Em busca do caminho de Ulisses, cuja jornada de dez anos de volta para casa consistiu numa década de desastres, das planícies queimadas e manchadas de sangue à ilha de Ítaca, deixei minha típica viagem turística à Grécia - que, durante duas semanas, pulou de ilha em ilha no sudeste da Peloponésia - e andei rumo ao caminho traçado por ele, sem ônibus, sem trens ou avião.
Eu estava em Cape Meleas - o último local que o personagem de Homero reconheceu antes que os ventos do norte o levassem às terras míticas cheias de monstros - e, tudo o que eu precisava fazer era pegar um ônibus para o porto de Patras. De lá, uma balsa me levaria, depois de longas horas, a Ítaca, o local que Ulisses chamava de casa.
Em Neápolis, porém, não havia ônibus até a manhã seguinte, e eu não tinha escolha a não ser passar a noite naquela alegre cidade costeira. Dois dias atrás eu não teria me importado. Na realidade, nos últimos dez dias eu estava encantado com os caprichos dos horários dos ônibus e das balsas, mas meu voo de Atenas para Nova York - casa - estava programada para daí a dois dias, então, esse atraso era insuportável.
Enquanto contava a minha decepção em um restaurante à beira-mar, notei algo diferente: era uma bicicleta do século XIX, com a roda da frente enorme e a de trás pequena. O dono era Jim, um cabeleireiro de 20 e poucos anos de Atenas, sentado ao lado de sua namorada, Chara, professora de escola primária. Eram um belo casal. Sorriram para mim e me perguntaram como eu havia parado naquele lugar.
Expliquei que tinha vindo de Troia, e precisava chegar a Ítaca, como Ulisses, sem mapa, sem hotel, sem internet e sem guia turístico.
E foi assim que começou a história que venho contando - e acrescentando - da minha odisseia que começou na Turquia, em Canakkale, onde ficava a antiga cidade de Troia, até Ítaca.
Troia foi, tanto para mim quanto para Ulisses, apenas o ponto de partida. Meu plano não era seguir a rota precisa de Ulisses - dizem que o caminho foi traçado até Gibraltar -, mas buscar parte de suas pegadas e tentar entrar na sua psique enquanto tentou, e falhou, e tentou novamente chegar a Ítaca, que ficava a apenas cerca de 550 km de distância.
Talvez, esse seja o termo incorreto. Ulisses não tinha psique - pelo menos não da forma pós-moderna que utilizamos o termo. Uma das peças fundadoras da literatura ocidental pode ser uma história de viagem sobre ficar perdido. Mas, fora a imagem de coração partido de Ulisses, chorando na costa das ilhas de Calipso, Homero raramente descreve o desespero e a desconexão de seu herói.