É no silêncio que mais se aproveita a felicidade espiritual e no barulho que se esconde o triste vazio materialista.
“O homem meramente profano, o mais comum, precisa de ruídos; o homem místico é silenciosamente solitário. O homem plenamente crístico (evoluído espiritualmente) é dinamicamente solidário. Ele sabe que as coisas materiais não apagam o desejo; pelo contrário, quanto mais festejadas, tanto mais acendem outros desejos. O ‘querer egoísta’ não tem fim, exige novas posses, sempre maiores e mais esplendorosas – os profanos necessitam intensificar os estímulos a cada momento, para almejar novos prazeres; e, não raro, procuram narcotizar-se para obliterar a parte divina da consciência humana. Como quem bebe água salgada para apagar a sede, acendendo-a cada vez mais, perdem seu tempo, e a vida, na procura do supérfluo e inútil”.
A pior das discórdias, a mais trágica das guerras, é o conflito que o homem traz dentro de si mesmo, o conflito entre o ego de sua humana personalidade e o Eu espiritual da sua divina individualidade. “Fatti non fummo per viver come bruti”, ensina Dante Alighieri.
Por isso, o homem que chegou ao conhecimento de si mesmo, o místico, é invulnerável aos ataques profanos; ninguém pode ofendê-lo, ninguém pode empobrecê-lo, ninguém lhe pode infligir perda de espécie alguma, uma vez que ninguém pode obrigá-lo a perder o que ele é.
O homem que estabeleceu a paz de Deus em sua alma é um poderoso fator para restabelecer a paz em outros indivíduos e na sociedade. O filósofo místico norte-americano Emerson disse, certa vez, a um homem que falava muito em paz, mas não a possuía dentro de si: “Não posso ouvir o que dizes, porque aquilo que tu és fala mais alto”.
Isso pode se aplicar, ainda hoje, em larga escala, às figuras mais expostas social e politicamente, mostrando a imaturidade que aflige a eles e se reflete na nação.
Quem não é pacificado dentro de si mesmo não pode ser pacificador fora de si. Quanto mais perturbado o homem é internamente, pela ausência de harmonia espiritual, tanto mais necessita de alegrias externas, geralmente ruidosas, asquerosas e violentas. Esse homem não tolera a solidão, que lhe traz consciência mais nítida da sua vacuidade e da sua desarmonia interior; por isso, evita quanto possível estar a sós consigo. Procura companhia por toda parte e, quando não a pode ter em forma de pessoas, canaliza para dentro da sua insuportável solidão os ruídos da rua, do mundo infernizado. Alguns vão mais longe e recorrem a entorpecentes e bebidas para povoar sua triste solidão.
Quem teme a meditação foge da autoanálise, necessita de toda espécie de distrações para esquecer a si mesmo.
Geralmente, os homens mais felizes são ignorados pela humanidade. Os milionários da felicidade são, quase sempre, os grandes anônimos da história, os “não existentes” nos noticiários. Estes nem pela mídia são tratados, são homens que aparecem em público com raras exceções. Expressam-se por meio de mensageiros. São os irmãos anônimos que estão presentes onde haja serviços a prestar, difíceis de serem identificados por detrás das suas obras. Os muitos e os ruidosos, que falam de si, são marionetes muitas vezes danosos, porque não encontram espaço no anonimato da benevolência universal, em que os méritos são retribuídos com a felicidade mais intensa.
Os verdadeiros redentores da humanidade são tão felizes no cumprimento da sua missão que nunca esperam pelos aplausos de plateias. São igualmente indiferentes aos louvores e às injúrias, porque eles vivem na poderosa e invisível comunidade a serviço da evolução, ou seja, do lado oposto do destruidor, e dos conflitos egoístas.
O homem justo, espiritual, pelo simples fato de existir, contraria o injusto porque ao lado dele acentua as deficiências e as falhas do outro.
Quem não adota a honestidade interior não tolera, minimamente, a realidade de sua inferioridade em relação ao sábio. Disso eclodem dois tipos de reação. Pode-se despertar em alguns, os superiores, o vivo desejo de ser tão espiritual quanto o sábio místico, ou, em sentido oposto, uma agressividade destruidora: “Se não consigo ser em paz comigo, como o sábio é com ele, melhor apagar sua presença”.
Enfrentar o martírio pode o destino do místico, como o de um cordeiro entre lobos esfomeados. Mas nessa missão, no ápice de sua solidariedade, encontra a função de nutrir as feras enquanto abre-lhe outra oportunidade de redenção.
O egoísta não é útil nem amado, o místico é, por dentro, unicamente de Deus e, por fora, um ajudante de todas as criaturas de Deus. Sem dúvida, o grande aliado da evolução.