Após buscar reduzir as tensões nucleares provocadas por Donald Trump antes do fim do prazo dado pelo americano para Vladimir Putin aceitar uma trégua na Ucrânia, o governo russo divulgou no fim desta segunda (4) uma medida na direção contrária.
Segundo o Ministério das Relações Exteriores, Moscou abandonou a moratória sobre o emprego de mísseis de curto e de médio alcance porque os americanos, que deixaram o tratado que lidava com o tema em 2019, estão implementando tais sistemas na Europa e na Ásia-Pacífico - no ano passado, os americanos falaram em operar essas armas em 2026 na Alemanha.
A decisão ocorre após Trump dizer que posicionou submarinos nucleares, sem dizer se armados com mísseis atômicos, depois que o ex-presidente russo Dmitri Medvedev sugeriu que seu país tinha capacidades de ataque que sobreviveriam a um primeiro assalto americano.
Na prática, nada mudou tanto. Foi o mesmo Trump, no primeiro mandato, que retirou os Estados Unidos do INF (sigla inglesa para Tratado de Forças Nucleares Intermediárias na Europa). O diploma foi 1 dos 3 que garantiram o arcabouço de segurança mútuo do fim da Guerra Fria.
Texto de 1987, o INF ele proibia soviéticos e americanos de implantar nos países europeus mísseis com alcance de 550 km (curto) até 5.500 km (intermediário). Era uma resposta ao risco de guerra de 1983, quando entre outros incidentes Washington havia decidido colocar modelos Pershing-2 nos aliados da Otan, gerando pânico em Moscou.
Trump alegava que os russos já desenvolviam mísseis do tipo em 2019. Na prática, por evidente o tratado era obsoleto: ambos os lados têm capacidades para se dizimar com os grandes mísseis intercontinentais à disposição. Mas o simbolismo era grande.
A nota da chancelaria russa é sucinta, e não cita a Ucrânia. Na sexta (8), expira o prazo dado por Trump em um ultimato rejeitado pelo Kremlin. Dali em diante, a promessa é de novas sanções que afetarão países que fazem negócios com petróleo e derivados russos, como China, Índia, Turquia e Brasil.
Na quarta (6), o enviado de Trump para o conflito, Steve Witkoff, deve encontrar-se com Putin em Moscou. Mas a esperança de um acordo de última hora é mínimo.
Coube ao mesmo Medvedev, que não se pronunciava desde o entrevero com Trump, comentar agressivamente a decisão russa. Ela é, disse, "resultado da política anti-Rússia dos países da Otan".
"Essa é a nova realidade que nossos oponentes terão de enfrentar. Esperem mais passos", escreveu no X o russo, que é o número 2 do Conselho de Segurança do país. Ele vocaliza anseios da linha-dura do governo, mas é visto como inócuo nos círculos do poder em Moscou.
Trump não concordou, ou o fez justamente porque era Medvedev e não Putin a queixar-se do ultimato, quando ameaçou a Rússia com submarinos na sexta (1º). Mais cedo, o Kremlin havia baixado a temperatura do embate, dizendo que não entraria na polêmica.
Com o fim da moratória, Putin poderá cumprir a promessa feita ao aliado belarrusso Aleksandr Lukachenko e instalar mísseis Orechnik no vizinho, que faz fronteira com três países da Otan.
Não que precise: a arma em tese tem alcance de mais de 5.000 km, embora pouco se saiba dela além do teste feito pelos russos contra a cidade ucraniana de Dnipro, em novembro passado. Desde então, Putin se gaba quando pode das capacidade do míssil, que foi desenhado para guerras nucleares e carrega ogivas independentes.
Elas nunca haviam sido vistas em combate no mundo, mas desde novembro não houve outros lançamentos comprovados. Com a degradação na relação EUA-Rússia, após a aproximação proposta por Trump a Putin, não será surpresa se o Kremlin decidir por uma demonstração pontual de força - caso não haja uma reviravolta e alguma acomodação.