ELEIÇÕES NA VENEZUELA

Lula diz que é 'grave' opositora de Maduro não conseguir registro de candidatura

Petista poupa críticas a Nicolás Maduro e afirma que Brasil vai encaminhar observadores internacionais para eleições do dia 28 de julho

Por Manuel Marçal
Publicado em 28 de março de 2024 | 16:07
 
 
Presidente Lula e o presidente francês Emmanuel Macron faz aceno ao público no Palácio do Planalto, em Brasília Foto: Fotos: Ricardo Stuckert/PR Secom 28.03.2024

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse nesta quinta-feira (28) ser “grave” o fato do principal nome de oposição da Venezuela, Corina Yori, não ter conseguido registrar a candidatura à presidente da República. Ele afirmou ainda que ficou “surpreso” com a situação. O presidente se encontrou recentemente com Nicolás Maduro, de quem é aliado, e defendeu um pleito eleitoral democrático no país vizinho. 
 
“O dado concreto é que não tem explicação. Não tem explicação jurídica, política, você impedir um adversário de ser candidato. Aqui no Brasil todo mundo sabe que todos os adversários serão tratados nas mesmas condições. Aqui é proibido proibir. A não ser que tenha uma punição judicial e que essa punição garanta o direito de defesa das chamadas pessoas prejudicadas”, afirmou o petista. 
 
A declaração ocorreu durante coletiva de imprensa no Palácio do Planalto por ocasião do encerramento da visita do presidente francês, Emmanuel Macron, ao Brasil. 
 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta quinta-feira (28) que ficou “surpreso” e viu como “grave” o fato da principal candidata de oposição da Venezuela não ter conseguido registrar a candidatura à presidente da República para concorrer ao pleito eleitoral do… pic.twitter.com/Eie3xeZyU8

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Corina Yoris era a principal candidata de oposição da Venezuela ao regime de Nicolás Maduro. Ela não conseguiu registrar candidatura, após o sistema eletrônico venezuelano apresentar instabilidade. Ela também foi proibida de fazer a inscrição de forma presencial. Impedindo opositores de concorrerem, Maduro deve se reeleger para um terceiro mandato e chegar a 18 anos no poder.
 
Essa situação levou o Palácio do Itamaraty a se pronunciar e a dizer que acompanhava "com preocupação" as eleições na nação vizinha. Esse comunicado do governo brasileiro gerou incômodo em Caracas.  Segundo posicionamento do Ministério do Poder Popular para as Relações Exteriores da República Bolivariana da Venezuela, a nota foi "cinzenta e intervencionista" e parecia “ter sido ditada pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, no qual são emitidos comentários carregados de profundo desconhecimento e ignorância sobre a realidade política na Venezuela".
 
No início deste mês, Lula chegou a dizer que estava “otimista” com o fato das eleições da Venezuela terem sido marcadas para o dia 28 de julho. A data, no entanto, coincide com o aniversário de nascimento do ex-ditador Hugo Chávez, que governou o país por 14 anos. Ainda naquela ocasião, Lula evitou comentar ao ser questionado se acreditava que a eleição seria democrática, uma vez que vários candidatos da oposição tiveram os direitos políticos cassados. 
 
O petista, então, declarou que o mesmo ocorreu com ele no Brasil no pleito de 2018 e que não ficou chorando e que indicou outra pessoa para disputar em seu lugar. Nesta quinta-feira, Lula voltou a lembrar que não pôde concorrer ao pleito de 2018, mas que considera como "passo positivo" o fato de Maria Corina Machado - que teve os direitos cassados pela Justiça venezuelana - ter indicado uma substituta em seu lugar, a filósofa e professora universitária, Corina Yoris, de 80 anos.

Lula evitou críticas diretas a Maduro 

Ainda assim, o petista evitou criticar diretamente Nicolás Maduro e lembrou que aconselhou o líder venezuelano sobre a importância de fazer um pleito democrático. 
 
"O fato de uma candidata ter sido proibida pela Justiça, não ter conseguido se candidatar, não era o agravante. Vocês não podem se esquecer que aqui no Brasil eu fui proibido de ser candidato, quando eu fui apontado como primeiro colocado em todas as pesquisas de opinião. O que fiz? Indiquei outro candidato. Perdemos as eleições, mas fez parte do jogo democrático" narrou. 
 
"Então eu disse para o Maduro: garanta que a eleição seja mais democrática, porque é importante a Venezuela voltar ao mundo com normalidade", frisou.
 
O petista disse ainda que o Brasil vai encaminhar observadores para as eleições no país vizinho. “Não quero nada melhor e nem pior. Eu quero que as eleições sejam feitas igual nós fazemos aqui no Brasil, com a participação de todos. Quem quiser participar, participa. Quem perder, chora. Quem ganhar, sorri; E, assim, a democracia continua”, concluiu o petista. 
 
Emmanuel Macron, que falou logo após o presidente Lula, disse concordar com o posicionamento do brasileiro. No entanto, ele foi mais direto e declarou que não se pode considerar "como democrático" as eleições na Venezuela diante de tudo o que está acontecendo. Macron defendeu que todos os opositores que tiveram candidatura barrada sejam reintegrados.
 
"Concordo com tudo que o presidente Lula disse e condenamos firmemente terem retirado a candidata muito boa deste processo", arrematou o líder francês. Por fim, ele pediu cautela: "Não nos desesperemos. A situação é grave e piorou com a última decisão".  

Acordo Mercosul-UE

Após críticas declaradas dos dois presidentes sobre os termos do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, que é negociado há mais de 20 anos, Lula colocou panos quentes ao dizer que a briga sobre o tratado não é entre Brasil e França, uma vez que o acordo não se restringe às duas nações, mas sim entre os blocos. 

“O Brasil não está negociando com a França. O Mercosul está negociando com a União Europeia. Não é um acordo bilateral entre Brasil e França, é um acordo comercial entre dois conjuntos de países, de um lado a União Europeia e do outro o Mercosul. O Mercosul está conversando com a União Europeia, obviamente que depois da decisão da União Europeia, se o Macron tiver que brigar com alguém não é com o Brasil, é com a União Europeia”, declarou. 

Enquanto Lula tem pressa para fechar a parceria, Macron é opositor. Nesta quarta-feira (27), após se reunir com empresários e ministros brasileiros em São Paulo, o presidente francês reafirmou ser contra o acordo. Segundo ele, o atual tratado comercial está sendo negociado há mais de 20 anos e não foi atualizado, prevendo, por exemplo, temas como o clima. Para ele, o texto “precisa ser renegociado do zero”.

“O Mercosul é um péssimo acordo como ele está sendo negociado agora. Esse acordo foi negociado há 20 anos. Eu não defendo esse acordo. Não é o que queremos”, disse. “Deixemos de lado um acordo de 20 anos atrás e construamos um novo acordo, mais responsável, prevendo questões como o clima e a reciprocidade”, completou.

Macron elogia Lula pela defesa da democracia

Ao discursar no Palácio do Planalto, Emmanuel Macron elogiou a atitude do presidente Lula de defender a democracia diante dos atos do dia 8 de janeiro. O líder francês lembrou o episódio de depredação na Praça dos Três Poderes, em Brasília, e chamou os vândalos de "inimigos da democracia". 

“A maneira com que conseguiu reconstituir os equilíbrios da democracia e levar a cabo esse debate internacional significa muitíssimo para nós”. Por fim, Macron agradeceu o presidente brasileiro pelo "combate que travou contra inimigos da democracia e pela maneira maravilhosa que pôde restaurar a democracia no Brasil". 

Medalha ao presidente da França

O presidente Lula condecorou Emmanuel Macron com a maior comenda do Estado brasileiro concedida apenas a cidadãos estrangeiros. O francês foi agraciado com a Grande Medalha da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul. O líder europeu ficou três dias no Brasil, tendo passado por Belém (PA), Itaguaí (RJ), São Paulo (SP) e Brasília (DF). 

Do lado da França, Emmanuel Macron condecorou a primeira-dama, Janja da Silva, com a Insígnia da Ordem Nacional da Legião de Honra, no grau de oficial do governo francês. Macron explicou que Lula já possui essa titulação e, por isso, a honraria seria concedida apenas à Janja.