Antes de mais nada, uma verdade: o verdadeiro poder mundial não está mais nas presidências dos países, mas nos CEOs das big techs.

O abuso de poder econômico e dominante das big techs influencia não apenas a sustentação empresarial mundial, mas também o cenário econômico e político global – o que é altamente preocupante.

A retaliação econômica anunciada por Donald Trump contra o Brasil não é apenas mais um episódio das intempéries do comércio internacional. É o sintoma de um problema muito mais profundo e estrutural: a crescente submissão de decisões geopolíticas aos interesses de corporações digitais que hoje detêm mais poder do que muitos Estados soberanos.

A imposição de tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros, especialmente os ligados à cadeia digital, representa um novo tipo de colonialismo: o colonialismo algorítmico, em que o domínio não se dá mais por tropas ou tratados, mas sim por plataformas, servidores e regras unilaterais de negócios.

E esta não é uma disputa apenas econômica, é ontológica. Está em jogo quem define as regras do mundo digital, quem controla o fluxo da informação e, sobretudo, quem tem poder para disciplinar essas forças, que hoje atuam acima dos parlamentos, tribunais e Constituições nacionais.

A reação das plataformas a esse novo cenário já se materializa em movimentações diplomáticas e econômicas, como a anunciada por Trump. Mas não para por aí. Startups brasileiras estão sendo asfixiadas por modelos de negócio predatórios, exportadores enfrentam insegurança jurídica, empresas são intimidadas por grandes corporações, e o ecossistema de inovação nacional é estrangulado pela ausência de um ambiente competitivo justo.

Não se trata apenas de uma disputa entre governos e empresas. Trata-se da reconfiguração da soberania no século XXI. Países como o Brasil, que ousam propor marcos regulatórios modernos, estão sendo colocados na parede. A chantagem agora é digital, mas as consequências são bem reais: revisão de acordos bilaterais, barreiras a produtos nacionais e a manipulação do mercado por quem detém a infraestrutura global da informação.
Estamos diante de um paradoxo histórico: regulamentar é preciso, mas quem regula os reguladores do mundo digital? E mais: até quando Estados nacionais aceitarão ser subalternos a empresas que sequer prestam contas à sociedade, ao Judiciário ou a normas democráticas?

Essa queda de braço não é mais entre o público e o privado, mas entre o interesse coletivo e o poder corporativo globalizado. Se não enfrentarmos essa realidade com coragem, estratégia e cooperação internacional, perderemos mais do que tarifas ou empregos. Perderemos o controle sobre nossa própria narrativa, nossas instituições e nosso futuro digital.

A grande escolha é: submetermo-nos a essas imposições nada veladas, com seus “jabutis” disfarçados de proteção, e ficarmos com o gosto amargo na boca ou entrarmos numa guerra em que temos mais a perder do que a ganhar?

A negociação mundial por poder tem cara e gosto de “M&A global hostil”, em que restam apenas duas opções: aceitar as imposições, perdendo soberania, ou se sub-rogar ao verdadeiro poder mundial, o poder digital e abusivo das big techs.