A programação oficial do Carnaval de Belo Horizonte continua até o dia 18 de fevereiro, e continua também a disputa entre a prefeitura da capital e o governo de Minas Gerais sobre quem vai levar o bônus político pelo sucesso da festa. Entre sexta-feira (9) e terça-feira (13), 5,5 milhões de pessoas passaram por dezenas de blocos nas nove regionais da cidade – além de 6,5 milhões de foliões que curtiram a festa no interior –, segundo balanço divulgado ontem pelo Executivo estadual.
Além de uma comitiva composta por grande parte do secretariado, o próprio governador Romeu Zema (Novo) participou ontem da apresentação do balanço, em que destacou a realização do “melhor Carnaval da história” de Minas Gerais. Durante o pronunciamento, ele também disse que a folia momesca “é uma festa cultural popular”, e, por esse motivo, “é obrigação de todo gestor público” apoiá-la.
“Há cinco anos, quando assumi o governo, percebi claramente que muito do que se faz, seja por meio de aquisições ou da prestação de serviços, não tem o intuito de oferecer o melhor ao público, mas de privilegiar alguns poderosos. Mas neste Carnaval nós fizemos o que é melhor, não contratamos A, B ou C, não compramos de A, B ou C, de quem tem alguma influência, fizemos aquilo que é bom”, afirmou Zema.
Apesar das críticas, o governador não esteve na capital durante os dias da folia em 2024, assim como nos outros cinco anos em que ele esteve à frente do governo de Minas.
A aparição na hora de mostrar os resultados, entretanto, pode ser mais um capítulo do confronto travado nas últimas semanas com o prefeito Fuad Noman (PSD) para “colher os louros” daquela que já vem sendo considerada a maior comemoração carnavalesca do país.
Possivelmente visando ao mesmo objetivo, Fuad já havia divulgado um balanço parcial na terça-feira (13), no qual relembrou as ações da prefeitura e fez projeções para o futuro. “O Carnaval ainda não acabou. Semana que vem nós vamos sentar com a equipe toda, fazer uma avaliação mais detalhada do que se pode melhorar, porque o objetivo é crescer todo ano. Mas, quando se veem revistas inglesas falando do Carnaval de Belo Horizonte com um destaque importante, quer dizer que está dando certo”, avaliou o prefeito na ocasião.
Apesar do “cabo de guerra” durante a semana, a competição começou ainda no pré-Carnaval. Em meados de janeiro, Fuad provocou o governo com uma publicação nas redes sociais, dizendo que mesmo “quem nunca tinha ajudado queria aproveitar”, referindo-se às inéditas ações do Executivo estadual para a folia na capital mineira.
Na mesma época, o vice-governador, Mateus Simões (Novo), justificou os investimentos de R$ 4,5 milhões do Estado no sistema de sonorização de alguns blocos como uma estratégia do governo para não deixar o Carnaval se “apequenar” em Belo Horizonte. Segundo ele, a festa se afastou da prefeitura, o que atraiu um número menor de foliões e diminuiu as arrecadações em 2023.
Briga por ‘bônus’ não é novidade, diz professor
As disputas políticas em torno de bens culturais não são novidade, como explica o professor e produtor cultural Bruno Viveiros, doutor em história pela UFMG. Apesar das diversas tentativas, ele afirma que a festa não tem dono.
“São milhões de pessoas vindo, o Carnaval se torna uma experiência de construção, de vivência popular da cidade, que atrai a atenção de empresas, de patrocínio e também do poder público. Aí está a grande questão que vivemos hoje, existe um movimento de atração, tem público, a rede de hotéis, os patrocínios, bares, toda essa movimentação, mas também continua o movimento dos blocos de bairro, dos blocos da periferia, e uma coisa não exclui a outra”, diz o professor.
Viveiros ainda acrescenta que é possível conciliar os dois universos, sem necessidade de intervenções institucionais, sejam elas do governo municipal ou do estadual. “Podemos ter o Carnaval com grandes patrocínios, com blocos, com trio elétrico na praça; podemos ter os blocos de rua com a bandinha, com bateria; podemos ter o Carnaval nos grandes salões requintados da elite econômica; se faz de tudo no Carnaval”, concluiu o historiador.
Quem também concorda que política e Carnaval são duas faces de uma mesma moeda é Rodrigo “Boi”, regente e um dos organizadores do Juventude Bronzeada, um dos maiores blocos de rua de Belo Horizonte. Para ele, “embora festivo, o Carnaval sempre foi de muita resistência de vários povos e várias culturas”. No desfile, estandartes do bloco exibiram as mensagens “Fora, Zema” e “Não à privatização da Cemig”.