A Câmara dos Deputados aprovou o projeto de resolução com o objetivo de garantir transparência nas emendas de relator, conhecidas como “orçamento secreto” ou “paralelo”. A decisão diz que as indicações e as solicitações que fundamentaram as emendas serão publicadas de forma individual na internet, o que permite a identificação dos parlamentares que a solicitaram.
Com um placar de 268 votos favoráveis e 31 contrários, além de uma abstenção, essa foi a primeira etapa de votação. A segunda será feita no Senado Federal, o que está marcado para acontecer ainda nesta segunda-feira (29).
O relatório aprovado, no entanto, prevê a divulgação das indicações daqui para frente e não considera as emendas relativas a 2020 e as já destinadas em 2021. A decisão contraria nota técnica redigida pela consultoria do Senado de que é possível identificar os parlamentares autores dos recursos, a exemplo do que pediu o Supremo Tribunal Federal (STF) ao suspender os pagamentos deste ano.
A análise foi feita em referência ao ato conjunto assinado pelos presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de que é inviável fazer a divulgação por “impossibilidade fática" de estabelecer, de forma retroativa, um sistema de registro das demandas.
O relator, senador Marcelo Castro (MDB-PI), rebateu o documento e afirmou que a resolução atende “100% a decisão do STF”. “O passado não está na resolução. A resolução não tem poder para isso. O passado está no ato conjunto da Câmara e do Senado que disseram que não têm meios, já que não era exigido. Não se pode exigir, quem não tinha obrigação de guardar uma informação, que ele tenha guardado essa informação”, explicou.
“A partir de agora, todo o recurso que vier do relator-geral terá que constar a transparência absoluta e quem foi o autor que solicitou aquele recurso. É o óbvio. Estamos fazendo isso porque o STF determinou, e acho que determinou em boa hora”, continuou o relator.
A polêmica em torno das emendas de relator e que motivou a aprovação do projeto de resolução foi intensificada em outubro, quando a oposição acusou o governo federal de usar o mecanismo como um instrumento de negociação para aumentar a base de apoio no Congresso Nacional e, assim, reduzir possíveis dificuldades políticas. Na época, estava em pauta na Câmara a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, aprovada com placar apertado pelos deputados.
Ao ser cobrado sobre o motivo para não incluir, no projeto de resolução, a definição de critérios técnicos para a distribuição das emendas de relator entre deputados e senadores, Castro justificou que o debate é emergencial para “salvar as [emendas] que já foram empenhadas [reservadas nos cofres públicos], para salvar as que faltam ser empenhadas e para a gente poder fazer o Orçamento do ano que vem”.
Revogar a decisão do STF que suspendeu o pagamento das emendas de 2021 é, inclusive, alvo de negociação intensa da cúpula do Congresso. Além do pedido formal para isso em uma ação na Suprema Corte, Pacheco tem ido ao encontro de ministro em busca de uma solução. A última reunião foi na quinta-feira (25) com Rosa Weber, autora da primeira decisão que interrompeu as execuções.
Projeto limita valor das emendas de relator
Sem cravar números, o projeto de resolução cria um teto para as emendas de relator, com a proibição de que o valor total supere o das emendas individuais e de bancada. Apesar de não definir no parecer, Marcelo Castro defendeu, durante discurso, que haja uma diminuição no valor global das emendas de relator e um aumento no valor das emendas de bancada.
“São as mais transparentes, mais democráticas, mais republicanas e mais eficientes, porque para uma emenda ser aprovada em uma bancada de um determinado estado, é preciso que esses parlamentares se reúnam e discutam as prioridades do seu estado. E quem é que mais conhece as realidades do seu estado, as carências e as necessidades, são exatamente os parlamentares daquele estado”, argumentou o relator.
'Dinheiro é do povo', diz oposição
A proposta sofreu críticas durante o processo de votação por, segundo parlamentares, principalmente pela falta de clareza nos critérios para a divisão das emendas. O líder da oposição na Câmara, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), alegou que a justificativa de maior transparência não se sustenta.
“Nós não podemos ser coniventes com o uso tão grave do dinheiro público. Se essa proposta desse transparência, seria metade do problema, mas nem isso essa proposta faz. No uso do dinheiro público, não está garantido que o interesse público seja garantido. A única coisa que se faz é perpetuar uma coisa nefasta, antirrepublicana, que contraria a Constituição Federal, de usar o dinheiro público”, disse.
“Esse dinheiro é do povo brasileiro. Nós não temos o direito de usá-lo para atender ao nosso interesse. Temos que atender o interesse público”, completou o líder.
Em 2021, o Orçamento reservou para emendas de relator R$ 16,8 bilhões. Do total, R$ 3,8 bilhões foram pagos antes do Supremo Tribunal Federal (STF) suspender a execução, no início de novembro, com o entendimento de falta de transparência. “As emendas de relator atingiram uma proeminência que não estava prevista. Não há a menor necessidade desse volume de recursos”, disse o relator.
Já as emendas individuais somaram R$ 9,7 bilhões. O valor é dividido entre os 513 deputados federais e os 81 senadores, que fazem a alocação, geralmente, em atendimento às bases eleitorais. As emendas de bancada, destinadas ao grupo de parlamentares do mesmo estado ou região, somam R$ 7,3 bilhões.
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