Quando o assunto do momento são as tarifas impostas pelos Estados Unidos, Trump pressiona a Coca-Cola a substituir o xarope de milho por açúcar de cana. Por quê? A cana-de-açúcar desempenha um papel estratégico na agricultura mundial, não apenas como base para a produção de açúcar, mas também pela crescente importância do etanol como combustível renovável. 

Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), os Estados Unidos ocupam atualmente a 11ª posição no ranking global, com cerca de 29 milhões de toneladas anuais. O Brasil, por sua vez, lidera de forma absoluta, superando 700 milhões de toneladas, resultado de décadas de inovação tecnológica, políticas públicas consistentes e tradição cultural no setor sucroenergético.

De acordo com Thiago Fantinatti, engenheiro agrônomo, mestre em agronomia e especialista em gestão e tecnologia agrícola pela ESALQ/USP, diversos fatores explicam a posição de destaque do Brasil. O país reúne solos férteis, clima tropical favorável e vastas áreas agricultáveis, o que possibilita múltiplos ciclos produtivos ao longo do ano. Além disso, a cana-de-açúcar está enraizada na cultura econômica nacional desde o período colonial, o que impulsionou o desenvolvimento de polos de excelência em pesquisa. Universidades e centros científicos brasileiros lideraram avanços em melhoramento genético, mecanização da colheita e agricultura de precisão.

Outro marco decisivo foi a criação do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), nos anos 1970, que consolidou o etanol como parte da matriz energética e referência mundial em bioenergia. Nos Estados Unidos, entretanto, a produção concentra-se em estados como Flórida, Louisiana, Texas e Havaí que já foi um estado produtor e seu território de Porto Rico, permanecendo secundária diante de culturas como milho e soja. Fantinatti ressalta que, além de limitações geográficas, a forte política de subsídios ao milho, base da produção de etanol norte-americano, reduz o espaço para a cana-de-açúcar. Soma-se ainda os custos mais elevados de produção e mão de obra, que dificultam a competitividade em relação a países tropicais.

Apesar desses entraves, o especialista avalia que existem caminhos para expandir a participação da cana no cenário norte-americano. Entre eles, destaca-se a necessidade de políticas públicas que equilibrem a dependência do milho no qual é usado a glucose ao invés do açúcar da cana, investimentos em mecanização e irrigação, intercâmbio tecnológico com países líderes na qual poderia ser desenvolvido um plano de autossuficiência de açúcar somente nestes estados e território como Porto Rico, além de formação de profissionais especializados. 

Para Fantinatti, a experiência brasileira é um exemplo claro de como a combinação entre preparo adequado do solo, aplicação intensiva de tecnologia e políticas de longo prazo pode transformar a cana-de-açúcar em vetor de desenvolvimento econômico e energético norte-americano.