O presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte e pré-candidato à prefeitura da capital, Gabriel Azevedo (MDB), foi multado recentemente por divulgar uma informação inverídica acerca do percentual de crianças matriculadas na rede municipal de ensino. O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) mineiro determinou que vídeo nas redes sociais do político que abordou o assunto fosse excluído.

Em sua defesa na Justiça, Gabriel alegou que o fato divulgado não se tratava de uma notícia falsa. O argumento foi o de que o vídeo trouxe uma imprecisão estatística. O fato é que, em um país no qual as fake news já fazem parte do dia, nem mesmo dados relacionados às crianças escapam de notícias falsas. É essencial percebermos que nos falta uma cultura de checagem dos fatos, principalmente pelas redes sociais.

Anomalia política

Embora estejamos a apenas três meses das próximas eleições, o senso comum segue acreditando que fake news são apenas notícias falsas, ou imprecisões acidentais que não guardam outra intenção. Mas precisamos afirmar que vão muito além disso. São uma anomalia política, levada a proporções inimagináveis graças às redes sociais, criadas sob medida para perfis específicos da população. Portanto, ameaçam a democracia assim como o voto de cabresto, a corrupção e a fisiologia.

Acreditar na democracia, hoje, demanda questionar quais interesses estão por trás das fake news e dialogar com a realidade do povo. A desconfiança generalizada na política abre caminho para a mentira, mas é difícil pedir confiança para uma população que muitas vezes é deixada às margens do Estado e para a qual as instituições não funcionam. 

Trata-se de uma questão de cidadania não aceitar o jogo da mentira. E é por isso que o tema das fake news necessita ser discutido com profundidade. Afinal, a solução para resguardar a democracia é termos mais democracia com mais pessoas participando do debate.

Do contrário, se a política é o terreno da mentira e da descrença, que diferença faz mentir ou falar a verdade? É nesse ambiente que vamos mais uma vez às urnas em outubro.

Papel da Justiça

São positivas as tentativas do TSE de coibir as fake news. Recentemente, o tribunal aprovou resoluções para regular o uso da Inteligência Artificial (IA). As medidas incluem a obrigação de informar sobre o uso de IA, restrições ao emprego de robôs e responsabilização das big techs. Há hoje a possibilidade de cassação de registros ou mandatos de candidatos que utilizarem deepfakes e manipulações digitais por IA. 

A evolução tecnológica hoje permite que se faça um vídeo com voz e imagens de uma pessoa falando algo diametralmente oposto ao que ela acredita. É importante que a imprensa e o Judiciário explicitem isso ao máximo, mas, se a população não aceitar que o jogo da política pode ser reduzido a esse nível de conteúdo, tudo ficará melhor. 

O Judiciário tem um papel muito importante, mas a ele não podem ser delegados os assuntos que são da política e, portanto, do povo. Deixar de aceitar o jogo baixo na política e combater as fake news é uma tarefa de todas as pessoas que querem uma sociedade democrática.

(*) Antônio Carlos Souza de Carvalho
Advogado, cientista político e sócio do escritório
Souza de Carvalho Sociedade de Advogados