Depois de todo o trauma vivenciado na tragédia da mina de Córrego de Feijão, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, os funcionários sobreviventes da Vale estariam agora sendo sujeitos a condições irregulares de trabalho. Os trabalhadores estariam atuando na área da lama sem equipamentos de segurança e até sem instalações sanitárias adequadas, conforme denúncia feita pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), em reunião na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, ao longo da tarde desta quinta-feira (11).

A situação motivou a abertura de mais um inquérito no órgão que vai solicitar para a mineradora a resolução de algumas questões na próxima semana. “Nós estamos convictos de que há situações de condições de trabalho irregulares, em conflito com as normas que prescrevem as condições de saúde, higiene e conforto no local de trabalho”, disse a procuradora do MPT integrante do grupo de atuação finalística que acompanha a situação em Brumadinho, Luciana Marques Coutinho. 

Segundo a procuradora, no dia 26 de junho, uma equipe do MPT e de fiscais do Ministério do Trabalho estiveram no local onde era a mina para averiguar denúncias recebidas por sindicatos representantes dos trabalhadores. “Quando chegamos lá, já nos deparamos com a falta de instalações sanitárias. Os trabalhadores usam banheiros químicos que não recebem a higienização correta. Além disso, homens e mulheres dividem a mesma cabine sanitária porque não têm opção”, afirma. 

O MPT constatou também que os funcionários estariam sendo forçados a aguardar horas por uma condução no fim do expediente. A espera pelo ônibus que os leva para a casa chega a três horas em alguns casos. O órgão alega ainda que os trabalhadores colaboram com as buscas de corpos na área da lama sem o devido preparo, como equipamentos de proteção para impedir contato com elementos possivelmente tóxicos. As investigações vão continuar, mas, já na semana que vem, o MPT vai pedir que essas três questões sejam resolvidas imediatamente. Caso não haja um consenso, os procuradores vão recorrer a uma ação judicial. Procurada, a Vale disse não ter sido oficialmente notificada sobre as alegações. 

Sobreviventes

O técnico em mecânica da Vale, Edivaldo Alves Moreira, 49, é um dos sobreviventes da tragédia de Brumadinho. Mesmo com o psicológico abalado, ele voltou ao trabalho dois meses depois do rompimento da barragem. Ele é mais um  funcionário na ativa mesmo doente.

“Não tivemos opção. Ou a gente trabalha e revive aquela situação todo dia, ou  perde o emprego”, diz.  Ele conta que no dia do rompimento da barragem estava dentro do refeitório da empresa. "Tive que sair correndo e não consegui salvar mais ninguém. Estou a base de remédios para conseguir conviver com essa lembrança", afirma. 

A situação afeta muitos outros funcionários, segundo o advogado do Sindicato Metabase de Brumadinho, Luciano Pereira. “Queremos que a empresa dê apoio financeiro para essas vítimas”, afirma. Segundo ele, operadores de máquinas estão inclusive dando apoio ao trabalho de buscas de corpos, sem nenhum preparo para isso. "Temos medo que essa situação agrave o trauma desses trabalhadores", afirma. 

A deputada que participou da audiência pública, Beatriz Cerqueira (PT) disse que as denúncias serão incluídas na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) em curso na Assembleia. “Assustadoramente a Vale se supera. Ela não afastou trabalhadores que estão em tratamento psiquiátrico. Ela impôs aos trabalhadores que estivessem na mancha buscando corpos dos colegas que faleceram, sem treinamentos e sem condições de estar ali. Ela desrespeita o trabalhador. Matou mais de uma centena e os que sobreviveram ela impõe essa situação degradante”, disse a parlamentar.

Em nota, a mineradora disse que “nenhum dos funcionários da Vale auxilia a corporação nas atividades de busca na área afetada pelo rompimento da Barragem 1 da mina Córrego do Feijão, em Brumadinho.  A empresa reitera que os empregados que manifestaram desejo de retornar `a rotina de trabalho foram acolhidos por uma equipe de profissionais especializados nas áreas da saúde e segurança. Apenas retornaram os funcionários que estavam aptos clinicamente. A empresa informa que também disponibiliza psicólogos nos locais para acompanhamento constante”.