Surpresa

Zika vírus é capaz de inibir as células do câncer de próstata

Cientistas esperam ter alguma terapia disponível para pacientes em breve

Por Da Redação
Publicado em 14 de novembro de 2019 | 06:00
 
 
Mesmo após ser inativado, o vírus manteve a capacidade de frear os tumores Foto: Flávia Luísa Dias Aldibert/Divulgação

Depois de provocar uma grave epidemia que resultou no nascimento de milhares de bebês com microcefalia, o vírus da zika vem revelando um aspecto tão inesperado quanto positivo: a capacidade de destruir tumores cancerígenos. 

Um novo estudo publicado na “Scientific Reports” por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) constatou que o vírus é capaz de inibir a proliferação de células do câncer de próstata em pelo menos 50%. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), 60 mil novos casos desse tumor são registrados todos os anos no Brasil.

Não foi o primeiro estudo a constatar essa vocação benigna do vírus. O mesmo grupo da Unicamp, liderado por Rodrigo Ramos Catharino, já havia demonstrado que o patógeno também é eficaz no combate a tumores no cérebro.

O grupo de especialistas está estudando o uso do vírus contra outros tipos de tumores malignos e espera que, em cinco anos, já tenha alguma terapia disponível para o público. No trabalho mais recente, publicado anteontem, os cientistas da Unicamp usaram células de adenocarcinoma de próstata. Eles constataram que, mesmo depois de ser inativado, o vírus consegue inibir a replicação das células.

Entenda

Os experimentos foram feitos com uma linhagem viral obtida a partir de amostras isoladas de um paciente infectado no Ceará, em 2015. Depois de cultivado em laboratório, o vírus foi aquecido a uma temperatura de 56º C durante uma hora para que o seu potencial de causar uma infecção fosse inibido. 

“Na versão ‘selvagem’ (sem passar por inativação), o vírus poderia trazer efeitos indesejáveis e, portanto, não poderia ser usado como terapia”, explicou Catharino, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unicamp e coordenador do Laboratório Innovare de Biomarcadores. 

O passo seguinte foi colocar uma cultura de células tumorais em contato com o vírus inativado. Após períodos de 24 e 48 horas, os cientistas compararam essa solução a outro grupo de células cancerígenas que não tinham sido expostas ao vírus. 

Na análise feita após dois dias, a linhagem que ficou em contato com o vírus inativado apresentou um crescimento 50% menor do que a linhagem de controle. “Há redução real na atividade das células do tumor em mais ou menos 50%, o que já é excelente”, disse o especialista. “Vemos, no futuro, uma terapia promissora”, afirma.

Tumor no sistema nervoso central teve redução de 40% 

A linha de pesquisa do grupo teve início há cerca de quatro anos, quando foi descoberta a relação entre a epidemia de zika e o aumento dos casos de microcefalia no Brasil. 

Depois que estudos confirmaram que o vírus era capaz de infectar as células neurais dos embriões, o professor da Unicamp Rodrigo Ramos Catharino resolveu testá-lo em linhagens de glioblastoma – o tipo mais comum e agressivo de câncer do sistema nervoso central. A redução, no caso, foi de 40%.

“O próximo passo da investigação envolve testes em animais”, contou Catharino. “Caso os resultados sejam positivos, pretendemos buscar parcerias com empresas para viabilizar os ensaios clínicos”, diz.