Centenas de milhares de muçulmanos terminam neste sábado a peregrinação anual à Meca, ou Hajj, em luto pela tragédia mais mortal dos últimos 25 anos que provocou uma enxurrada de críticas à Arábia Saudita.

As autoridades sauditas reviram neste sábado o balanço de vítimas, a 769 mortos e 934 feridos.

As autoridades sauditas, que têm recebido uma chuva de críticas pela gestão do episódio, ainda não divulgaram uma lista de vítimas por nacionalidade nem publicaram os resultados de suas investigações, enquanto muitos peregrinos sofrem tentando encontrar seus familiares, mortos ou vivos.

"Não dormimos, não comemos desde a tragédia. Estamos percorrendo a pé os hospitais", relata uma mulher que não tem notícias de seu irmão desaparecido. "Deixamos seu nome e foto nos hospitais", contou a peregrina. 

Cerca de 250 mortos seriam de origem estrangeira, segundo balanço preliminar. 

Últimos rituais

Desde o início da manhã, grupos de homens e mulheres se revezavam em Mina, perto de Meca, para cumprir com o último ritual, o lançamento de pedras contra três colunas que simbolizam o diabo, de acordo com a tradição muçulmana.

As forças de segurança conduziam a multidão. No mesmo local, na quinta-feira, um grande tumulto terminou na pior tragédia registrada durante o Hajj desde 1990.

O comandante das forças de segurança responsável pelo Hajj, o general Abdel Aziz al Suly, relatou a abertura de um inquérito que "vai levar tempo". Citado pela imprensa local, ele indicou que "submeterá um relatório completo e detalhado ao servidor das Duas Mesquitas Sagradas", o rei Salman, mas não indicou quando.

O Irã, que anunciou a morte de 136 de seus cidadãos no incidente, questionou a Arábia Saudita, seu rival regional, e exigiu participar na investigação.

Teerã convocou neste sábado seu representante na Arábia Saudita pela terceira vez em três dias e quer enviar ao país vizinho uma delegação liderada pelo ministro da Cultura, Ali Janati.

O primeiro vice-presidente iraniano, Es Hagh Khahanguiri, estimou que "países como o Irã, que sofreram muito, devem ter representantes na investigação". "Não há dúvidas quanto a má gestão e inexperiência dos responsáveis" do Hajj, acrescentou.

 Fora de controle

Mas o grande mufti da Arábia Saudita, o xeque Abdel Aziz al-Sheikh, respondeu que o tumulto estava fora do controle humano.

"Não há responsáveis pelo que aconteceu (...) Não podemos responsabilizar alguém. A sorte e o destino são inevitáveis", disse na sexta-feira, referindo-se ao herdeiro e ministro do Interior, príncipe Mohamed Bin Nayef, que também preside a comissão do Hajj.

Vários peregrinos atribuem a tragédia ao fechamento de uma passagem perto do local do apedrejamento e à má gestão de fluxo de fiéis pelas forças de segurança.

Na Turquia, um líder do partido islâmico conservador no poder, denunciou a "negligência" dos sauditas e propôs que seu país organize o Hajj, porque "os lugares santos do Islã pertencem a todos os muçulmanos".

Mas Abdullah al-Sheikh, presidente do Majlis al-Shura, o Conselho Consultivo composto por membros nomeados pelo governo saudita, disse que os peregrinos devem respeitar "as regras e os regulamentos emitidos pelas forças de segurança".

"Isto irá preservar suas vidas, sua segurança e facilitará o desenvolvimento dos rituais", indicou em um comunicado publicado pela agência oficial Spa.

"Espero que os organizadores tirem lições para o Hajj no próximo ano", declarou Abdelmahmud Ibrahim, um senhor de 52 anos, quando estava prestes a realizar o ritual de apedrejamento.

Este ritual, iniciado na quinta-feira, no primeiro dia do Eid al-Adha (Festa do Sacrifício), está previsto para durar três dias, mas os fiéis podem concluí-lo em dois.

Depois do apedrejamento, os peregrinos circulam ao redor da Kaaba, um edifício em forma de cubo no centro da Grande Mesquita, em direção à qual os muçulmanos devem rezar cinco vezes por dia.

Em seguida, eles vão para Meca. O Hajj é um dos cinco pilares do Islã que os fiéis devem cumprir pelo menos uma vez em sua vida, se tiveram os meios para fazê-lo.

Quase dois milhões de muçulmanos, incluindo 1,4 milhão de estrangeiros, fizeram a peregrinação este ano.