A história registra que 1919, após a mortal epidemia da gripe espanhola que teria vitimado perto de 40 mil pessoas, entre elas o presidente eleito Rodrigues Alves, a população do Rio de Janeiro fez um grande Carnaval. Foi uma espécie de Carnaval da euforia, de superação de um momento triste e de explosão de alegria dos não vitimados pela espanhola.
Muitos pensavam que o Carnaval de 2022 seria uma espécie de reedição do Carnaval de 1919. Assim como ocorreu no passado, os foliões poderiam se entregar com energia renovada à festa. Porém, a pandemia ganhou novo impulso com o surgimento da variante ômicron, e as autoridades, de forma prudente e acertada, resolveram cancelar a folia.
Há, porém, outro Carnaval imune às restrições da pandemia. Um Carnaval nada divertido, duradouro e ininterrupto. Trata-se do “Carnaval tributário”, expressão cunhada pelo jurista gaúcho José Alfredo Becker para descrever a caótica regulação tributária no Brasil. Por aqui, as regras de apuração e recolhimento dos tributos são complexas, desconexas e impõem uma pesada e iníqua carga fiscal.
Um relatório do Banco Mundial aponta que no Brasil uma empresa pode chegar a gastar 1.500 horas de trabalho por ano para pagar e controlar seus tributos dada a multiplicidade e a complexidade das normas e a sobreposição de exigências por diversos entes tributantes (União, Estados e municípios).
Já um levantamento do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário conta que, desde a Constituição de 1988, foram editadas pela União, pelos Estados e pelos municípios aproximadamente 450 mil normas de cunho tributário.
Mas a farra não para por aí! A constante edição de novas normas, que não raras vezes desrespeitam mandamentos constitucionais que limitam o poder de tributar, geram uma sensação de constante insegurança jurídica tributária, causam conflitos entre entes tributantes e estimulam inúmeros questionamentos judiciais.
E o contribuinte, como fica no meio de tamanha festa burlesca? Parafraseando algumas famosas músicas carnavalescas, fica “pulando como pipoca”, “rebolando sem bambolê” e “no meio da luta do rochedo contra o mar” para atender as exigências dos fiscos federal, estaduais e municipais.
Ao longo de 2021, o contribuinte, além de enfrentar esse Carnaval horrendo, conviveu com um arremedo de proposta de reforma tributária que mais se parecia com uma bateria desafinada. Agora, em 2022, o mais novo samba-enredo da folia tributária é a tentativa de cobrança do diferencial de alíquotas do ICMS por fiscos estaduais em total afronta princípios tributários consagrados em nosso ordenamento jurídico.
Já passou da hora de mudar essa realidade. A construção de um ambiente de negócios que permita o desenvolvimento econômico e social de nosso país passa pela estruturação de um sistema tributário seguro, justo e eficiente.
Basta desse Carnaval triste. E que saudade do verdadeiro Carnaval.