O Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG) julga nesta quarta-feira (22) se emite ou não alertas ao Estado e ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) por causa da “inobservância dos limites de alerta (44,10%), prudencial (46,55%) e máximo (49%) pelo Poder Executivo Estadual e do limite de alerta (5,32%) pelo TJMG, atinente à despesa total com pessoal”.
No caso do Executivo, se considerados dados da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), o Estado estourou os limites de gastos com pessoal nos primeiros quatro meses de 2020. Os números mostram que o governo gastou R$ 37,5 bilhões com pagamento de pessoal - o que corresponde a 58% da Receita Corrente Líquida (RCL) e infringe a LRF, que determina que o limite máximo não ultrapasse 49%.
Porém, o TCE utiliza outros números para acompanhar a situação do Estado em relação à legislação que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal. A partir desses dados, disponibilizados pela Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais (SEF-MG), nos primeiros quatro meses, o governo teria gasto R$ 31 bilhões com pessoal, o que corresponde a 47,86% da LRF - o que colocaria o Executivo abaixo do limite máximo. Essa diferença se dá porque o TCE retira da conta os gastos com inativos.
Segundo o especialista em finanças públicas Gil Castello Branco, fundador da ONG Contas Abertas, essa é uma manobra nas contas públicas, realizada em muitos estados e que tem por objetivo de “maquiar” as informações em relação à situação fiscal do Estado. “Já tiveram vários estados que usaram maquiagens na LRF, ou maquiagem na receita ou na despesa. Então, as contas do Estado divergiam das contas pelo Tesouro”.
Já no caso do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o gasto total em despesas com pessoal no mesmo período foi de R$ 3,2 bilhões, o equivalente a 4,96% da RCL. Com isso, o órgão se aproxima do limite de alerta definido pela legislação, que é fixado em 5,32%, ou R$ 3,4 bilhões.
Ainda na avaliação de Castello Branco, é papel do TCEMG acompanhar de perto a situação do Estado - ainda que utilize metodologia que, segundo ele, pode ser traduzida em uma “interpretação, a meu ver, descabida da Lei de Responsabilidade Fiscal”. “Se já atingiu o padrão de limite de alerta, cabe ao Tribunal emitir uma recomendação ao Estado”.
Apesar da situação, em razão do decreto de calamidade pública assinado pelo governador Romeu Zema em 20 de março de 2020, o governo de Minas não pode ser punido pelo descumprimento de regras previstas na LRF. A legislação prevê que, em situação de calamidade pública, "serão suspensas a contagem dos prazos e as disposições estabelecidas" em relação à despesa com pessoal e dívida públicae e "dispensados o atingimento dos resultados fiscais e a limitação de empenho prevista na lei".
Dívida pública
Além dos limites em relação à LRF, o TCE também deve julgar se envia um alerta ao governo de Minas quanto à dívida pública do Estado que, nos quatro primeiros meses do ano, ultrapassou o limite de 200% da Receita Corrente Líquida (RCL) e chegou a R$ 132 bilhões.
Uma explicação para o aumento considerável da dívida é a suspensão dos pagamentos que, no caso de Minas Gerais, diferentemente de outros estados, ocorreu antes mesmo da pandemia de coronavírus. Em razão da situação fiscal do Estado, que já era muito grave, o governo conseguiu a suspensão dos pagamentos por meio de liminares do Supremo Tribunal Federal (STF).
Na avaliação do economista e especialista em finanças públicas, Guilherme Tinnoco, no caso de Minas, a suspensão da dívida que foi feita em razão da pandemia não trouxe alívio ao Estado diante da queda brusca de arrecadação provocada pela pandemia porque este já vinha sendo beneficiado pela medida anteriormente.
“Em alguns Estados, a perda de arrecadação está sendo parcialmente compensada pelo pacote da União, que além do recurso em dinheiro, trouxe também a suspensão do pagamento das dívidas com a União. No caso de Minas, que já tinha um orçamento deficitário e já não pagava as parcelas da dívida desde antes, o alívio que serviu para alguns, não fez diferença para o Estado”, explicou.
Respostas
Por meio de nota, a SEF-MG confirmou que a metodologia utilizada pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) difere da utilizada pelo TCEMG, que desconta o valor gastos pelo Estado com inativos na conta final da despesa com pessoal. “Considerando-se a metodologia da STN, MG está 9% acima do limite máximo imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Já no cenário em que é levada em conta a metodologia do TCE, MG está 1,14% abaixo do limite máximo da LRF”.
Esclareceu ainda que “o Relatório de Gestão Fiscal (RGF) referente ao primeiro quadrimestre de 2020 leva em consideração a Receita Corrente Líquida (RCL) e a Despesa Líquida com Pessoal (do Poder Executivo) dos últimos 12 meses, ou seja, de maio/2019 a abril/2020”. Isso, na avaliação do especialista em finanças públicas, Gil Castello Branco, sugere que a situação do Estado pode ser ainda pior, uma vez que a arrecadação dos últimos meses caiu em razão dos impactos econômicos da crise do coronavírus.
Em relação à dívida, a SEF-MG também confirmou que a mesma atingiu 204% da RCL e que o atual cenário tem ligação direta com os impactos da pandemia. “Levando-se em conta que, no mês de abril, houve queda de R$ 1 bilhão na arrecadação tributária do Estado, é, sim, possível afirmar que a pandemia tem relação com o cenário apresentado no 1ª quadrimestre deste ano”.
Também citou a necessidade de aprovação de uma reforma da previdência no Estado, proposta apresentada pelo governo à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), no mês passado, mas ainda sem previsão de votação em plenário. “Além do recuo nas receitas, houve aumento nas despesas com pessoal, principalmente, nas previdenciárias, evidenciando a necessidade de uma reforma no sistema previdenciário mineiro”.
Do total da Dívida Pública Estadual, a SEF-MG informou que R$ 96,7 bilhões (73,3%) referem-se à dívida com a União, cujos pagamentos estão suspensos desde o início do ano em razão de liminares do Supremo.
Já o Tribunal de Justiça de Minas Gerais informou, também por meio de nota, que “cumpre rigorosamente a Lei de Responsabilidade Fiscal e não trabalha com suposições”.
Sobre o julgamento, o TCEMG informou que não pode se manifestar, "até que a matéria se torne coisa julgada". Informou ainda que a sessão acontecerá por meio de videoconferência e será transmitida pelo canal do órgão no YouTube.