Em 25 de janeiro de 2019, quando a lama mal acabara de devastar a mina de córrego do Feijão e uma vasta extensão de Brumadinho, o então presidente da Vale Fabio Schwartsman surgiu em vídeo no qual usava blusa de malha em vez de terno e gravata e mais olhava para papéis sobre a mesa do que para a câmera. “É algo além, acima de qualquer coisa que eu pudesse imaginar”, afirmou sobre o rompimento da barragem.
Ontem, o Ministério Público de Minas Gerais afirmou que ele e mais 15 executivos da mineradora e da empresa alemã Tüv Sud não só sabiam que a estrutura se romperia, como foram os responsáveis diretos pela morte de 270 pessoas, ao denunciá-los por homicídio doloso.
As investigações e o relatório da CPI das Barragens na Assembleia reuniram provas de que a Vale apresentou dois laudos falsos de estabilidade, emitidos pela Tüv Süd, três meses antes da tragédia, tempo mais que suficiente para, pelo menos, tirar o refeitório e os escritórios do local que foi soterrado em menos de 60 segundos e alertar a população sobre o perigo.
Além da consciência do fato, outro elemento do dolo é a vontade clara e inequívoca dos autores de causar as mortes. Isso acarreta um longo debate doutrinário sobre se, ao levá-lo, desse modo, para o júri popular, o caso poderia ser classificado pelo Tribunal de Justiça como crime culposo de negligência - com penas mais brandas que os 12 a 30 anos previstos para cada homicídio doloso.
Independemente disso, a decisão dos procuradores traz uma imensa carga simbólica por se dar no momento em que a tragédia completa um ano e os apelos contra impunidade reverberam. Além disso, a denúncia nos lembra que deixar 270 vidas se perderem para priorizar o lucro financeiro é, como o próprio Schwartsman dissera naquele sombrio vídeo, “indesculpável”.