O superintendente do Centro de Serviços Compartilhados da Cemig, Wantuil Dionísio Teixeira, confirmou em depoimento nesta segunda-feira (30) à CPI da Cemig que a AeC, empresa do ex-secretário de Desenvolvimento Econômico do governo Zema, Cássio Rocha de Azevedo, foi subcontratada para prestar serviços para a Cemig. 

Azevedo morreu em junho deste ano devido a um câncer. Como mostrou O TEMPO na sexta-feira (27), os deputados da CPI da Cemig já tinham suspeitas, agora confirmadas, de que a empresa dele teria sido subcontratada.

Segundo Wantuil Teixeira, a AeC prestava serviços de call center para a Cemig desde 2008 e venceu três licitações seguidas. Na quarta, realizada em fevereiro de 2020, a empresa foi derrotada por uma proposta de outra empresa, a Audac.

A Cemig, no entanto, cancelou o contrato com a Audac um ano depois, em 16 fevereiro de 2021, sem ter dado a ordem de início do serviço. Segundo a estatal mineira, isso ocoreu devido aos riscos aos funcionários impostos pela pandemia e pela decisão de implantar um sistema de atendimento unificado aos clientes.

Dias antes do cancelamento do contrato com a Audac, a Cemig realizou a contratação direta da IBM, sem licitação, por R$ 1,1 bilhão, e por um prazo de 10 anos, para implantar o atendimento integrado.

A justificativa apresentada pelo superintendente da Cemig no depoimento desta segunda-feira (30 para essa mudança foi de que, devido à pandemia, a estatal mineira decidiu melhorar o atendimento digital e a integração entre os canais de atendimento porque várias agências estavam fechadas e o índice de reclamações dos consumidores era alto. 

A IBM, então, foi contratada para implantar o novo modelo, cujo nome técnico é omnichannel, que reuniria serviços de call center, agências físicas de atendimento, atendimento digital e por aplicativo. Os deputados aprovaram requerimetos convocando representantes da IBM e da Audac para prestarem depoimento na condição de testemunhas.

Inicialmente, Wantuil Teixeira disse aos deputados que não sabia se a IBM subcontratou a AEC, empresa do ex-secretário de Zema que perdeu a licitação, para prestar o serviço de call center. Porém, após ser pressionado pelo presidente da CPI, Cássio Soares (PSD), ele confirmou a subcontratação e disse que a Cemig autorizou que ela ocorresse. Ele não soube informar por qual valor a AeC foi subcontratada.

“Existe um ditado popular que diz ‘ganhou, mas não levou'. Agora temos aqui o perdeu, mas levou”, disse o relator da CPI, Sávio Souza Cruz (MDB). 

O parlamentar questionou a decisão do Conselho de Administração de, mesmo com conhecimento dos índices de reclamação dos consumidores em relação ao atendimento, ter optado, inicialmente, por realizar uma licitação somente para call center e só depois decidir pelo modelo integrado de atendimento.

“Já se sabia que o modelo era negativo, era contraproducente, antieconômico, lesivo à Cemig, mas o Conselho de Administração autorizou abrir a licitação [para contratar apenas o serviço de call center, em um modelo individualizado]. De duas uma: ou o Conselho de Administração é inconsequente, ou alguma coisa ocorreu à posteriori do certame licitatório que resolveram mudar o sistema. O fato, inegável, é que quem perdeu, ganhou. E quem entrou no certame e ganhou, perdeu o serviço”, disse.

Segundo o superintendente Wantuil Teixeira, ao decidir implantar o omnichannel, a Cemig realizou duas chamadas públicas, em junho e agosto de 2020. Quatorze empresas manifestaram interesse, mas nenhuma apresentou uma proposta. A Cemig, então, abriu conversas com seis empresas, das quais duas manifestaram interesse. Após análise técnica, disse, foi feita a escolha pela IBM.

“O contrato assinado pela IBM foi no dia 12 fevereiro de 2021. O contrato com a AeC expirava no dia 28 de fevereiro. Houve a necessidade de subcontratar esse serviço porque era inviável a empresa assumir toda uma operação de call center em 15, 16 dias”, afirmou o superintendente

O deputado Zé Guilherme (PP), integrante da base do governo, considerou as explicações satisfatórias e não viu ilegalidade.

“Definitivamente, não há nenhuma irregularidade na contratação da IBM. Foi aberto processo licitatório e não apareceu empresa nenhuma, foi aberto uma segunda vez, também não apareceu empresa nenhuma. E aí sim se iniciou um processo de escolha das empresas especializadas. Houve uma concorrência e chegou-se à conclusão que a IBM era a melhor empresa para desenvolver esse projeto”, disse.

Já o vice-presidente da CPI, Professor Cleiton (PSB), da oposição, avalia que há fortes indícios de favorecimento no contrato, que, segundo ele, é o mais longo da história da Cemig. 

“É um contrato que mostra claramente para nós que houve favorecimento, com todo respeito à memória do senhor Cassio Azevedo”, disse. “Tentam dar uma máscara de legalidade. Mas nem tudo que é legal é moral”, disse.

A deputada Beatriz Cerqueira (PT), também da oposição, avaliou que não houve um procedimento de licitação e concorrência como demanda a legislação e ressaltou que tanto o início da contratação da IBM como a decisão final partiram do Conselho de Administração da Cemig, cuja maioria dos membros é indicado pelo governo.

"Não há evolução na gestão da empresa quando a diretoria aprova o início do processo de inaplibicabilidade de licitar, depois o diretor jurídico emite o parecer, e, por fim, a diretoria decide a contratação. É a diretoria por ela mesma", afirmou a deputada.

Em nota (confira a íntegra ao final do texto), a AeC disse que "todos os contratos e serviços prestados ao longo de mais de uma década para a Cemig foram pautados pela legalidade, idoneidade e pela absoluta transparência” e reforçou seu compromisso "em colaborar com toda e qualquer apuração que demande sua participação"

Contrato será vantajoso financeiramente para a Cemig, argumenta superintendente

O superintendente Wantuil Teixeira disse que o contrato com a IBM foi vantajoso do ponto de vista financeiro e que o período de 10 anos é justificado porque a melhora no relacionamento com o cliente faz parte do planejamento estratégico da Cemig, que vai de 2021 a 2030. 

Segundo ele, antes de unificar o atendimento no modelo omnichannel, a Cemig tinha 14 contratos — parte deles ainda está em vigor — cujo custo anual total gira em torno de R$ 155 milhões anuais.

A IBM foi contratada por 10 anos ao custo de R$ 1,1 bi, ou seja, com preço médio anual de R$ 110 milhões, o que, segundo ele, gerará uma economia de R$ 455 milhões ao longo de 10 anos para a Cemig.

“Nós tínhamos um contrato para atendimento telefônico. Um contrato para os postos de atendimento. Outro contrato para desenvolvimento de aplicativo e agência virtual. No total eram 14 contratos, porém não integrados. Essa não integração levava a muitas reclamações dos clientes”, disse Wantuil Teixeira

Cemig diz que fez "ampla consulta ao mercado" antes de parceria com a IBM

A Cemig informou, em nota, que antes de fechar a parceria com a IBM, realizou uma ampla consulta ao mercado.

" [...] Com a realização de dois Procedimentos de Manifestação de Interesse (PMI) e a opção pela modalidade denominada oportunidade de  negócio, com a seleção final validada por um comitê técnico composto por funcionários das principais áreas da companhia e com aprovação unânime da Diretoria Executiva e do Conselho de Administração", informou a empresa.

A Cemig também argumentou que não deu a ordem de início de serviço para a Audac devido à chegada da pandemia e que, depois, desistiu da contratação devido ao projeto de atendimento integrado ao cliente.

"Sobre a licitação para a empresa de call center, não foi dada autorização para início do serviço já que no período previsto para isso, em março de 2020, houve o início da pandemia de Covid-19 e do isolamento social. Assim, a transição de fornecedor e treinamento presencial subsequente gerariam riscos a funcionários naquele momento", justificou a estatal mineira.

"Posteriormente, a Cemig desistiu da contratação, já que decidiu implantar o Projeto Cliente +, unificando os atendimentos por meio da parceria com a IBM e fortalecendo seu ambiente digital, necessidade reforçada pela própria pandemia", afirma a Cemig.

Confira a nota da Cemig na íntegra:

"O depoimento do Sr. Wantuil Dionísio Teixeira reafirmou os termos da parceria realizada entre a Cemig e a IBM, no sentido de melhorar o atendimento ao cliente da empresa. A IBM é a parceira estratégica da Cemig no Projeto Cliente +, que busca melhorar e oferecer um atendimento revolucionário e de excelência aos 8,7 milhões de clientes da Cemig. O escopo é a integração de todos os canais de atendimento em uma única plataforma (omnichannel), com o uso de inteligência artificial e de todas as funcionalidades para um atendimento rápido e de fácil uso para o cliente.

A parceria com a IBM foi precedida de ampla consulta ao mercado, com a realização de dois Procedimentos de Manifestação de Interesse (PMI) e a opção pela modalidade denominada oportunidade de  negócio, com a seleção final validada por um comitê técnico composto por funcionários das principais áreas da companhia e com aprovação unânime da Diretoria Executiva e do Conselho de Administração.

O custo com essa parceria é inferior ao custo somado dos 14 fornecedores que prestavam serviços de atendimento ao cliente na Cemig e cuidavam de diferentes canais (call center, whatsapp, site, agências físicas, totens e etc). O Projeto Cliente + remunera por resolução no atendimento, não por tempo de atendimento. Essa é uma mudança que beneficia os clientes e reduz custos. O programa estará completamente implantado em breve.

A Cemig reafirma que essa parceria estratégica irá revolucionar o atendimento aos seus clientes, assim como a execução do maior programa de investimentos da história da companhia, no valor de R$22,5 bilhões de 2021 a 2025. A Cemig esclarece ainda que a IBM é referência mundial em tecnologia, inteligência artificial e soluções digitais.

Sobre a licitação para a empresa de call center, não foi dada autorização para início do serviço já que no período previsto para isso, em março de 2020, houve o início da pandemia de Covid-19 e do isolamento social. Assim, a transição de fornecedor e treinamento presencial subsequente gerariam riscos a funcionários naquele momento. Posteriormente, a Cemig desistiu da contratação, já que decidiu implantar o Projeto Cliente +, unificando os atendimentos por meio da parceria com a IBM e fortalecendo seu ambiente digital, necessidade reforçada pela própria pandemia."

Nota na íntegra da AeC:

"A AeC atua há quase 30 anos no mercado, tendo prestado serviços para centenas de empresas, e esclarece que todos os contratos e serviços prestados ao longo de mais de uma década para a Cemig foram pautados pela legalidade, idoneidade e pela absoluta transparência, gerando emprego e renda para o município de Belo Horizonte.

A empresa reafirma seu compromisso em colaborar com toda e qualquer apuração que demande sua participação e reitera que todas as suas relações institucionais e comerciais sempre se nortearam pela ética e pelo conjunto das melhores práticas de integridade e compliance."