Ouça

Kalil diz que empresários de ônibus pagariam defesa de ex-presidente da BHTrans

Segundo Alberto Lage, Kalil declarou fato a ele em reunião realizada em agosto. Concessionárias desembolsariam R$ 1 milhão para contratar advogados. Um deles, Hermes Vilchez Guerrero, inclusive, foi designado, nesta quinta-feira (21), por Kalil, para compor como titular o Conselho de Ética Pública da Prefeitura de Belo Horizonte

Por O Tempo
Publicado em 21 de outubro de 2021 | 11:02
 
 
Bouzada, Kalil e Lage Foto: Uarlen Valério - Douglas Magno - Bernardo Dias/CMBH

O prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), disse em uma gravação que empresários ligados às empresas de transporte público da cidade pagariam R$ 1 milhão na contratação de advogados. Segundo o ex-chefe de gabinete do prefeito, Alberto Lage, os advogados atuariam na defesa do ex-presidente da BHTrans, Célio Bouzada. 

O próprio Lage divulgou o áudio durante uma acareação entre ele e o ex-presidente da BHTrans, Célio Bouzada, realizada nesta quinta-feira (21) na CPI da Covid-19 na Câmara Municipal. 

“Eu estou enviando duas mensagens de áudio do prefeito Alexandre Kalil que me instruiu de que o senhor Hermes Vilchez Guerrero seria pago por empresários de ônibus para fazer a defesa do senhor Célio”, disse Alberto Lage aos vereadores na reunião.

Procuado, Hermes Guerrero disse que não conhece Alberto Lage e que foi contratado por Célio Bouzada e que recebe o pagamento dele.

Segundo o ex-chefe de gabinete, a gravação é de uma reunião no dia 18 de agosto onde Alexandre Kalil diz que ele não deveria depor contra Bouzada na CPI da BHTrans porque os advogados contratados pelos empresários de ônibus o processariam na Justiça.

“O que você ganha se você for lá e esculachar o [intelegível]? Você foi mal assessorado, não gosta, não sei o que. Vai chegar para ele: vem cá amigo, vem cá no tribunal e fala como você foi mal assessorado. E o cara tá preparando uma peça dessa desse tamanho, para pagar um milhão de reais para advogado. Que deve ser o Joel, o caralho, o Marcelo… como chama aqueles irmãos que mexem com… Lessa, entendeu? Eles rateiam lá, dá cem mil para cada um”, diz Kalil, na gravação.

De acordo com o ex-chefe de gabinete, os nomes citados pelo prefeito na gravação são Joel Paschoalini, ex-presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (SetraBH); o empresário Marcelo Carvalho Santos, ligado ao grupo das empresas Rodopass e Trancid; e os irmãos Rubens e Robson Lessa, ligados à empresa Saritur.

Durante a acareação com Lage, Bouzada afirmou que desconhece o relato dos áudios encaminhados pelo ex-chefe de Gabinete de Kalil à CPI da Covid-19. "As pessoas que foram citadas nos áudios é que têm que se explicar. Eu tenho um contrato (com o advogado Hermes Vilchez Guerrero) e já paguei. Quero informar aos senhores que vou disponibilizar o contrato que eu fiz com o escritório do professor Hermes e os recibos que eu já paguei. Entre hoje e amanhã, faço chegar à presidência da comissão da Covid-19 o meu contrato e os meus recibos, que já paguei."

Já o SetraBH informou que o ex-presidente da entidade e os demais empresários citados "em nenhum momento tiveram qualquer relação ou qualquer envolvimento na contratação ou contato com a pessoa do advogado mencionado na divulgação do ex-secretário da Prefeitura de Belo Horizonte, Alberto Lage".

Contra o conselho de Kalil, Lage depôs à CPI da BHTrans no dia 26 de agosto como testemunha. Ele declarou aos vereadores que Célio Bouzada assessorou mal o prefeito e não defendeu o interesse público. 

Bouzada foi presidente da BHTrans no primeiro mandato de Kalil. Foi durante a gestão dele que a Prefeitura de Belo Horizonte antecipou R$ 220 milhões em vale-transporte às empresas de ônibus para amenizar o impacto da queda de receita das concessionárias durante a pandemia. 

No depoimento no dia 26 de agosto, Lage apresentou documentos que demonstravam que a iniciativa de conceder o adiantamento às empresas partiu da BHTrans. Vereadores da CPI da BHTrans afirmam que o repasse foi ilegal.

Kalil conversou com Gabriel Azevedo e Célio Bouzada sobre os advogados

Em outra gravação, Kalil diz que o presidente da CPI, Gabriel Azevedo, ligou “cagado” para ele quando soube que Célio Bouzada entrou em contato com o advogado Hermes Vilchez Guerrero.

“Quando ele soube que o Hermes estava sendo consultado pelo Célio, pelo outro lá, como ele chama? [...] Daniel. Ele me ligou cagado. Ele me ligou completamente cagado. Uai, Gabriel, os caras estão se defendendo. ‘Não, você tem que falar com o Célio, tal e tal’”, relata Kalil.

Segundo Alberto Lage, a conversa aborda se Célio Bouzada e sua defesa entrariam contra ele na Justiça.

“Aí eu liguei pro Célio e falei: Célio, você vai entrar? Porque, porra, dei a palavra pro Gabriel aqui que você não iria entrar, que você não iria voltar lá. Ele falou ‘não, prefeito, a única coisa que eu quero é não voltar lá. Ele pode fazer o que quiser’. Agora, você tá quebrando a minha palavra, você me usa? ‘Não, prefeito, não estou, não vou entrar. Pode falar com ele. Eu estou me precavendo do que vai vir’”, conta Kalil, relatando uma conversa com o ex-presidente da BHTrans.

Em seguida, Kalil diz que Gabriel Azevedo o questionou sobre quem estava pagando o advogado Hermes Guerrero. “Não sei, eu não sou, Gabriel. É meu amigo pessoal, inclusive. Fui na posse dele”, diz o prefeito. 

Nesse momento, Alberto Lage diz que a posse de Hermes Guerrero a que Kalil se refere é como diretor da Faculdade de Direito da UFMG

“Porra, atleticano doente. Foi meu advogado, junto com o Marcelo Leonardo. Os dois me defendem 0800 [de graça]. Processo de imposto, o caralho, não tem nada, entendeu? Então, falei: tão pagando, amigo. Os caras lá tão babando em você [Gabriel Azevedo]. Ou ele tá achando que vai ficar assim, que ele vai fazer coercitiva no Marcelo? Ele tá achando que é o Omar Aziz, que ele é senador?”, diz Kalil na gravação.

Guerrero é designado para Conselho de Ética

Hermes Vilchez Guerrero, inclusive, foi designado, nesta quinta-feira (21), por Kalil, para compor como titular o Conselho de Ética Pública da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). A indicação, publicada no Diário Oficial do Município, já tem efeito a partir da data de publicação. O advogado do ex-presidente da BH Trans, Célio Bouzada, substitui Misabel Derzi. A dispensa da agora ex-conselheira foi oficializada no mesmo ato. A mudança ocorre uma semana após o arquivamento das denúncias do ex-chefe de Gabinete, Alberto Lage, contra Adalclever Lopes.

Misabel foi a única conselheira ausente da reunião do Conselho de Ética que arquivou as denúncias contra Adalclever. A ata do encontro, publicada na edição do Diário Oficial do Município de 14 de outubro, é assinada apenas pelo relator, Marcelo Leonardo, bem como pelo presidente, Rodolfo Gropen, e pelo conselheiro Rômulo de Carvalho Ferraz. O TEMPO questionou a PBH a respeito da designação de Guerrero, bem como a dispensa de Misabel. Assim que esclarecido, será acrescentado à reportagem.

Questionado, Hermes Guerrero declarou apenas que a indicação para o Conselho de Ética não é remunerada.

Conforme registrado, Marcos Leonardo concluiu pelo arquivamento do processo por “fragilidade dos elementos de convicção apresentados pelo denunciante (Alberto Lage)”. “Nem no áudio, nem nos diálogos apresentados, há qualquer prova de que o secretário Adalclever Lopes tenha, concretamente, feito qualquer pedido com constrangimento para realização de pesquisa eleitoral ao publicitário Cacá Moreno. No áudio, Adalclever fala para Alberto se dirigir a Cacá, mas Alberto Lage negou ter feito qualquer pedido dessa natureza ao publicitário”, concluiu Leonardo.

Ainda conforme o voto do relator, Cacá Moreno negou, durante o depoimento, ter sido constrangido, “de qualquer forma”, por Adalclever. “E, mais, afirmou, sobre o áudio juntado, que nem Alberto Lage, nem Adalclever Lopes lhe fizeram qualquer pedido para realizar pesquisa em Minas Gerais no corrente ano. (...) (Adalclever) negou haver pedido a Cacá Moreno para fazer pesquisa eleitoral de âmbito estadual, o que foi confirmado por ele. Adalclever disse que a secretária Adriana Branco, da área de Comunicação Social, já havia esclarecido que a Prefeitura somente pode fazer pesquisa no Município de Belo Horizonte.”

Matéria atualizada às 16h03 para incluir os posicionamentos de Célio Bouzada e do SetraBH