Uma reunião de conciliação para tratar sobre o tombamento da serra do Curral, em Belo Horizonte, aconteceu em meio a uma série de polêmicas na manhã da última quarta-feira (2 de agosto). Determinado pela Justiça, o encontro ocorreu sem a presença do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que se retirou da sala após o Governo de Minas acatar o pedido da mineradora Taquaril Mineração S.A. (Tamisa) e impedir a participação de integrantes do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos), órgão vinculado à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

A informação foi confirmada a O TEMPO pelo próprio MPMG, por nota. "Os servidores do MPMG se retiraram da reunião quando foi indeferida a participação do Icomos e da Práxis, consultoria que auxiliou o Iepha na elaboração do dossiê de tombamento", disse o órgão.

Flavio Carsalade, presidente do Icomos Brasil, confirmou ter sido convidado a participar da reunião de conciliação pela própria Advocacia-Geral do Estado (AGE), sob a informação de que seria apresentado um "dossiê alternativo" sobre o tombamento da Serra.

"O Icomos enviou o representante de Minas Gerais, porém, ao abrir a reunião, o advogado da Tamisa disse que era uma reunião privada e que pessoas que não estivessem diretamente ligadas ao processo deveriam se retirar. Com isso, a AGE acatou e pediu que nos retirássemos. Ficamos sem entender direito, pois, no final das contas, estamos envolvidos na ação", ponderou.

Em dezembro de 2022, o Icomos lançou um "alerta patrimonial global" sobe a situação da conservação da serra do Curral. O objetivo é avisar mundialmente o risco que o patrimônio natural corre sem o seu tombamento, sendo este alerta o primeiro passo para, caso nada seja feito, a serra do Espinhaço perder o título de "Reserva da Bioesfera" da Unesco.

O governo de Minas foi procurado nesta quinta para comentar a retirada do MPMG da reunião e, também, sobre o porquê da AGE ter atendido ao pedido da Tamisa para que o Icomos se ausentasse da sala. Até o fechamento desta reportagem, o Estado não tinha respondido sobre este ponto.

Reunião teria sido omitida em agenda oficial

Após descobrirem a realização da reunião, na manhã de quarta, ambientalistas resolveram procurar a agenda oficial da secretária de Meio Ambiente e, para a surpresa deles, não existia nenhum encontro previsto para o horário.

Integrante do movimento "Tira o pé da minha Serra", o urbanista e professor da UFMG Roberto Andrés disse ser muito grave a secretária Marília participar de uma agenda "secreta" com a Tamisa. "Assim que fizemos uma publicação nas redes sociais, a Semad alterou sua agenda e colocou este compromisso, mostrando que, de fato, busca esconder algo", argumentou.

Em nota enviada na segunda-feira (2 de agosto), o governo de Minas não comentou sobre a ausência da reunião na agenda oficial da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).

Encontro discutiria parâmetros técnicos, diz governo

Procurado pela reportagem de O TEMPO na tarde de quarta-feira (2 de agosto), o governo de Minas confirmou a realização da reunião de conciliação "por orientação do TJMG" como parte do processo de mediação existente na Justiça. Ainda segundo o Estado, a reunião tinha o objetivo de analisar parâmetros técnicos relativos ao tombamento.

Porém, por nota, o governo disse que a reunião contou com a participação de diversos órgãos públicos, como Semad, Secult, Sede e Iepha, e, também, com o MPMG, omitindo que o órgão de Justiça se recusou a participar do encontro.

"As reuniões de conciliação fazem parte de um cronograma estabelecido pelo TJMG, que ainda prevê uma série de amplas audiências públicas para debates sobre o tema, permitindo a participação de qualquer pessoa interessada", completou.

Leia a nota na íntegra:

"Informamos que a reunião em questão foi realizada na Cidade Administrativa, nesta quarta-feira (02/08), por orientação do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), e integra o processo de mediação conduzido pelo Judiciário com o objetivo de discutir e analisar parâmetros técnicos relativos ao tombamento definitivo da Serra do Curral.

A reunião contou com representantes da Advocacia-Geral do Estado (AGE), das Secretarias de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Cultura e Turismo (Secult) e Desenvolvimento Econômico (Sede), da Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte (ARMBH), do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), da empresa Tamisa e das prefeituras de Sabará e Nova Lima, para alinhamento e debate sobre estudos técnicos relacionados à Serra do Curral.

As reuniões de conciliação fazem parte de um cronograma estabelecido pelo TJMG, que ainda prevê uma série de amplas audiências públicas para debates sobre o tema, permitindo a participação de qualquer pessoa interessada.

Reforçamos que a Serra do Curral está sob proteção provisória, determinada pelo Governo de Minas Gerais, pela Portaria IEPHA 22/2022, desde 19 de junho de 2022. Neste processo, foram suspensas quaisquer intervenções de mineração na área. Nesse sentido, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) segue atuando nas competências de fiscalização ambiental, visando garantir que todos os processos de responsabilidade da pasta estejam em conformidade com a lei.

A proteção provisória da Serra do Curral foi reforçada por decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), ao instaurar e conduzir, desde agosto de 2022, a Mesa de Mediação para construção de um diálogo mais próximo sobre o tema. As discussões são supervisionadas pelo Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania de 2º grau (Cejusc) do TJMG.

É importante destacar que é competência exclusiva do Conselho Estadual de Patrimônio Cultural (Conep) deliberar sobre diretrizes, políticas e outras medidas correlatas à defesa e preservação do patrimônio cultural do Estado de Minas Gerais. Dessa forma, só o Conep tem a autoridade para atestar tombamentos no âmbito estadual. Para tanto, o órgão irá aguardar a finalização do processo de mediação judicial.

O Governo de Minas segue trabalhando para garantir a preservação da Serra do Curral, com respaldo legal e sustentável, respeitando o diálogo com os entes envolvidos."