O nível de vida das pessoas depende de sua produtividade. Este é um fato já bastante observado ao longo dos anos e não há um bom economista que discorde disto. O arranjo que a sociedade precisa para que a produtividade aumente para todos, este sim, é mais sujeito a discordâncias. Frequentemente, estas discordâncias não são resolvidas no plano teórico, mas apenas quando se observa o impacto de diferentes propostas, na prática.
Sabemos, por exemplo, que sociedades podem adotar diferentes “instituições” a fim de ampliar as oportunidades para que pessoas criem formas mais adequadas ao aumento de sua própria produtividade. “Instituições”, no jargão dos economistas, é sinônimo de “regras do jogo”, ou de regras que a sociedade adota a fim de minimizar a incerteza em torno de suas interações. Uma sociedade com instituições pró-mercado buscam garantir que as trocas econômicas sejam protegidas das fraudes e outras irregularidades. Repare que “instituições pró-mercado” não é sinônimo de “instituições pró-empresários”. Empresários são parte do mercado, não sua totalidade.
Instituição
Uma ‘instituição’, assim, é uma forma de tecnologia que as sociedades usam para potencializar sua produtividade e, portanto, seu bem-estar. Ocorre que, muitas vezes, sociedades adotam instituições que, embora funcionais inicialmente, tornam-se disfuncionais e obsoletas. Pior, nem sempre estas instituições são facilmente substituídas.
Há alguns anos, o economista Paul Romer propôs uma forma inovadora de se alterar instituições: charter cities. Estas cidades seriam criadas em algum local desocupado do território do país, com instituições distintas. Um exemplo hipotético seria uma cidade em meio ao sertão que organizasse suas atividades segundo o código legal anglo-saxão (common law) em vez do nosso código legal (civil law). Um exemplo real, que durou até há pouco tempo, foi Hong Kong. Não é fácil, obviamente, implementar um arranjo como este. Entretanto, é um ótimo meio de se testar instituições distintas junto a parte da sociedade.
Zonas econômicas especiais
Uma forma alternativa (menos radical) são as zonas econômicas especiais (em inglês: special economic zones). As zonas são utilizadas para a experimentação de legislações inovadoras específicas como diferentes leis de zoneamento urbano ou diferentes regimes tributários. Um exemplo é Shenzhen, na China continental ou o Dubai International Financial Centre, nos Emirados Árabes Unidos.
O leitor se engana se pensa que charter cities e zonas econômicas especiais são mudanças institucionais que só visem o desenvolvimento de negócios. Como tem destacado Michael Castle-Miller ao longo dos anos, estes arranjos podem ser utilizados para minimizar o sofrimento de pessoas que são obrigadas a se deslocarem de suas cidades por conta de acidentes (como vimos em Brumadinho, há alguns anos) ou por causa de guerras (como é o caso da Ucrânia) e falências institucionais (como é o caso da Venezuela).
Governança
Por exemplo, uma “cidade de refugiados”’ construída no Brasil, abrigando refugiados venezuelanos, sob esta tecnologia institucional pode servir para a experimentação de novas regulações, novas políticas públicas, atrair capital para a construção de infraestrutura (valorizando o uso da terra), dentre outros.
Finalmente, este tipo de arranjo tem potencial de estimular a diminuição da “hesitocracia” estatal (dificuldade que governos têm em avançar soluções ágeis que atendam as demandas dos eleitores) que é um dos maiores entraves ao aumento da produtividade dos cidadãos de uma sociedade. É um exemplo de governança radical que pode ocorrer sem traumas e com o benefício da experimentação.
(*) Claudio D. Shikida é doutor em economia e professor do Ibmec BH