo de críticas de ambientalistas desde que o governo autorizou mais uma mineração no cartão-postal de Belo Horizonte, Zema tem sido constatemente questionado sobre o assunto. Na segunda-feira (5),  um candidato do PDT se manifestou contra o governador sobre o assunto e temrinou preso. 

Não há tempo a perder, diz ambientalista

Na visão de Jeanine Oliveira, do Projeto Manuelzão e uma das coorndenadoras do movimento 'Tira o Pé da Minhas Serra', o movimento da prefeitura de tentar tirar a discussão do ambito estadual é acertada, uma vez que o processo de tombamento tem se arrasado há anos.

"Não há mais tempo a perder quando falamos sobre o tombamento da Serra do Curral. O relatório do Iepha que indica o tombamento, que inclusive foi elogiado pelo Ministério Público, está pronto há 10 anos. Mesmo assim nenhum governo atuou para que ele fosse levado adiante. É preciso que o tombamento ocorra e não mais o que ser discutido. Todas as partes já foram ouvidas, tudo o que tinha para ser falado já foi dito. Agora, o que falta, é a apenas a vontade do governo", alega.

A ambientalista põe em dúvida o posicionamento do governo de Minas Gerais, que ao mesmo tempo em que concede licenças para mineirar na Serra do Curral, também se posiciona a favor do tombamento. "É um governo dúbio e não dá para confiar que a vontade deles é de realmente proteger a Serra do Curral. Se houvesse realmente essa vontade, o governador poderia facilmente revogar essas licenças e prosseguir com o tombamento, mas o que vemos é que toda decisão que é favorável a serra é lenta e cheia de burocracias", crítica Jeanine.

E a Tamisa?

A Tamisa, que também foi procurada pela reportagem, alegou que recebeu a decisão da PBH de se retirar da mediação com 'surpresa e perplexidade'. Além de insinuar que o posicionamento tem relação com o período eleitoral, a mineradora garantiu que vai comprovar, perante a Justiça, que cumpriu com todas as exigências da legislação vigente para a obtenção das licenças concedidas pelo governo de Minas Gerais. 

CRONOLOGIA

Relembre os principais momentos dessa queda de braços judicial

ABRIL

Dia 30: Após reunião ordinária de cerca de 18 horas de duração, o Conselho Estadual de Política Estadual (Copam) aprova a licença ambiental da Tamisa para instalação do complexo industrial na Serra do Curral

MAIO

Dia 25: PBH inicia levantamento para criar parque metropolitano na Serra do Curral

Dia 27: Procedimento para apurar as possíveis consequências da mineração é aberto e, após pedido de Alerta Patrimonial, Unesco avalia se serra do Curral segue com título de Patrimônio da Humanidade concedido em 2005

JUNHO

Dia 7: Secretários participam de audiência na ALMG para explicar licença que vai permitir a Tamisa retirar minério de ferro na Serra do Curral

JULHO

Dia 12: Um dia após a Tamisa ser impedida de operar na serra do Curral por três dias, mineradora pede suspensão de tombamento “por via excepcional”

Dia 13: Reunião do Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep) sobre tombamento provisório é suspensa. No mesmo dia, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) suspendeu ação movida pela PBH, que pedia nulidade da decisão do Copam

Dia 14: Decisão que suspendia atividade minerária é revogada, e Justiça Federal recusa ação movida pelo Ministério Público Federal (MPF) que pedia que a empresa precisasse da autorização do Ibama para promover desmatamento. No mesmo dia, presidente do TJMG, suspende liminar e proteção provisória do território é retomada

Dia 18: Procuradoria Geral do Município (PGM) de Belo Horizonte pressiona Estado a suspender TAC que permite mineração

AGOSTO

Dia 5: Em audiência de conciliação, o TJMG proíbe Tamisa de preparar área para mineração, com isso, as atividades de mineração na serra do Curral ficam suspensas enquanto durarem as discussões sobre o tombamento estadual

Dia 18: Ministério Público Federal (MPF) recorre de decisão que negou suspensão de licença da Tamisa

SETEMBRO

Dia 2 - Representantes do governo de Minas e da Tamisa participam de nova audiência de conciliação sobre tombamento da serra do Curral é realizada no TJMG 

Matéria em atualizada às 18h21