Quando completou 37 anos, a enfermeira Shirley Motta (@shirleymottaaa), de 45 anos, começou a se isolar e sentir exaustão mental, insônia, fogachos e névoa mental. Ela procurou por diversos profissionais da saúde, mas teve “zero apoio” deles, e de muitos ouviu ser poliqueixosa, ou seja, termo médico usado para pacientes que procuram várias especialidades com diversos sintomas, mas sem alterações detectadas nos exames.
“Saía de todas as consultas com um remédio para tratar outras doenças”, relembra Shirley, que também é consultora de diversidade e inclusão, além de líder e facilitadora de workshops em liderança feminina. Nessa época, sentia estar a “beira de um colapso”. “Não dormia e estava sempre irritada e cansada. Não queria sair, e os compromissos sociais se tornaram uma tortura. Eu amo maquiagem e criava conteúdos para internet sobre o tema, mas com os calores e o excesso de suor, parei de usar, se tornou insustentável. Comecei esquecer coisas básicas do dia a dia como onde coloquei as chaves de casa”, recorda. Apenas cinco anos depois de quase entrar em “um estado de loucura”, Shirley finalmente descobriu: estava na menopausa precoce.
A condição acontece quando a mulher perde as funções do ovário antes dos 40 anos e atinge cerca de 30 milhões de pessoas no Brasil, que representam 7,9% da população feminina, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Sintomas da menopausa precoce
Os sinais são os mesmos da menopausa natural e incluem alterações de humor, irritabilidade, insônia, queda da libido, ressecamento vaginal, problemas de memória, fadiga e cansaço intenso, ondas de calor, sudorese noturna, dificuldade de concentração, ganho ou perda de peso, ciclos menstruais irregulares ou ausência da menstruação.
“A diferença principal está na idade de início: enquanto a menopausa natural costuma ocorrer por volta dos 45 a 55 anos, a precoce se manifesta antes dos 45, o que surpreende muitas mulheres por não estarem preparadas para esse processo, principalmente quando acontece antes dos 40 anos”, salienta a ginecologista Eliana Teixeira, especialista em emagrecimento e menopausa.
Dentre as razões para desenvolvimento da menopausa precoce, a genética exerce grande influência na determinação da reserva ovariana. “Mulheres cujas mães ou avós apresentaram menopausa precoce têm risco aumentado de vivenciar o mesmo”, aponta a ginecologista.
Outros motivos para o surgimento da condição antecipada são doenças autoimunes, tratamentos de câncer, uso de drogas e mutações em genes relacionados à função ovariana. “Além disso, também há exposição a toxinas ambientais (desreguladores endócrino) ou um ambiente com estresse crônico estão associadas à falência ovariana precoce”, complementa a médica.
Forte impacto emocional
Além de afetar diferentes aspectos da vida da mulher, o impacto emocional costuma ser o mais intenso, sobretudo porque, ao receber o diagnóstico da menopausa precoce, ela associa o momento à perda da fertilidade. Até descobrir que se encontrava nessa fase, Shirley tentou engravidar diversas vezes sem sucesso. “Cheguei a pensar que eu tinha algum outro problema de saúde, e era apenas a menopausa. Tê-la tão precoce acabou me roubando a realização de ser mãe de forma natural”, lamenta.
Psicóloga especialista em mulheres, Juliana Pereira afirma ser muito comum que a mulher viva um processo de luto diante da perda da fertilidade precoce, mesmo que não tivesse o desejo imediato de engravidar. “Essa vivência pode vir acompanhada de frustração, tristeza e até culpa. O caminho para lidar com esses sentimentos passa pela validação emocional: reconhecer que o que sente é legítimo e faz parte do processo”, identifica a especialista.
Juliana descreve ainda que a menopausa precoce pode trazer impactos significativos para a saúde emocional da mulher, já que acontece em uma fase da vida em que, em geral, não se espera esse processo. “A queda abrupta de hormônios pode desencadear sintomas como ansiedade, alterações de humor e depressão, mas o impacto vai além do biológico. Muitas mulheres passam a sentir insegurança em relação ao corpo, à feminilidade e à autoestima, já que a menopausa ainda é cercada de estigmas sociais ligados ao envelhecimento e ao fim da fertilidade”, comenta.
A psicóloga ressalta, porém, que é importante que nenhuma mulher precise enfrentar esse processo sozinha. “Além do acompanhamento médico, o suporte psicológico é essencial para lidar com as mudanças emocionais e sociais desse período. A criação de redes de apoio, com família, amigas, grupos terapêuticos ou de mulheres que vivem a mesma experiência, também contribui para reduzir a sensação de isolamento e fortalecer o enfrentamento”, diz.
Veja qual é o diagnóstico e tratamento
O diagnóstico da menopausa precoce é baseado na história clínica da paciente, analisa a ginecologista Eliana Teixeira. “Acontece uma mudança do jeito que essa mulher se comporta. Por exemplo, uma mulher que nunca teve TPM pode começar a apresentar sintomas, e quem já tinha pode notar uma piora significativa ou ‘do nada’, essa mulher começa a dormir mal e acordar 3h30, e isso piora consideravelmente o cansaço ao longo do seu dia”, identifica, destacando que existem mais de 60 sintomas associados a transição para menopausa.
A médica conta também que mulheres com idades entre 35 e 40 anos podem passar pela transição para a menopausa precoce, período conhecido como climatério. “Os sintomas são os mesmos, mas eles não chamam atenção dessa mulher pelo fato de ainda ser jovem, e isso atrasa o diagnóstico correto”, discute. Nessa fase, o diagnóstico se tora mais difícil também porque não há alteração nos exames complementares. “Por isso, uma consulta com médico que entenda do assunto é fundamental”, afirma.
A terapia de reposição hormonal costuma ser o principal tratamento para mulheres com menopausa precoce. “Como elas passam muitos anos sem a proteção dos hormônios naturais, há aumento do risco de doenças cardiovasculares e ósseas”, comenta. Entretanto, cada caso deve ser avaliado individualmente, considerando histórico familiar e pessoal de câncer de mama, trombose ou doenças hepáticas.
“Os riscos existem, mas quando bem indicada e acompanhada, a terapia hormonal pode trazer mais benefícios do que prejuízos”, salienta a médica. No caso enfermeira Shirley Motta, a orientação foi justamente fazer esse tratamento. “Tenho ajustes trimestrais e/ou de acordo com minha necessidade. Outra estratégia são os exercícios físicos e os suplementos. Tudo muito bem planejado e assistido pela minha médica”, aponta.
Alimentação e exercícios são fundamentais
Durante o climatério e a menopausa precoce é comum que haja aumento de peso e perda da massa muscular devido à diminuição dos hormônios femininos. Portanto, praticar exercícios físicos e manter uma alimentação balanceada é fundamental nesse processo.
Nutricionista especializada em climatério e menopausa, Ronária Assis fala sobre o papel da alimentação nessa fase. “Alguns alimentos como café, álcool, frituras, industrializados e comidas muito apimentadas podem piorar sintomas como ondas de calor e alterações de humor”, relata.
A especialista comenta ainda que, com a queda do estrogênio, há aumento de chances de desenvolvimento de doenças cardiovasculares e de perda de massa óssea. “Esse risco é ainda maior quando há excesso de peso, especialmente com acúmulo de gordura abdominal, que aumenta as chances de um infarto, por exemplo”, diz.
Para cuidar da saúde nessa fase, é fundamental garantir uma alimentação rica em Cálcio, vitamina D, ômega-3, fibras e antioxidantes como vitamina C, vitamina E, selênio e zinco. “Esses nutrientes ajudam a manter o equilíbrio do organismo e proteger tanto o coração quanto os ossos”, aponta.
Para descobrir a dieta que melhor funcione durante a menopausa precoce é importante se consultar com uma especialista, mas Ronária indica que o mais adequado é ter uma alimentação mais natural possível, “com os alimentos certos para essa fase”, como chá de folha de amora, farinha de linhaça, semente de abóbora, brócolis e inhame.
“A linhaça pode, por exemplo, ajudar a reduzir os sintomas como ondas de calor e irritação, porque tem substâncias que agem parecidas com os hormônios que estão diminuindo. Outro exemplo é o chá de folha de amora, que também ajuda a equilibrar os sintomas, trazendo mais conforto. Comer brócolis e inhame pode ajudar a manter os ossos fortes e o corpo funcionando melhor”, reforça.
Ronária comenta também ressalta que nem todas as mulheres poderão ou vão desejar fazer reposição hormonal. “Então, mais do que nunca, cuidar da alimentação e manter a prática regular de exercícios físicos é fundamental para você se sentir bem e viver essa fase com qualidade”, corrobora.