O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por meio da Auditoria Fiscal do Trabalho, apresentou um estudo sobre a situação do trabalho infantil no Brasil com números que, à primeira vista, representam um alívio: houve uma redução de 14,6% no índice em 2023, comparado ao ano anterior. Contudo, não podemos deixar de alertar que existe uma complexidade do problema e que as desigualdades regionais persistentes desafiam as políticas públicas de combate ao trabalho infantil.

O Diagnóstico Ligeiro do Trabalho Infantil – Brasil, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Continua) do IBGE aponta para uma realidade com mais de 1,6 milhão de crianças e adolescentes ainda em situação de trabalho infantil. Estados como Tocantins e Distrito Federal apresentaram um aumento significativo, evidenciando que, apesar dos esforços de fiscalização e prevenção, há fatores locais que devem ser tratados de maneira urgente e específica.

O país assumiu o compromisso de alcançar a meta 8.7 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU, que visa sobretudo erradicar o trabalho infantil em todas as suas formas até 2025. Ou seja, estamos correndo contra o tempo e os obstáculos não são nada pequenos. O trabalho infantil não é um fenômeno isolado; ele reflete a pobreza, a falta de acesso à educação, além de desigualdades regionais e sociais e de “mitos” culturais, que, em muitos casos, veem o trabalho precoce como “formador de caráter”.

Enquanto auditores fiscais, nosso papel não se limita à fiscalização ou repressão. É preciso fortalecer e articular políticas públicas com diversos atores sociais, componentes da rede de proteção, de modo a garantir que crianças e adolescentes possam acessar seus direitos fundamentais, incluindo a educação de qualidade e uma vida isenta de exploração, como lhes garante a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, que preceitua ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar tais direitos, com prioridade absoluta.

Já Minas Gerais foi o segundo estado com maior número absoluto de crianças e adolescentes afastados do trabalho infantil pela Inspeção do Trabalho em 2023. Entre janeiro de 2023 até setembro de 2024 foram afastadas 703 crianças e adolescentes do trabalho infantil pela Inspeção do Trabalho em Minas Gerais, sendo o estado que a Inspeção do Trabalho mais afastou crianças e adolescentes do trabalho infantil, nesse período, segundo dados do Sistema Radar SIT do Trabalho Infantil, disponível para acesso público. Em 2023, houve uma redução de 23 mil crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil no estado de Minas Gerais, correspondendo a uma diminuição de 9,8%.

As operações evidenciam que ainda há muito a ser feito. A fiscalização deve ser cada vez mais eficiente e efetiva, mas, acima de tudo, precisa ser sustentada por ações que transformem as condições de vulnerabilidade dessas famílias. O Disque 100, canal para denúncias, é uma ferramenta imprescindível para combater tal realidade. Contamos também com o Sistema Ipê – Trabalho Infantil, da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (SIT/MTE), como uma ferramenta eficiente e estratégica para recebermos denúncias de trabalho infantil, pelo endereço eletrônico: https://ipetrabalhoinfantil.trabalho.gov.br/

Assim, o trabalho infantil não deve ser visto apenas como um dado estatístico em queda, mas como uma urgência social que exige esforços permanentes, pois cada criança e adolescente em situação de trabalho infantil representa um futuro que ainda não teve a chance de florescer. Nosso compromisso precisa ser firme: assegurar que essas crianças e adolescentes tenham oportunidades para crescer em condições dignas, protegidos dos riscos do trabalho precoce.

(*) Julie Santos Teixeira Aguiar é  auditora-fiscal e vice-presidente da Delegacia Sindical do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho em Minas Gerais