Minas Santa

Tarsila do Amaral e Yara Tupynambá foram homenageadas com tapetes devocionais

Neste domingo (31/3), os famosos caminhos de serragens coloriram a procissão da Ressurreição e fecharam a Semana Santa em Ouro Preto

Por Paulo Campos
Publicado em 30 de março de 2024 | 10:07
 
 
O tapete devocional de Rodrigo Câmara no Largo do Rosário, inspirado em obra de Yara Tupinambá Foto: Rodrigo Câmara/Divulgação

Uma verdadeira celebração em torno da fé, por meio de uma expressão artística popular que atravessa séculos. A confecção dos tapetes devocionais movimenta a Semana Santa em diversas cidades mineiras. Em Ouro Preto, neste domingo (31/3), as ruas foram coloridas de forma colaborativa, como manda uma tradição secular. A comunidade se mobilizou durante toda a noite até a madrugada, porque no domingo, às 7h da manhã, aconteceu a procissão da Ressurreição. Após a missa, o cortejo saiu da Basílica de Nossa Senhora do Pilar, conduzindo o Santíssimo Sacramento até o Santuário de Nossa Senhora da Conceição.

A Fundação de Arte de Ouro Preto (Faop), por exemplo, é uma das entidades que contribuiu com a preservação do ofício, ao montar tapetes em dois pontos do percurso da procissão. Na rua Getúlio Vargas, em frente à Galeria de Arte Nello Nuno, o tapete foi inspirado no centenário da visita dos modernistas a Ouro Preto. O desenho ganhou elementos que remetem às obras da artista Tarsila do Amaral, em especial, a partir da temática religiosa. Outro tapete foi montado no bairro Antônio Dias, que abriga o Núcleo de Arte e Ofícios da Faop. “É com alegria que a Faop, em mais um ano, contribui com essa celebração, que representa tão bem a arte e a fé em nosso Estado. Como todos os anos, estamos juntos dos ouro-pretanos nessa ação, que já se confunde com a história de nossa instituição na cidade", diz Jefferson da Fonseca, presidente da entidade.

No largo do Rosário, o artista plástico Rodrigo Câmara também confeccionou um tapete em homenagem à Yara Tupynambá. O desenho foi retirado de um dos cadernos de estudos da artista. “Por tradição familiar, produzo tapetes devocionais em serragem colorida desde os 5 anos de idade. De forma efêmera, os tapetes de Páscoa, são produzidos na noite do sábado de Aleluia e seguem pela madrugada. A procissão passa logo cedo no domingo de Páscoa”, conta. No largo do Rosário, Câmara demorou, em média, oito horas para a produção do tapete. “A prefeitura fornece serragem já tingida em cores básicas, mas eu mesmo faço o tingimento da serragem que uso em meus projetos. Serragem, palha de arroz, borra de café, enfim, materiais que podem ser utilizados como adubo e preparação de solo. Os jardins e as hortas agradecem”, afirma.

Os ouro-pretanos estão preservando uma tradição que começou em 1733. Na antiga Vila Rica, no auge do período do ouro, a Igreja Católica promoveu o Triunfo Eucarístico, festa que marcou a reinauguração da matriz do Pilar, hoje intitulada Basílica do Pilar. Janelas, sacadas e ruas foram enfeitadas para o traslado do Santíssimo Sacramento das igrejas do Rosário para a do Pilar. Ali nascia a tradição dos tapetes de serragem em Ouro Preto, chamados também de “Tapetes Devocionais”.  A distribuição da serragem fica por conta da prefeitura, que realiza o tingimento da serragem de madeira, bem como preparo de outros materiais para a confecção dos tapetes, como cal, farinha de trigo, pó de café e flores secas. O tingimento normalmente é feito com pigmentos naturais para não interferir nas calçadas e garantir a preservação do patrimônio.

O Domingo da Ressurreição celebra a ressurreição de Jesus ocorrida no terceiro dia após sua crucificação no calvário efecha a programação da Semana Santa. O trajeto do cortejo corta boa parte da cidade, passando por diversos pontos turísticos. Nas sacadas dos casarões, os moradores estenderam toalhas de cor branca como sinal de respeito e devoção. A procissão saiu da basílica do Pilar, sobe a rua Conselheiro Santana até a Ponte Seca, rua Cônego Simões, rua Getúlio Vargas, Largo do Rosário, praça Silviano Brandão, rua São José, rua Conde de Bobadela, mais conhecida como rua Direita, Praça Tiradentes, Largo do Coimbra, rua Amália Bernhaus, rua São Francisco de Assis, rua Bernardo Vasconcelos, rua do Aleijadinho e rua da Conceição, finalizando na igreja Matriz da Conceição.

A confecção dos tapetes devocionais para o trajeto extrapola o caráter religioso, devido à sua concepção artística e cultural. Cesar Teixeira, da Assessoria Técnica de Promoção e Extensão da Faop, ressalta que uma das primeiras ações da fundação, criada há 55 anos, foi o resgate dessa tradição, que estava enfraquecida na cidade. A partir de então a Faop vem fomentando o ofício. “Além de contribuir com a confecção em datas religiosas, a instituição promove cursos, oficinas e workshops sobre a atividade em várias partes do Estado”, destaca. "A cidade está bem cheia neste feriado da Semana Santa, principalmente neste sábado e domingo. Estamos trabalhando com a capacidade de 80% da capacidade hoteleira. Esperamos receber cerca de 30 turistas nos dois dias", afirma Flávio Malta, secretário Municipal de Cultura e Turismo.