Wagner Lenhart é diretor Executivo do Instituto Millenium e
Presidente do Conselho de Administração do BDMG

A decisão da Câmara de priorizar a reforma administrativa e instituir um grupo de trabalho representa um avanço no debate sobre a reconfiguração do Estado brasileiro. A escolha do deputado Pedro Paulo para liderar os trabalhos é acertada: um parlamentar experiente, comprometido com o equilíbrio fiscal e com a modernização do setor público.

A iniciativa é urgente. A reforma administrativa não deve ser tratada só como uma pauta fiscal, embora a sustentabilidade das contas públicas dependa de um Estado mais eficiente. É uma necessidade estrutural, diante de um modelo de gestão pública que se mostra anacrônico, pouco responsivo e descolado das exigências do século XXI.

O aparato estatal brasileiro opera numa lógica que já não existe. A estrutura atual revela baixa capacidade de inovação, rigidez excessiva, escassa orientação a resultados e distanciamento das necessidades da população. Em um mundo caracterizado pela velocidade, adaptabilidade e experimentação contínua, o Estado brasileiro ainda se organiza de forma compartimentada, com traços patrimonialistas e foco nos próprios processos.

Reformar esse modelo implica repensar o papel do Estado e os mecanismos de sua administração. Esse redesenho deve se apoiar em cinco eixos estruturantes.

Novo paradigma institucional. É preciso migrar de uma lógica burocrática para uma administração orientada a resultados, mais leve, estratégica e responsiva. Isso requer: i) ampliação dos contratos de gestão com metas claras e maior autonomia para os gestores; ii) valorização de profissionais que entregam resultados, ao passo que se reduzem os espaços para a cultura do “não”; iii) foco em funções essenciais do Estado – regular, fiscalizar e garantir qualidade – com delegação da execução de serviços para o setor privado, sob regulação eficiente e controle rigoroso.

O atual modelo de RH do setor público é obsoleto, muito procedimental e impermeável ao mérito. É necessário adotar práticas modernas: processos seletivos por competências, formação continuada, avaliação de desempenho e incentivos à excelência. O objetivo é construir uma máquina pública mais dinâmica e orientada ao atendimento à população.

A burocracia e o temor da responsabilização ex-post têm gerado o chamado “apagão das canetas”, inibindo decisões e comprometendo a efetividade da gestão. É imprescindível revisar marcos legais e institucionais de compras públicas, aliando segurança jurídica, celeridade e inovação. Ferramentas digitais podem contribuir para um Estado mais eficiente, com transparência, legalidade e impessoalidade.

Digitalização e reengenharia de processos Ser digital não significa só oferecer serviços online, mas redesenhar a lógica interna da administração pública. O Estado precisa ser digital por padrão, com processos simples, interoperáveis e centrados no usuário. O objetivo deve ser um governo acessível via celular e com operações internas mais ágeis, integradas e eficientes.

Reforma orçamentária e maior flexibilidade fiscal O orçamento público é engessado por vinculações, indexações e obrigações automáticas. Essa rigidez compromete a capacidade de gestão e a efetividade das políticas públicas. É fundamental desvincular, desindexar e desobrigar parcelas significativas do orçamento, com regras que fortaleçam a responsabilidade fiscal. Exemplo: limitar o crescimento das despesas de custeio à ocorrência de superávit primário, criando incentivos alinhados e sanções em caso de descumprimento.

A janela política que se abre exige coragem, responsabilidade e visão de longo prazo. Postergar esse debate significa aprofundar a disfunção do Estado brasileiro e comprometer a qualidade dos serviços públicos. A reforma administrativa não pode ser capturada por interesses corporativos; deve ser conduzida como uma agenda de Estado, voltada à construção de um país mais eficiente, justo e próspero.

Um Estado moderno, centrado no cidadão e preparado para os desafios do futuro é condição indispensável para que o Brasil avance na direção de uma sociedade com mais oportunidades.